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Bessora fala na Flip sobre refugiados de ontem e hoje e o uso da memória coletiva

Escritora se juntou a Carol Bensimon e Prisca Agustoni para refletir sobre deslocamentos e identidade

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Paraty (RJ)

Três escritoras de diferentes nacionalidades fizeram nesta quinta-feira uma defesa enfática da literatura como um meio para construção da memória coletiva de populações postas à margem de suas sociedades, durante uma mesa da programação principal da Flip.

Mulher jovem negra, com cabelos pretos compridos e presos atrás. Ela está de pé, encostada na frente de um prédio de paredes brancas. Veste uma blusa branca, um cachecol rosa e calça jeans.
A escritora Sandrine Bessora Nan Nguema, que assina apenas como Bessora - Antoine Flament/Divulgação

Com trajetórias marcadas por deslocamentos entre diferentes culturas e línguas, a francesa Bessora, a brasileira Carol Bensimon e a suíça Prisca Agustoni refletiram sobre a influência que tiveram em suas obras e as dificuldades enfrentadas por refugiados de diferentes épocas.

"Todos temos ancestrais que se deslocaram por alguma razão no passado", disse Bessora, que nasceu na Bélgica e tem nacionalidade francesa, suíça e gabonense. "Quando deixamos refugiados morrer no mar, é porque nossas sociedades e nossas identidades nacionais estão doentes."

No romance "Os Órfãos", seu primeiro título publicado no Brasil, ela conta a história de dois irmãos alemães abandonados após a derrota do nazismo na Segunda Guerra Mundial que são adotados por fazendeiros brancos na África do Sul e crescem sob o regime do apartheid.

"A condição para que coisas assim aconteçam estão em nós, e por isso temos que manter a memória viva", disse Agustoni, autora de um livro de poemas inspirado na crise dos refugiados na Europa, "O Mundo Mutilado". "Devemos questionar o que somos e o que não queremos ser."

Segundo Bensimon, o esquecimento pode ajudar refugiados e exilados a superar traumas e seguir adiante, mas não pode sacrificar a construção da memória coletiva. "Se eles não conseguem contar, cabe às gerações seguintes retomar e registrar o que aconteceu", disse a escritora.

Descendente de judeus sefarditas que se estabeleceram no Brasil depois de serem expulsos do Egito, Bensimon cresceu em Porto Alegre e vive há dez anos nos Estados Unidos. Ela lançou neste ano "Diorama", sobre uma taxidermista e um crime brutal que marcou sua família.

Durante o debate entre elas, que foi mediado pela escritora Noemi Jaffe, as três autoras disseram que os deslocamentos constantes que marcam suas trajetórias pessoais deram a elas novas perspectivas para lidar com os temas que decidiram explorar em sua literatura.

Bensimon disse que assuntos como a proteção da Amazônia nunca a preocuparam muito em Porto Alegre, a milhares de quilômetros da floresta, mas a vida na Califórnia, o estado americano em que mora, aguçou sua preocupação com questões ambientais, um dos assuntos do seu livro.

Agustoni, que é professora na Universidade Federal de Juiz de Fora, em Minas Gerais, disse que é impossível falar dos refugiados que povoam seus poemas sem pensar nas marcas deixadas por séculos de escravidão no Brasil e em outros países que escravizaram a população africana.

Filha de uma suíça e um diplomata do Gabão, Bessora disse que sua origem deu a ela empatia para lidar com os órfãos alemães. Inspirados em personagens reais, eles eram vistos como símbolos de um projeto de purificação racial sonhado pela minoria branca na África do Sul.

"Tenho muitos irmãos, de várias cores, e a cor nunca foi uma questão na minha família", disse a escritora, que cresceu entre a Europa, os Estados Unidos e o Gabão. "Isso me deu liberdade para escrever e buscar entender a experiência dessas pessoas que viveram tão longe de mim."

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