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'Elementos' surpreende com história delicada sobre filha de imigrantes

Filme de Peter Sohn recorre à narrativa mais tradicional e permite ao público se surpreender com suas ideias e alegorias

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Elementos

Boas alegorias são inesperadas e surpreendem o público. A Pixar mantém um bom histórico nesse departamento, mas ganhou fama pelas morais mais próximas das premissas. Casos como as emoções de "Divertida Mente", de 2015, e as almas de "Soul", de 2020, mostram que isso não é ruim.

"Elementos", novo filme do estúdio, promete repetir isso, principalmente por fazer dos elementos naturais os protagonistas da vez. Se o estúdio contou histórias sobre emoções e almas humanas, pensa o público, o mesmo é possível com o fogo, a água, a terra e o ar. Mas a alegoria, desta vez, é mais complexa.

Elementos
Cena de 'Elementos', da Pixar - Divulgação

O filme não esconde que é uma alegoria sobre imigração. Começa com um casal de personagens feitos de fogo em um barco, que navega entre as brumas para chegar ao cais do que logo se revela uma metrópole.

A cena encanta pelos seres criados de outros elementos e o universo onde coexistem, mas a recepção aos recém-chegados, em si, é cruel. Todos ao redor ignoram o casal, e o simples ato de encontrar um lar vira um desafio. Ninguém quer um inquilino que pode provocar um incêndio, quanto mais três —já que a mulher está grávida.

Os dois, então, se estabelecem em um prédio abandonado, localizado em uma região menos nobre. O marido reforma o lugar, a filha nasce, a família abre uma loja. O tempo passa e vemos uma comunidade nascer.

A trama dá protagonismo a esses herdeiros. A filha, agora adulta e chamada Faísca, ajuda o pai a tocar a loja, mas as coisas não correm bem. O patriarca tosse muito e não tem o mesmo fogo —literal, no caso— para tocar o negócio. Ele sofre até para fazer os pequenos doces de carvão que vende.

A promessa é que a filha assuma o seu lugar. O problema é que a moça, por ansiedade ou nervosismo, tem um temperamento curto para os negócios, e sua fúria com frequência acaba provocando incêndios.

Uma dessas explosões vai disparar a história de vez. A ira de Faísca um dia cria um rombo no encanamento e, além do vazamento, ele traz um inspetor chamado Gota, feito de água —raça odiada pela família. Uma série de multas depois, a lojinha corre o risco de fechar.

A disposição dos elementos narrativos indica que o filme vai se guiar pela busca emocional, na luta da protagonista para controlar as emoções. Mas "Elementos" segue um caminho mais interessante, dentro do assunto menos instigante: a burocracia.

Na busca de Faísca para salvar o negócio da família, ela descobre que o seu problema é generalizado na região, que corre risco de enchente. Ela se associa a Gota para resolver a situação e eliminar as multas, e assim a história se reorganiza em torno dos dois.

É uma relação de extremos. Ela é fogo e ele é água, ela estoura fácil e ele chora em toda oportunidade. Mas o amor encontra um jeito de desabrochar, da mesma forma que Faísca descobre o mundo e a si própria.

A garota encontra seu equilíbrio enquanto percebe sua individualidade, que inclui um talento para moldar o vidro. O que é um problema, pois nada disso envolve seu futuro na lojinha.

O dilema final de "Elementos", então, é da ordem clássica, do duelo entre honrar os pais ou seguir com os próprios sonhos. A questão não é inédita na Pixar, bem como o contexto das famílias imigrantes. O estúdio fez algo parecido no ano passado com "Red: Crescer É uma Fera", que encenava melhor o conflito pelo drama geracional e do adolescente.

Mas o novo longa-metragem, dirigido por Peter Sohn, se destaca pela sutileza. Segue a lógica da fábula, tradicional e mais acessível, construindo alegorias simples de maneira elaborada, que contemplam o percurso da história. A bela trilha sonora de Thomas Newman reforça isso nos sons minimalistas e inusitados —como uma cítara ou um coro de vozes borbulhante.

Já a premissa faz tudo funcionar. "Elementos" evita a correlação direta entre o equilíbrio de Faísca e o dos elementos naturais. O pano de fundo da história alimenta a oposição dela com Gota, que recusam a admitir sua paixão porque o fogo e a água não podem se tocar —a razão diz que um apaga o outro, bom lembrar.

O contato dos dois leva a uma cena bonita, mas também a um clímax à altura da história do estúdio. Um pequeno spoiler: no momento de maior apuro do filme, Faísca se vê presa, obrigada a decidir entre os valores de sua família e o amor, apenas porque se fechou demais para ambos.

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