Governo de SP desiste de museu na Casa das Retortas após gastar R$ 100 milhões

OUTRO LADO: Estado afirma que o projeto original foi descaracterizado e que pretende criar nova instituição no local

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São Paulo

O governo de São Paulo desistiu de instalar o Museu da História do Estado na Casa das Retortas após gastar R$ 100 milhões em obras no imóvel.

Localizado no Brás, região central da capital, o prédio histórico abrigou uma usina de gás construída seguindo o modelo industrial britânico do fim do século 19 e fazia parte de um complexo que fornecia energia à cidade.

Obra parada na antiga Casa das Retortas, no Brás, na região central de São Paulo - Eduardo Knapp/Folhapress

Totalmente desativada nos anos 1970, a construção foi tombada pelos órgãos de preservação do estado e do município, e restaurada em 1978. Após o restauro, o prédio foi sede do Arquivo Histórico Municipal e do Departamento do Patrimônio Histórico. No entanto, ele está sem uso permanente desde 2003.

Em 2009, a gestão de José Serra começou a planejar a instalação no local de um museu para contar a história de São Paulo, da era colonial até a industrialização, passando pelo crescimento do setor cafeeiro.

O projeto previa um modelo arquitetônico contemporâneo para a edificação do século 19, uma construção de tijolos aparentes, com janelões e pé-direito alto. Ao todo, o terreno tem cerca de 20 mil metros quadrados.

O projeto do museu contemplava ainda uma biblioteca, uma seção com documentações históricas para consultas públicas, uma livraria e um restaurante. À época, o orçamento previsto era de R$ 52 milhões e a expectativa era que a obra fosse concluída em 2011.

No entanto, de lá para cá, o prazo para a entrega aumentou, bem como os gastos. Hoje, o valor chega R$ 100 milhões —R$ 70 milhões em obras de restauro e R$ 30 milhões para a recuperação do solo.

Esse segundo procedimento foi necessário porque, durante as obras, constatou-se que o solo estava contaminado por resíduos tóxicos. O problema surgiu a partir da queima de carvão, a antiga atividade da Casa das Retortas. Foram retirados do subsolo mais de 2 milhões de litros de óleo.

Em nota, o governo diz que o projeto original para o espaço acabou sendo descaracterizado pelas obras de recuperação do solo. Por esse motivo, a ideia de instalar no local o Museu da História do Estado de São Paulo foi abandonada.

A Secretaria da Cultura diz, porém, que pretende criar na Casa das Retortas um novo museu em parceria com a prefeitura. O plano é fazer uma instituição dedicada à moda e à gastronomia que deve custar R$ 30 milhões ao município.

Enquanto o museu não sai do papel, o poder público continua gastando dinheiro no imóvel. Desde 2019, foram gastos 3,5 milhões com vigias, capinagem, água e outros serviços de manutenção.

Essa não é a primeira vez que um projeto para o local naufraga. Antes, o governo já tinha proposto criar os museus do futebol e da televisão, mas as ideias não vingaram.

"Esse abandono gera um prejuízo enorme para a cidade", diz Pedro Mendes da Rocha, arquiteto que fez o projeto do Museu da História do Estado. "Esse espaço seria democrático, um lugar de encontro e de referência para as pessoas."

O arquiteto diz que ocupar edifícios históricos é importante para evitar que as estruturas se deteriorem. "Desse modo, eles permanecem vivos, respirando e bem cuidados. É que nem uma casa. Se você tranca e deixa fechada, invariavelmente vai ficar suja, malcheirosa e deteriorada."

Ele explica que, quando uma obra é paralisada, a estrutura precisa ser protegida para resistir a intempéries. Caso contrário, diz Mendes da Rocha, ela acaba sendo comprometida pela ação do tempo e da natureza.

"As estruturas metálicas vão enferrujando, a alvenaria começa a criar musgo, as paredes ficam encharcadas e começa a ter risco de desabamento", avalia ele. "Para economizar dinheiro, é preciso gastar dinheiro. Teria que ter existido uma estratégia de proteção antes de estacionar a obra."

O arquiteto considera também que um planejamento maior deveria ter antecedido o começo dos trabalhos. "Faltaram sondagens e prospecções para entender como estava o solo, até porque naquele lugar se queimava carvão diariamente em grande quantidade."

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