Produtores projetam US$ 20 milhões em parcerias do show business no Norte

Terceira edição do MICBR, em Belém, selecionou 260 participantes por edital vindos das cinco regiões brasileiras

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Belém

"Sabe onde é o lugar em que você sabe da vida de todo mundo na cidade?", pergunta Fafá de Belém para logo responder com uma risada, "no Ver-o-Peso".

A cantora, em conversa com jornalistas, se refere ao movimentado centro de comércio de Belém. Ponto de encontro onde moradores e turistas buscam não só mercadorias como também trocas culturais.

Outro lugar da capital do Pará experimentou dias de agitação semelhantes aos da feira às margens da baía do Guajará. O Mercado das Indústrias Criativas do Brasil, ou MICBR, reuniu na Amazônia empreendedores dedicados à criatividade no país e no exterior, no início do mês, para promover trocas de experiências, estabelecer contatos e explorar oportunidades comerciais.

Brô Mc’s: primeiro grupo de rap indígena a pisar no Rock’in Rio
Brô Mcs, primeiro grupo de rap indígena do Brasil, que participou do Mercado das Indústrias Criativas do Brasil, o MICBR, em Belém - João Albuquerque/Divulgação

A terceira edição do MICBR selecionou por edital 260 participantes das cinco regiões brasileiras e os treinou para as rodadas de negócios. Além desses, cerca de outros 200 participaram por conta própria.

"Considerando a quantidade de agentes culturais, compradores e as edições anteriores, estamos com a expectativa de aproximadamente US$ 20 milhões em negócios nos próximos 12 meses", afirma o secretário de Economia Criativa e Fomento Cultural do Ministério da Cultura, Henilton Menezes.

A realização do evento promovido pelo MinC e pela Organização dos Estados Ibero-americanos em Belém atende a um desejo de muitos criadores brasileiros, o de descentralizar a economia criativa do país, concentrada no eixo Rio-São Paulo.

É o caso da cineasta paraense Joyce Cursino, que relata a dificuldade de contato com players do setor. "É ainda mais difícil para pessoas pretas da região Norte", diz. Ela foi ao evento apresentar a animação "Iaça, A Menina Açaí", em fase de desenvolvimento.

A história é sobre uma menina que encontra um portal no tempo. No futuro, ela descobre que as pessoas não conhecem mais o açaí porque vivem em uma sociedade onde a comida é, em maior parte, industrializada. A aventura, então, se desdobra em torno da proteção da natureza e da valorização das tradições alimentares.

O encontro de outras narrativas também é um objetivo das produtoras. Segundo Marina Filipe, da área infantil da Warner Bros. Discovery, a expansão da rede de contatos para além do tradicional eixo Rio-São Paulo amplia vozes e perspectivas que são contadas. "A diversidade que queremos na tela também passa pela diversidade por trás dela", diz.

Letícia Friedrich, da Vitrine Filmes, ressalta as reuniões formais estabelecidas não apenas com agentes do mercado audiovisual, mas também com outros setores criativos, como editoras de livros, produtoras musicais e agências de marketing.

Já Daniel Pech, da Multiverso Produções, produtora paulista especializada em projetos autorais e coproduções latino-americanas, destaca as conversas que teve com profissionais da Argentina. O país participou como convidado de honra do evento e trouxe uma comitiva de 60 empreendedores de dez setores da economia da cultura.

Fafá de Belém também esteve em uma rodada de negócios acompanhada da produtora Maíra Carvalho, que pesquisa a vida da cantora há anos e está desenvolvendo uma cinebiografia ficcional dela. "’Fafá, A Garota do Norte’ coloca lado a lado a biografia da artista e a história do Brasil", conta Carvalho.

Em paralelo às rodadas, foram realizadas atividades formativas como mentorias, oficinas, palestras, mesas redondas e painéis. Artistas de áreas como circo, dança, música, moda e teatro se apresentaram em showcases desenhados para divulgar o potencial econômico de produtos culturais brasileiros.

Dentre os destaques, músicos como o carioca Jonathan Ferr, os sul mato-grossenses Matu Miranda e Brô MCs —o primeiro grupo de rap indígena no Brasil—, a gaúcha Ianaê Régia, o coletivo circense paulistano Prot(agô)nistas e Mestre Calú, de Pernambuco, com o tradicional teatro de bonecos mamulengos.

Nos painéis, assuntos quentes do mercado foram discutidos em sessões expositivas. No debate sobre cota de telas e perspectivas para o cinema nacional, Clemilson Farias, da Conexão Audiovisual Centro-Oeste, Norte, Nordeste, a Conne, apresentou dados do último informe de mercado cinematográfico da Agência Nacional do Cinema, a Ancine.

Os números do ano passado, apontados por Farias, indicam a disparidade na distribuição das salas de exibição no país. O parque exibidor brasileiro encerrou 2022 com 3.415 espaços em funcionamento. Desse montante, a região Norte conta com apenas 221.

Nesse sentido, iniciativas como o Festival de Cinema Latino-Americano de Alter do Chão, no Pará, democratizam o acesso aos filmes. É o que afirma o diretor do projeto, Raphael Ribeiro, que esteve no MICBR em busca de parcerias.

Segundo ele, o CineAlter recebe cerca de 8.000 participantes por ano e já exibiu, em suas três edições, 180 longas e curtas-metragens. Além de promover oficinas, palestras e debates na região do rio Tapajós.

Nos 50 anos do hip-hop, comemorados neste ano, o movimento cultural passou a integrar o rol de setores criativos do MICBR, se somando a outros 14 como áreas técnicas, artes visuais, artesanato, design, editorial, gastronomia e jogos eletrônicos.

Jhon Zkirla, programador de um dos maiores festivais do gênero da América Latina, o Hip-Hop al Parque, da Colômbia, estava em busca de atrações para a próxima edição do evento, no ano que vem. "Gostamos muito dos sons brasileiros e isso permite mostrar ao nosso público que o hip-hop é universal", afirma.

Segundo Udi Santos, consultora do segmento no MICBR, representantes dos quatro elementos do hip-hop —rap, DJ, break e grafite— participaram de negociações nas rodadas. O grupo de rap baiano Família Tríplice fez reuniões para apresentar atividades de música, dança e moda desenvolvidas pelo selo administrado por eles.

A paraense Mina Ribeirinha, que grafita há mais de 20 anos, conversou com agentes do Brasil, da Colômbia e do México para oferecer cursos, roupas de sua marca e pinturas ao vivo. "Fazer cultura no norte, não é sentar todo dia com um investidor, não é encontrar no bar, no restaurante. O MICBR veio encurtar esse caminho", diz.

O jornalista viajou a convite do Ministério da Cultura

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