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Dave Chappelle ainda faz piadas com pessoas trans e PCD em show sem surpresas

Comediante é considerado parte da elite do stand-up, mas atrai mais pelas suas histórias controversas em programa da Netflix

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Jason Zinoman
The New York Times

O momento mais selvagem no novo especial de Dave Chappelle, "Sonhador", produzido pela Netflix, acontece quando, passada a metade do programa, o comediante diz que está prestes a contar uma longa história. Essa parte não é novidade.

O comediante Dave Chappelle em agosto, durante uma performance em Nova York - Eduardo Munoz/REUTERS

Com 36 anos de uma carreira renomada na comédia, Chappelle, de 50 anos, é mais conhecido por suas histórias controversas do que por piadas elaboradas. Nesse momento do especial, ele diz à plateia em sua cidade natal, Washington D.C., que vai pegar um cigarro nos bastidores. Em seguida, ele pede para agirem como se o show tivesse terminado e diz que preferiria que o público o aclamasse de pé.

Em seguida, ele faz algo que nunca vi em um especial da Netflix: sai para fumar e trocar de figurino, deixando o palco vazio, para retornar enquanto todos esperam com aplausos educados. Ninguém se levanta. Mal-humorado, ele senta e menciona que não foi ovacionado de pé.

Ele poderia ter cortado essa parte, mas não o fez. Por quê? Foi para revelar que sua plateia se recusou a ser mandada, ou como ele não se importa, como disse em outra ocasião, se a maioria das pessoas não ri de algumas piadas?

Foi para incluir um alívio momentâneo do tom autoelogioso, que começa com imagens de estrela do rock de Chappelle caminhando para o palco em câmera lenta e termina com uma montagem dele com celebridades como Bono e Mike Tyson até o CEO da Netflix, Ted Sarandos?

Eu não faço ideia, mas o que é mais marcante nos shows de Chappelle hoje em dia não são tanto as piadas, e sim os golpes discursivos, as fofocas sobre celebridades e sua áurea excêntrica.

Pouco depois, Chappelle diz: "às vezes, me sinto comum." Como exemplo, ele descreve como ficou tímido em um clube onde um rico persa cercado por mulheres o reconhece. O comediante então imagina o homem contando como encontrou Dave Chappelle no dia seguinte. A ideia de que essa é a ideia que Chappelle tem do que é normal torna a situação engraçada.

Da última vez que ele lançou um especial na Netflix na véspera de Ano-Novo foi em 2017, um ponto de virada em sua carreira. Depois de desaparecer da cultura popular por uma década, Chappelle lançou quatro especiais naquele ano, uma corrida radicalmente produtiva que deu início a uma fase de stand-up que dominaria o que lembramos sobre ele, ultrapassando seu ótimo programa de esquetes.

"Chappelle's Show", agora com duas décadas, começou com um esquete brilhante sobre um supremacista branco negro cego chamado Clayton Bigsby. Foi inspirado em parte pelo avô de Chappelle, um homem cego chamado George Raymond Reed, que havia servido na comissão do prefeito de Washington para deficientes. Reed era engraçado. Seu obituário no Washington Post relatou que, ao descrever como soletrar seu nome, ele brincava: "Reed sem olhos."

Em 2017, Chappelle começou a fazer piadas sobre pessoas transgênero —e ele não parou, especial após especial, show após show. Como você se sente em relação a essa fixação é prevísivel, neste ponto. Ele começa seu novo programa com uma piada sobre pessoas trans, antes de dizer que parou de fazê-las. (Grande chance delas serem parte de sua marca tanto quanto o seu nome estampado em sua jaqueta).

Em seguida, ele diz que tem um novo foco: piadas sobre pessoas com deficiência. "Elas não são tão organizadas quanto os gays", diz ele. "E eu adoro fazer graça com elas."

Em certo momento, ele diz à plateia que as pessoas na comédia acham que ele é preguiçoso porque conta uma piada para uma plateia de 20 mil pessoas que faz apenas duas ou três rirem, mas elas riem alto.

Ele continua com uma imitação das pessoas mortas no Titanic vendo o submersível condenado OceanGate se aproximando delas, e é bobo e divertido, uma reminiscência de seus velhos tempos. A verdade é que a crítica mais comum que se ouve nos dias de hoje não é a de que Chappelle mira em um nicho, mas que parece preferir fazer observações a arrancar risadas.

Isso acontece com alguns comediantes famosos. Ricky Gervais lançou recentemente uma coleção previsivelmente previsível de piadas sobre temas supostamente tabus. Esse especial, "Armageddon", na Netflix, faz Chappelle parecer fascinante e imprevisível.

Gervais reclama que as pessoas se ofendem facilmente e apresenta piadas que dependem tanto dessa suposição que não têm muito mais a oferecer. Seus fãs adoram. Mas o que é impressionante em seu show são as justificativas, as explicações defensivas, o esclarecimento de temas. Tudo bem, faça suas piadas sobre o Holocausto e pedófilos. Mas que tal mostrar, em vez de contar.

A comédia é um campo lotado, mas para a maioria das plateias ela ainda é definida por seus maiores astros. Chappelle e Gervais fazem parte dessa elite, e a distância entre eles e o resto do mundo do stand-up parece maior do que nunca.

Essa crescente desigualdade é um dos temas do novo especial de Gary Gulman, "Born on Third Base", no Max, um programa meticulosamente engraçado que explora a lacuna entre os privilegiados e os desfavorecidos.

Ele ataca esse assunto de várias maneiras, com piadas que dissecam o mundo da comédia, uma peça inspirada sobre como as pessoas pedem no Chipotle e uma refutação ao argumento de que os pagamentos de assistência social destroem a iniciativa.

O comediante Dave Chappelle em performance no Madison Square Garden, em Nova York - Eduardo Munoz/REUTERS

Por mais diferente que Gulman seja de Chappelle na escolha de alvos, estilo e nível de fama, eles compartilham algumas qualidades. Gulman, 53 anos, também gosta de piadas que apenas alguns entenderão, e ele tem um senso distinto de "timing" que insiste na plateia se ajustar a ele.

Ele começa seu especial com a palavra "enfim". Ele está no meio ou no final de um pensamento? De qualquer maneira, estamos desorientados. Ele gosta de nos manter assim. Ele brinca com seu próprio ritmo desajeitado.

Mas Gulman também gosta de se adiantar à sua plateia, com frases repletas de palavras, referências destinadas a passar por cima de alguns presentes e outras que se deleitam em jogos de palavras. Temos a impressão de que ele tem piadas inteiras que são, entre outras coisas, uma desculpa para dizer palavras como "guillotine" ("guilhotina").

Este é o único especial que se atreve a participar desse debate: qual é o sufixo mais pretensioso na língua inglesa?

Você terá que assistir para descobrir. Mas o segundo mais pretensioso, ele argumenta, é "-esque", antes de qualificar o ponto da maneira mais pretensiosa possível: "a menos que você esteja falando de algo francês."

"Eu bajulo minha base", confessa Gulman, "que são os bibliotecários."

Dave Chapelle: Sonhador

  • Onde Disponível na Netflix
  • Classificação 14 anos
  • Elenco Dave Chapelle
  • Produção EUA, 2023
  • Direção Stan Lathan
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