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Novo livro sobre Os Trapalhões é fonte de consulta inestimável

Lançamento reúne cerca de seis décadas de declarações muitas vezes contraditórias que foram dadas pela trupe aos jornalistas

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Os Trapalhões - Modo de Ser, de Pensar e se Expressar

  • Preço R$ 199 (716 págs.)
  • Autoria Rafael Spaca
  • Editora Madrepérola

"Os Trapalhões - Modo de Ser, de Pensar e se Expressar" não é uma biografia convencional da trupe comandada por Renato Aragão. É um catatau com mais de 700 páginas, que não precisam ser lidas na ordem.

O livro de Rafael Spaca está, assim, mais para um catálogo abrangente de tudo de interessante que os membros do grupo —e pessoas ligadas a eles de alguma forma—, declararam à imprensa desde o início da década de 1960.

Cena do filme 'Os Trapalhões na Serra Pelada', de 1982 - Divulgação

Spaca é hoje o maior especialista na vida e na obra dos Trapalhões e já publicou diversos livros sobre eles. Alguns abordam aspectos específicos, como os filmes ou as HQs protagonizadas pelos humoristas.

O autor também escreveu e dirigiu a minissérie documental "Trapalhadas Sem Fim", que segue inédita. Nenhuma plataforma de streaming se interessou, supostamente porque Renato Aragão é mostrado como uma espécie de vilão. Os advogados do ator também estariam a postos para tentar embargar a exibição.

Mas, afinal, qual é verdade sobre Aragão? O comediante que emerge das páginas de "Os Trapalhões - Modo de Ser" é afável, preocupado com seus colegas e interessado em manter a qualidade de seu trabalho.

Só que logo surgem vozes dissonantes e também uma verdade incontornável —ele sempre ganhou muito mais que Dedé, Mussum e Zacarias. Brigas por dinheiro causaram uma separação do grupo, na década de 1980, e os ressentimentos ainda perduraram por muito tempo.

Ler um capítulo do livro do começo ao fim é uma experiência curiosa. Uma mesma história se repete várias vezes, mas com pequenas ou grandes variações. Por exemplo, a história de quem identificou em Dedé Santana o parceiro ideal para Renato Aragão. Como se deu o primeiro encontro da dupla? As diferentes versões são saborosas e reveladoras do funcionamento da memória seletiva.

Também fica clara a singularidade de Renato Aragão entre os gigantes do humor de sua geração. Nomes como Jô Soares, Chico Anysio ou Agildo Ribeiro não precisavam de ninguém para os apoiar em cena. Todos estrelaram shows de comédia stand-up e criaram galerias de tipos caricatos.

Já Aragão tinha basicamente só um personagem, Didi, uma versão exaltada de si mesmo —o nordestino esperto, que sempre se dava bem. E Didi raramente aparecia sozinho. Ao longo de sua carreira, Aragão sempre contou com a ajuda de um "escada", o ator que prepara o terreno para que a piada aconteça. Acabou criando uma companhia de saltimbancos modernos, que teve várias formações antes do quarteto que se tornou clássico.

O trabalho de formiguinha executado por Rafael Spaca é admirável. O autor não buscou apenas entrevistas dadas a grandes jornais e revistas de alta circulação, como as extintas Amiga ou Sétimo Céu. Também estão presentes depoimentos a veículos regionais, podcasts recentes e obscuros programas no YouTube.

Reunidos num único volume, esses milhares de declarações constituem um material de consulta inestimável para quem quiser saber mais sobre o maior fenômeno do humor brasileiro da segunda metade do século 20.

Dezenas de famosos que trabalharam com Os Trapalhões dão sua visão sobre eles, e há capítulos inteiros dedicados a cada um dos integrantes. É interessante saber, por exemplo, que Mauro Gonçalves, o Zacarias, era o único dos quatro a ter formação profissional de ator. Também era o único personagem que não era um reflexo exagerado da personalidade de seu intérprete —para compor o tipo, Gonçalves usava uma peruca.

Hoje Os Trapalhões vêm sendo descobertos por novas gerações. Mussum, especialmente, se tornou uma espécie de ídolo, retratado no cinema e imortalizado em memes. Também é ele —ou melhor, o tratamento dado a ele pelo resto do grupo— que atrai acusações de que o grupo era "politicamente incorreto" e até racista. O livro de Spaca deixa claro, no entanto, que o próprio ator inventava piadas que hoje provocariam seu cancelamento. Os tempos eram outros.

"Os Trapalhões - Modo de Ser, de Pensar e se Expressar" termina com uma longa entrevista exclusiva de José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, ao autor. O ex-todo-poderoso da TV Globo dá respostas lacônicas e parece se comportar como se ainda trabalhasse na emissora, sem fazer grandes revelações.

Mas, num ponto, é taxativo. "[Renato] sempre recebeu mais e [isso] era justo. Ele era o líder do grupo e sua figura principal."

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