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Livros abordam movimentos musicais brasileiros atuantes durante a ditadura militar

Bibliografia sonora brasileira é atualizada para mostrar como as visões artísticas refletiam as transformações política do período

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São Paulo

A bibliografia musical brasileira vai bem, obrigado. Nos últimos anos, presenciamos os lançamentos de inúmeras biografias de artistas de nossa música e livros que contam histórias de gêneros musicais ou movimentos importantes da música brasileira.

Agora, dois novos livros, escritos por duas autoras, exploram, de maneiras diferentes, dois temas instigantes a música sertaneja e a canção de protesto dentro do período da ditadura militar no Brasil.

Fãs erguem faixa com os escritos Ditadura nunca mais no último show de Milton Nascimento, no estádio Mineirão, em Belo Horizonte
Faixa Ditadura nunca mais levantada no show de despedida da carreira de Milton Nascimento, em 2022. - Foto pessoal

O primeiro é "Canção Sertaneja e Política Agrária Durante a Ditadura Militar", da historiadora Marcela Telles Elian de Lima. O segundo é "Apenas uma Mulher Latino-americana", da jornalista e fotógrafa Bruna Ramos da Fonte.

São dois livros igualmente bons, mas diferentes em suas concepções. O trabalho de Elian de Lima é uma pesquisa originalmente desenvolvida como tese de mestrado da autora.

"Apesar dos muitos estudos sobre a canção popular urbana durante a ditadura militar, em suas diferentes vertentes como a Música Popular Brasileira (MPB), a bossa nova, os artistas cafonas, o tropicalismo, a chamada canção de protesto, os festivais, o Clube da Esquina, entre outras, poucos dedicaram-se ao cancioneiro sertanejo e, muito menos, o relacionaram ao contexto político, econômico e social desse período", escreve Lima na introdução.

Já o livro de Ramos da Fonte é um interessante misto de relato sobre a história da canção de protesto no Brasil e na América Latina durante a Guerra Fria com reminiscências pessoais da autora, que conta suas viagens pela América espanhola e fala das pessoas que encontrou por esses caminhos.

"Iniciei uma peregrinação por diversas cidades e países, a fim de conversar com pessoas que um dia encontraram suas vozes revolucionárias —e foram capazes de promover verdadeiras revoluções com sua obra", escreve no prefácio.

As duas obras trazem pesquisas bem feitas e informações que interessam não apenas a admiradores dos gêneros musicais abrangidos em cada livro, mas ao público geral.

Logo na abertura do livro de Elian de Lima, ela estabelece a diferença entre música sertaneja e música caipira. A música sertaneja seria, numa definição do sociólogo José de Souza Martins publicada em 1975, "um produto da indústria fonográfica destinado a um público específico: migrantes rurais nas grandes cidades", enquanto a música caipira teria um "vínculo efetivo com o cotidiano rural por ser utilizada na ritualização das festas e comemorações religiosas".

A autora analisa uma discografia extensa, de artistas como Rolando Boldrin, Tonico e Tinoco, Tião Carreiro e Pardinho e chegando a nomes mais contemporâneos, como Almir Sater e Chitãozinho e Xororó, e mostra como as visões artísticas refletiam as transformações políticas, sociais e econômicas do período. "Os artistas sertanejos observaram as novas conexões sociais, políticas e geográficas, impostas pela política agrária iniciada em 1964, e as apresentaram sob diferentes perspectivas", escreve a autora.

Já o estilo caleidoscópico da escrita de Ramos da Fonte é capaz de abrir um capítulo descrevendo a casa da família proletária em Santo André, no ABC paulista, passar pela festa de lançamento de um livro sobre Roberto Menescal, no Rio, e mergulhar numa viagem ao Chile em busca da história da cantora e compositora Violeta Parra (1917-1967) —uma das grandes vozes da canção de protesto (o prólogo do livro é escrito por Tita Parra, neta de Violeta).

A autora de "Apenas Uma Mulher Latino-americana" chama os capítulos do livro de "ensaios", o que evidencia a natureza livre de sua narrativa. De fato, o texto é uma viagem, que pode misturar, na mesma página, a história de como a autora, estudante de um conservatório, se apaixonou pela obra de Mozart, a um papo telefônico com o político e escritor Artur da Távola.

Em outro ensaio, Ramos da Fonte lista "algumas canções para começar a conhecer a produção musical indígena contemporânea". Parece caótico, e é mesmo. Mas há beleza nesse caos.

Canção Sertaneja e Política Agrária Durante a Ditadura Militar

  • Preço R$ 54 (224 págs.)
  • Autoria Marcela Telles Elian de Lima
  • Editora UFMG

Apenas Uma Mulher Latino-Americana

  • Preço R$ 69,90 (280 págs.)
  • Autoria Bruna Ramos da Fonte
  • Editora Rocco
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