Descrição de chapéu MPME

Dinheiro curto impulsiona mais negócios de garagem em São Paulo

Modelo de empreendimento exige pouco investimento, mas requer reforma e planejamento

Dois homens de camiseta verde na frente de uma garagem
Igor Macedo e Cristiano Nunes, donos do Garagem da Pompeia Bar - Gabriel Cabral/Folhapress
Renan Marra
São Paulo

A garagem vazia é o pontapé inicial de bandas amadoras que precisam de espaço e certo isolamento acústico. Hoje também é o local escolhido por pequenos empreendedores que querem abrir um negócio novo com pouco dinheiro e evitam o custo de mais um aluguel em tempos de crise e alto desemprego.

De acordo com o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), 45% dos mais de 6 milhões de microempreendedores individuais formalizados no Brasil trabalhavam em casa no ano passado.

Os negócios residenciais são variados: vão de salões de beleza a serviços de alimentação ou gerais. Quando o empreendimento requer mais espaço físico e a sala de casa já não basta, a garagem passa a ser a melhor opção.

“É uma tendência, especialmente nesse momento em que as pessoas têm de complementar a renda ou ir para o autoemprego [empreendedorismo]. Passa a ser uma necessidade”, diz o gerente do Sebrae-SP Alexandre Robazza.

Novos negócios em garagens paulistanas têm surgido não apenas nos bairros com tradição de bares e vida noturna, como Vila Madalena ou Pinheiros, mas por toda a cidade, incluindo centro e periferia, diz Robazza.

Foi numa casa na Pompeia, zona oeste de São Paulo, que o engenheiro Igor Macedo, 35, e o professor de inglês Cristiano Zimmer, 36, decidiram abrir, em 2013, um hostel.

Surpreenderam-se ao descobrir que o ponto forte do empreendimento não eram os dormitórios, mas sim a garagem, onde funciona o Garagem da Pompeia Bar.

Hoje, o bar é tido como a prioridade de Macedo e Zimmer. Eles pretendem ampliá-lo para o interior da casa e, no futuro, fechar as portas do hostel para se dedicar inteiramente a ele. Em noites movimentadas, o estabelecimento recebe 200 pessoas.

Para começar a operação, precisaram transformar a garagem em uma cozinha —cada um investiu R$ 2.000 em equipamentos. O ambiente intimista do local, diz Macedo, é parte da receita do sucesso.

“Quisemos fazer um bar diferente e com personalidade. É aconchegante porque mantemos a estrutura da casa, com móveis domésticos como o sofá e mesas de centro”, diz Macedo.

Homem de camiseta laranja sentado em banco na frente de garagem
Gilson de Almeida na frente de seu restaurante Na Garagem Hamburgueria, em Pinheiros - Gabriel Cabral/Folhapress

Adaptar uma garagem para uma cozinha pode, porém, ter alguns problemas estruturais. O bar costuma fechar alguns dias no mês de janeiro para reformas e correção principalmente dos sistemas elétrico e hidráulico.

“Já tivemos muitos apagões e uma vez o sistema de esgoto entupiu, alagando toda a garagem, que estava cheia de cliente. Foi uma tragédia”, conta Macedo. 

Hoje, afirma ele, a estrutura do lugar está melhor preparada para receber muita gente ao mesmo tempo.

Como o espaço coberto desses ambientes para os clientes é pequeno, o clima também pode afetar os negócios. Quando chove, ninguém aparece no restaurante Na Garagem Hamburgueria Artesanal, em Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, conta seu dono, o publicitário Gilson de Almeida.

A garagem, de 18 metros quadrados, tem 13 lugares —quando há mais gente, os clientes esperam os lanches na calçada. Por causa do tamanho é preciso pensar bem no estoque: ele só trabalha com três tipos de hambúrgueres.

Apesar disso, não se arrepende de ter criado seu negócio ali, inspirado por uma viagem a Nova York, para onde tinha ido estudar gastronomia.

Almeida vende, em média, 80 hambúrgueres por dia e, no ano passado, abriu a poucos metros da sua hamburgueria um restaurante vegetariano —esse em outro tipo de imóvel.

Além da perspectiva de lucro, a qualidade de vida é apontada como incentivo por empreendedores que abriram negócios em garagem.

O designer gráfico Demian Takahashi, 39, sempre gostou de cozinhar e resolveu aprender a fazer um pão de qualidade. O experimento deu tão certo que passou a receber encomendas de amigos.

Com a produção cada vez maior, resolveu adaptar a garagem que estava vazia em uma cozinha, que ganhou forno de lastro, fermentadora, amassadeira e bancadas de aço inoxidável. 

Hoje, sua padaria Farinoca, na Vila Madalena, vende em média 150 pães por semana. As vendas ainda são feitas pelo mesmo aplicativo de mensagem usado quando só fornecia para os amigos.

“Não pegamos trânsito e temos o luxo de almoçar todos os dias em casa. Isso em São Paulo é uma grande vantagem”, diz Claudia Fugita, mulher e sócia de Demian.

Para deixar o ambiente feito para abrigar os carros mais profissional para um negócio, o Sebrae recomenda separar ao máximo o espaço do empreendimento da residência. Se possível, manter duas portas de entrada.

O professor e coordenador de projetos do Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios da Fundação Getúlio Vargas, Marcus Salusse, recomenda ainda testar a demanda do produto com o mínimo de recursos possíveis. 

Segundo ele, a casa é um bom ponto de partida para um empreendimento porque tem menos custo e risco.

“Se você tem R$ 100 mil e gasta tudo de uma vez, você teve uma chance, mas se você tenta com R$ 20 mil, você tem cinco chances de acertar”, diz.

A maior parte dos problemas de fluxo de caixa nesses negócios é causada por falta de demanda, aponta Salusse. “O empreendedor encontra algo de que ele gosta e acha que todo o mundo vai querer. Às vezes, não sabe como fazer testes e aí faz um questionário na rede social, mas dificilmente recebemos uma crítica no nosso ciclo de amizades.”

Salusse também ressalta que algumas tendências de baixo valor agregado não costumam dar certo, como lojas  de cupcakes e paletas mexicanas, que já tiveram alta, mas perderam público. 

No caso das hamburguerias, ele diz que é um modelo que tem dado certo, mas que já há muita concorrência. “Está saturando”, diz.

Antes de começar o negócio na garagem, o empreendedor deve ainda verificar se a lei de zoneamento permite que ele exerça a atividade no local. Alguns bairros e regiões são estritamente residenciais.

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