Empréstimo intercompanhia superou crédito bancário em 2018

Cerca de 26% dos recursos vieram de matrizes de multinacionais e subsidiárias globais

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São Paulo

Empresas que operam no Brasil mudaram a forma de se financiar. Em 2018, a principal fonte de recursos foram empréstimos vindo do exterior --de matrizes, no caso de companhias estrangeiras, e de subsidiárias, no caso de empresas nacionais—, com uma fatia maior que a do crédito bancário.

Segundo dados do Cemec (Centro de Estudos do Mercado de Capitais), da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), 25,6% das dívidas das empresas no ano passado correspondem a empréstimos intercompanhias, seguido por crédito bancário (24%).

É o primeiro ano que isso acontece pelo menos desde 2007, quando o estudo começou a ser feito.

Também cresceu o acesso das empresas ao mercado de capitais, que responde por 15,8% das fontes de recursos.

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Pesquisa mostra que dívidas das empresas brasileiras voltaram a crescer - Gabriel Cabral/Folhapress

O Cemec mostra que as dívidas das empresas brasileiras voltaram a crescer. Com dados até novembro, o exigíveis das companhias chegavam a 49,1% do PIB (Produto Interno Bruto), leve alta ante 2017, mas ainda menor que o pico de 2015, que era de 60% do PIB.

Os resultados foram obtidos a partir do cruzamento de dados do Banco Central, Bolsa e registros de emissões de dívidas --a metodologia, segundo o professor Carlos Rocca, diretor do Cemec, retira as sobreposições das bases de dados.

A Folha já havia mostrado em reportagem que parcela importante do dinheiro estrangeiro que entrou no país em 2018 foi reingresso de recursos de empresas. O jornal O Estado de S.Paulo noticiou que montadoras receberam US$ 15 bilhões (R$ 56 bilhões) em socorro de suas matrizes.

Segundo Rocca, uma das explicações para a entrada de recursos passa pela diferença entre as taxas de juros no mercado internacional e no país, que tornou, pelo menos até 2017, o crédito no exterior mais barato que no Brasil.

Atualmente, os juros brasileiros estão na mínima histórica de 6,5% ao ano, ainda superior às taxas praticadas nos principais países desenvolvidos. A taxa americana está entre 2,25% e 2,5%.

"Com isso, [ao longo dos anos] aumentou a vantagem de tomar empréstimo no exterior, e [aumentou a vantagem para] empresas com dinheiro lá fora trazê-lo, seja para investir, seja para substituir financiamento", afirma.

O empréstimo intercompanhias considera filiais de multinacionais e empresas brasileiras que operam no exterior.

O número sofre, porém, alguma distorção pela alta do dólar ao longo dos anos, o que aumenta a participação das dívidas no total, ainda que as empresas tenham proteção contra a oscilação do câmbio (o chamado hedge).

A mudança no perfil do financiamento das empresas reflete também um encolhimento do BNDES e o menor apetite ao crédito dos bancos, receosos com possíveis calotes no período de crise.

No caso do BNDES, além da escassez de recursos para emprestar, entrou em vigor, em 2018, a TLP (taxa de longo prazo), a nova taxa aplicada aos empréstimos do banco de fomento, mais em linha com juros praticados no mercado.

"As empresas começam a se planejar com antecedência", diz Vitor Vidal, da LCA Consultores, sobre a mudança de financiamento das empresas.

O estoque de empréstimos do BNDES, porém, é de crédito subsidiado pela taxa anterior (a TJLP), pois os financiamentos são de longo prazo e foram firmados antes de 2018.

No caso dos bancos, houve uma menor disposição a emprestar em um período em que ainda havia receio de calotes, na esteira da recessão.

Grandes bancos, como Itaú, Bradesco e Santander, mostraram nova queda no estoque de crédito concedidos a empresas no fechamento de 2018, e o segmento deve demorar a se recuperar.

Vidal diz que, de acordo com informações do BC, as instituições financeiras até começaram a mostrar mais disposição para emprestar dinheiro, antecipando um possível aumento de demanda, que ainda não existe.

"Os bancos, por mais que estejam propensos a emprestar, ainda encontram as empresas com um pé atrás. A ociosidade [da indústria] é muito grande. Vai emprestar para quem, vai fazer o que com aquele dinheiro?"

Em entrevista para detalhar os resultados do ano passado, o presidente do Bradesco, Octavio De Lazari, afirmou que projetos de empresas começam a sair da gaveta, mas que a demanda por recursos deverá ser preenchida pelo mercado de capitais.

Visão semelhante apareceu em entrevistas dos presidente de Itaú, Candido Bracher, e Santander, Sergio Rial.

A Anbima (associação do setor do mercado de capitais) mostrou que, em 2018, empresas fizeram mais emissões de dívidas (debêntures) no ano passado. Foram 303 operações, acima das 270 registradas em 2017.

"Houve uma mudança muito forte na forma como as empresas passaram a se financiar, e a perspectiva é que esse movimento vai reforçar muito", afirma Rocca.

Para o diretor do Cemec, inovações regulatórias, como a duplicata eletrônica e o cadastro positivo, devem aprofundar esse processo de mudança porque abrirá mercado para novas formas de financiamento.

"Quando se melhoram as garantias, abre-se espaço para Fdics [fundos de direitos creditórios], que podem reunir os recebíveis de empresas", diz Rocca.

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