PF investiga desvio de R$ 40 milhões na Cemig por meio da Renova Energia

Esquema fez uso de empresas-fantasma; executivos da estatal, da Codemig e da Andrade Gutierrez são investigados

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São Paulo

 A Polícia Federal, a Receita Federal e o Ministério Público Federal deflagraram nesta quinta-feira (11) a Operação E O Vento Levou para apurar um suposto desvio de R$ 40 milhões da Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais), através de uma de suas subsidiárias, a Cemig Geração e Transmissão. O trabalho é resultado da quarta fase da Operação Descarte.

A PF investiga um suposto repasse de R$ 40 milhões da Cemig para a empresa Renova Energia, por meio de contratos falsos. A empresa teria, posteriormente, utilizado parte do recurso em contrato superfaturado com a empresa Casa dos Ventos Energias Renováveis, a qual repassou o valor a outras empresas e pessoas físicas.

Foram expedidos pela 2ª Vara Criminal da Justiça Federal de São Paulo 26 mandados de busca e apreensão para os endereços das pessoas e empresas envolvidas com os fatos investigados, nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Taubaté, Nova Lima e Mogi das Cruzes.

Alguns dos envolvidos foram identificados e outros estão sendo investigados. Eles devem responder, nos próximos dias, pelos crimes de associação criminosa, falsidade ideológica, evasão de divisas, peculato (desvio de recursos públicos) e lavagem de dinheiro. 

Esquema de repasses está ligado a contratos fraudulentos envolvendo empresas de energia eólica. - Reuters

A investigação apura inicialmente o suposto envolvimento de Djalma Bastos de Morais, que esteve à frente da Codemig em 2014, além de outros executivos e acionistas da estatal mineira, da Cemig, Andrade Gutierrez, Renova e Casa dos Ventos Energias Renováveis na fraude, além dos operadores financeiros e outras empresas usadas para escoar o dinheiro desviado. De acordo com a PF, Djalma era um dos executivos que tinha papel preponderante no esquema, definindo os beneficiários do dinheiro.

Segundo os investigadores, o esquema de repasses está ligado a uma estrutura muito maior de lavagem de dinheiro e peculato.

Eles apontaram alguns dos operadores financeiros como sendo os mesmos envolvidos na primeira fase da Operação Descarte, em março de 2018, em que o Consórcio Soma - associação de empresas que presta serviços para a Prefeitura de São Paulo - foi investigado por transações com fornecedores de materiais que operavam fraudes também com notas fiscais frias. 

O esquema

De acordo com a PF, as investigações da Operação Descarte chegaram a um operador financeiro, que seria um escritório de advocacia de São Paulo especializado na emissão de notas fiscais frias, com o propósito de lavar dinheiro, sonegar tributos e justificar desvios de empresas de terceiros. 

"O empresário que queria desviar um dinheiro da sua empresa procura esse escritório, que tinha um portfólio de empresas de fachada, e oferecia à pessoa notas de empresas do seu ramo de atividade", explicou o delegado da Polícia Federal Victor Hugo Rodrigues Alves em coletiva a jornalistas nesta quinta-feira (11). "A partir daí, o empresário consegue justificar a saída de dinheiro da empresa e pagava um percentual do valor da nota fiscal como remuneração pelos 'serviços' do escritório".

Identificadas essas pessoas, disse o delegado, foram cumpridos mandados de busca e apreensão que identificaram todo o portfólio de empresas de fachada que era usado para lavar o dinheiro. A Receita passou, então, a fiscalizar as empresas que se valiam desses serviços fraudulentos. 

De acordo com o procurador da República Vicente Mandetta, um dos executivos dessas empresas investigadas era da Casa dos Ventos Energias Renováveis. Ele teria, segundo Mandetta, procurado o Ministério Público Federal para colaborar com as investigações e confirmado que as notas fiscais representavam serviços inexistentes. Com a continuidade das investigações, outros dois executivos - um deles da Renova Energia - também passaram a colaborar com o MPF.

Operação Descarte é força-tarefa que surgiu a partir da delação premiada do doleiro Alberto Youssef, um dos protagonistas da Lava Jato. - Paulo Lisboa/Folhapress

Segundo o delegado Victor Hugo, a Casa dos Ventos Energias Renováveis teria, em 2014, vendido um projeto de energia eólica para a Renova Energia, no valor de R$ 105 milhões. "Próximo ao pagamento do valor, o fundador da Renova e o seu principal executivo procuraram o fundador da Casa dos Ventos. E fizeram a seguinte proposta: nós fechamos por R$ 105 milhões, mas vamos pagar R$ 145 milhões para vocês. Ou seja, R$ 40 milhões a mais. E, depois, a Casa dos Ventos transferiria esses R$ 40 milhões para as pessoas e empresas que a Renova indicasse, a mando da Cemig", disse. 

Em seguida, de acordo com os investigadores, era adicionada nova camada de lavagem de dinheiro. Com o dinheiro já escoado para as empresas finais, a quantia era convertida em dinheiro em espécie e entregue para vários beneficiários. 

"Assim que os R$ 40 milhões caíram na conta da Casa dos Ventos, começaram as pressões para o escoamento do dinheiro, principalmente por executivos da Cemig, da Andrade Gutierrez Energia e da Codemig. Eles começaram a pressionar os executivos da Renova para interceder junto aos da Casa dos Ventos para que os valores fossem escoados", explicou Mandetta.

De acordo com o procurador da República, estão sendo apurados os beneficiários finais do dinheiro, bem como pessoas envolvidas no processo de lavagem, sócios das empresas de fachada usadas no esquema, outras que emitiram notas fiscais frias, pessoas que fizeram a entrega do dinheiro e os operadores financeiros responsáveis.

Os envolvidos

A Cemig informou que a PF esteve em sua sede em Belo Horizonte nesta quinta para cumprir o mandado de busca e apreensão devido a indícios de desvios, apurados em investigação de fatos anteriores a 2015, na empresa Renova, com sede na capital paulista.

"A Cemig esclarece que está em total colaboração com as autoridades e que também tem interesse na rápida evolução dessas investigações", segundo comunicado. 

A Andrade Gutierrez disse em nota que ainda busca informações sobre a operação, mas que se coloca à disposição para esclarecimentos.

"A empresa já demonstrou reiteradamente sua disposição de colaboração com a Justiça e esclarecer fatos ocorridos no passado por meio dos diversos acordos firmados com o Ministério Público Federal, CGU (Controladoria Geral da União), AGU (Advocacia Geral da União) e Cade", disse a companhia em nota.

A Casa dos Ventos Energias Renováveis afirmou que a empresa e seus acionistas e executivos não foram objeto de busca e apreensão e que já colabora com autoridades na apuração de fatos ocorridos há cinco anos e que estão sob sigilo.

A Renova Energia informou que irá colaborar com todas as informações necessárias para auxiliar os trabalhos da Polícia Federal e do poder judiciário.

"A Renova Energia afirma o seu compromisso com a transparência e que manterá todos informados sobre a evolução dos fatos", disse a empresa em nota.

Polícia Federal deflagra quarta fase da Operação Descarte
Polícia Federal deflagra quarta fase da Operação Descarte - Eduardo Knapp/Folhapress
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