Coronavírus altera consumo de internet e fragiliza usuários mais pobres

Com regime de home office, população sem banda larga fixa deve aumentar consumo móvel e ver franquia acabar antes

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

A alteração na rotina da população brasileira com o avanço do coronavírus tende a sobrecarregar parte da infraestrutura de internet.

O cálculo é simples: crianças fora do colégio passam a consumir vídeos do YouTube e a jogar videogame online em casa. Profissionais que usavam a rede corporativa para trabalhar agora fazem videoconferências e usam o streaming em horários e locais em que as redes estavam ociosas.

No contexto de famílias em trabalho remoto, é quase inevitável o aumento do consumo de vídeo, formato que demanda mais banda larga. O comportamento de um dia útil passa a se aproximar ao padrão de um domingo.

A camada mais pobre da população, entretanto, deve sofrer mais no bolso com essas mudanças, de acordo com especialistas ouvidos pela Folha.

Coronavírus vai alterar comportamento de usuários; redes móveis serão consumidas mais rapidamente
Homem mexe no celular em ponto de ônibus em São Paulo - Danilo Verpa/Folhapress

O uso da internet no Brasil está distribuído em 32,5 milhões de acessos na banda larga fixa e 226,7 milhões na rede móvel, segundo a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). Nas classes D e E, 83% do acesso é móvel, ou seja, essas pessoas priorizam pacotes de celular finitos, e não a internet residencial.

Com crianças em casa usando a rede móvel para lazer ou estudo, o consumo aumenta e a franquia termina antes. Nas zonas mais ricas, pode haver estrangulamento de alguns pontos, mas as operadoras podem remanejar o tráfego, o que exige investimento.

“Usuários de internet de baixa renda ficam com possibilidade reduzida de acesso à informação nesse contexto. Nas zonas centrais de São Paulo, por exemplo, além de oferta de infra de banda larga, houve investimento de novas redes de fibra ótica”, diz Flávia Lefèvre, advogada em telecomunicações e conselheira do Intervozes.

Em situações de emergência como a atual, uma das preocupações é que a população de renda mais baixa consiga acessar informações essenciais de saúde pública, como comunicados oficiais divulgados em portais dos governos.

O Marco Civil da Internet prevê que haja quebra de neutralidade da rede nesses casos, o que significa que alguns conteúdos podem ter privilégio em detrimento de outros. Assim, informações que impactam a vida do cidadão durante a pandemia podem ser transmitidas nos pacotes de internet, mesmo que eles tenham se esgotado.

As grandes operadoras se movimentam para lidar com essa mudança no uso. A Claro instaurou um comitê de crise para avaliar a capacidade de sua rede. Diz que oferecerá mais internet na banda larga de casa e, também, em pontos públicos de wi-fi.

A Oi afirma que reforçou os plantões de implantação, reparo e manutenção de seus serviços. A Vivo informou que dará bônus de internet para clientes móveis.

Os problemas devem aparecer mais na esfera operacional do que em um possível “desabastecimento” da internet, de acordo com Julio Sirota, gerente no IX.br, braço do Comitê Gestor da Internet que cria a infraestrutura para a interconexão de redes.

“Do ponto de vista técnico, não vejo problemas [de fornecimento]. Estamos num estágio inicial, o problema é o estágio operacional, o acesso aos datas centers, a dificuldade de transporte. Agora, as próprias operadoras estão aumentando a capacidade dos usuários”, afirma.

Será preciso equilibrar o fluxo de redes ociosas, que costumavam ter alto fluxo durante a semana —como na av. Paulista—, com redes de locais mais periféricos. Para isso, é preciso investimento, e o problema é que o desembolso em telecomunicação costuma ser para o longo prazo.

Uma saída temporária é o uso de estações rádio-base móvel, que provêm internet em grandes eventos, como em jogos de futebol ou no Réveillon de Copacabana.

As operadoras, que se manifestaram por meio da associação SindiTelebrasil, afirmaram que têm “compromisso com a garantia de conectividade” e que ela é elemento-chave para viabilizar as relações pessoais, de estudo e de trabalho neste momento.

A Anatel diz que as redes de telecomunicações são projetadas e implementadas “com capacidade além do trafego normal, de modo a suportar aumentos repentinos de demanda”.

Em nota, a agência também afirmou que as prestadoras “têm obrigação regulatória de ter planos de continuidade e qualidade”.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.