Descrição de chapéu Financial Times

Dona da Louis Vuitton recorre à Justiça para não comprar Tiffany

Em processo, grupo francês alega que má gestão da joalheria americana na pandemia invalida oferta inicial de US$ 16,6 bi

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Leila Abboud James Fontanella-Khan Sujeet Indap
Paris e Nova York | Financial Times

Um desempenho “catastrófico” desde que irrompeu o coronavírus resultou em perspectivas “lúgubres” para o futuro da Tiffany, de acordo com a companhia que até recentemente desejava comprar a joalheria de luxo americana por US$ 16,6 bilhões.

O conglomerado LVMH, comandado pelo magnata francês Bernard Arnault e dono de grifes como Louis Vuitton, fez esse ataque ferino à Tiffany e aos seus gestores em um processo lançado no final do desta segunda-feira (28), no qual a empresa busca a aprovação de um juiz para abandonar seu acordo de aquisição.

Em uma petição de 97 páginas apresentada a um tribunal americano no estado do Delaware, a LVMH argumentou que as decisões da Tiffany de cortar seus investimentos de capital e gastos de marketing, elevar suas dívidas e pagar dividendos em dinheiro a despeito da pandemia significam que ela é um negócio diferente daquele que o grupo francês fechou acordo para comprar.

Logo da Louis Vuitton em uma loja no Champs-Elysees em Paris, França - Charles Platiau/Reuters

A petição é o mais recente lance na batalha judicial que determinará o destino de uma transação acertada no ano passado para tornar a joalheria sediada em Nova York parte do império de Arnault, que abarca grifes como Louis Vuitton, Christian Dior e Bulgari. A Tiffany já abriu um processo contra o LVMH exigindo que este mantenha o acordo.

Um julgamento acelerado foi marcado para o começo de janeiro, ainda que as duas companhias estejam buscando uma solução negociada antes disso.

O LVMH afirmou em sua petição que a Tiffany “não estava preparada para os desafios que a aguardam” e que “seu desempenho foi catastrófico e suas perspectivas continuam lúgubres”, depois de registrar prejuízos de US$ 45 milhões no primeiro semestre de 2020.

“O desempenho da Tiffany continuará a ser fraco [e suas] projeções para o quarto trimestre de 2020 são dúbias se considerarmos o impacto corrente, e substancial, da pandemia, que continua a prejudicar as vendas da Tiffany e não mostra sinais de se abater”, afirmou o conglomerado de produtos de luxo.

O LVMH também acusou os gestores da Tiffany de tentar forçar a implementação do acordo porque seus principais executivos lucrarão caso a transação seja concluída. O LVMH afirmou que Alessandro Bogliolo, o presidente-executivo da Tiffany, embolsaria cerca de US$ 44 milhões, acrescentando que “esse presente de despedida equivale ao prejuízo da Tiffany no primeiro semestre de 2020”.

Os tribunais do Delaware só permitiram que um comprador abandonasse um acordo de fusão previamente anunciado em uma ocasião, e sempre se mostraram profundamente céticos quanto a argumentos sobre “efeitos materiais adversos”, a que potenciais compradores recorrem para afirmar que eventos externos justificam que eles abandonem um acordo. Isso levou o LVMH a afirmar que os gestores da Tiffany descumpriram seus deveres administrativos para com a companhia no período entre a assinatura e a implementação do acordo.

A Tiffany insistiu em que agiu em defesa dos interesses de seus acionistas.

Além de intensificar dramaticamente a guerra verbal entre o LVMH e a Tiffany sobre a gestão da joalheria, a petição da segunda-feira também inclui um argumento legal crucial da parte do grupo francês, cujo objetivo é persuadir o tribunal do Delaware a invocar o efeito material adverso: a Tiffany não incluiu uma pandemia em sua lista de eventos catastróficos mencionados especificamente como riscos com os quais o LVMH teria de arcar.

A Tiffany buscou, e conseguiu, ressalvas semelhantes para ataques cibernéticos, protestos na França, e inquietação em Hong Kong que prejudiquem as operações de varejo, argumentou o LVMH, o que demonstra que a empresa americana e seus advogados compreendiam a importância dessas cláusulas para determinar as circunstâncias em que o LVMH seria obrigado a completar a transação.

“E no entanto a Tiffany não estabeleceu ressalvas para crises de saúde pública ou pandemias”, a petição afirma. “Diante desse cenário, a decisão de duas partes interessadas sofisticadas, representadas por assessores sofisticados, de omitir uma ressalva para pandemias é reveladora. A pandemia causou um efeito material adverso que autoriza o LVMH a abandonar o acordo”.

O LVMH vem manobrando nos bastidores há meses para pressionar a Tiffany a aceitar um preço mais baixo, depois que Arnault se convenceu de que o preço de US$ 135 por ação que as empresas acertaram em novembro fazia pouco sentido tendo em vista as perspectivas mais sombrias para o setor de bens de luxo depois da pandemia.

A Tiffany se recusou repetidamente a considerar um corte de preços, e afirmou que o grupo francês devia honrar os termos originais.

Logo da Tiffany & Co em loja em Manhattan em New York, Estados Unidos - Carlo Allegri/Reuters

Enquanto prosseguem as escaramuças judiciais, o LVMH vem enfrentando reações negativas cada vez mais fortes na França sobre seu possível pedido de assistência ao governo francês na batalha.

Quando o LVMH afirmou, no começo do mês, que não completaria a aquisição da Tiffany na forma planejada, atribuiu a responsabilidade pela atitude a uma carta do Ministério do Exterior francês que solicitava a empresa a postergar a transação até 6 de janeiro a fim de ajudar o país em uma disputa de comércio internacional com os Estados Unidos.

O LVMH vem negando repetidamente que tenha pedido ao governo que enviasse essa carta, mas afirmou que acredita que ela equivalha a uma ordem formal das autoridades da França.

Questionando no Legislativo francês na semana passada, Jean-Yves Le Drian, o ministro do Exterior francês, disse ter escrito a carta em resposta a uma questão apresentada pela LVMH. “Meu papel é aplicar, se necessário, a opinião do governo sobre avaliações de natureza política quanto à administração de grandes eventos internacionais que estejam por vir”, disse Le Drian. “Essa é a razão para que eu tenha respondido a uma pergunta do grupo LVMH, totalmente no exercício de minhas funções”.

Tradução de Paulo Migliacci

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