Descrição de chapéu Financial Times União Europeia Europa

Proposta da UE de banir importação de área desmatada é protecionismo, diz chanceler brasileiro

Carlos França diz que dados sobre destruição da Amazônia 'não são tão ruins quanto parecem'

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Michael Stott Michael Pooler
Brasília | Financial Times

O ministro das Relações Exteriores, Carlos França, atacou a União Europeia por "protecionismo comercial" e "miopia" depois que o bloco propôs a proibição de importações agrícolas originárias de áreas desflorestadas. Atacou também a França por sua política de subsídios agrícolas.

Bruxelas propôs neste mês uma lei que obrigaria as companhias que vendem carne, soja, óleo de palma, café, cacau e madeira para o bloco europeu a provar que as matérias-primas não foram produzidas em terra que foi desmatada ou degradada (mesmo que de forma legal) depois de 2020.

O Brasil é um grande exportador de muitos dos produtos visados, e a iniciativa da UE reativou antigas tensões com o governo Jair Bolsonaro, que vê motivos escusos por trás da proposta do bloco.

"O que eu não posso aceitar é usar o meio ambiente como uma forma de protecionismo comercial. É ruim para os consumidores [e] para os fluxos comerciais", disse França, em entrevista ao Financial Times. "Acho que há uma certa miopia da União Europeia."

A legislação proposta foi publicada pouco antes que novos dados de satélite mostrassem que a destruição da Amazônia brasileira atingiu o maior nível de 15 anos, provocando novas perguntas sobre o compromisso do governo com a proteção da maior floresta tropical do mundo.

Carlos França, ministro das Relações Exteriores, discursa no Palácio do Itamaraty, em Brasília - Evaristo Sá - 25.nov.2021/AFP

Mais de 13,2 mil quilômetros quadrados foram devastados nos 12 meses até julho último, alta de 22% em relação ao ano anterior, segundo dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Foi o índice de desflorestamento mais rápido na Amazônia brasileira desde 2006.

Os números obscureceram os aplausos que o Brasil recebeu por seus esforços na COP26, a cúpula sobre a mudança climática realizada neste mês em Glasgow, incluindo uma promessa de conter o desmatamento ilegal até 2028 e uma meta mais ambiciosa de zero emissões líquidas até 2050.

França descreveu os últimos dados sobre a destruição da floresta como "surpreendentes", mas disse que os números "não são tão ruins quanto parecem" porque houve uma melhora desde julho. Os dados do Inpe para agosto, setembro e outubro deste ano sugerem uma redução de 28% no número de queimadas florestais.

"Não há um desejo do Brasil de esconder o problema", acrescentou o ministro. "Quando há desflorestamento ilegal, muitas vezes está ligado a outros crimes, como infrações trabalhistas, evasão fiscal e lavagem de dinheiro. Estamos tratando isso como um assunto de polícia, e está dando resultados."

O Brasil se orgulha de seu setor agrícola tecnologicamente avançado e altamente produtivo, e com frequência as autoridades salientam que a vasta maioria das exportações agrícolas do país vêm de terras manejadas adequadamente no centro-sul do país, não de floresta derrubada ilegalmente na Amazônia.
França destacou nas críticas o apoio dado pelo Estado francês a seu setor agrícola.

"Entendo as razões políticas internas do governo francês para apoiar seus agricultores. Não é ambientalmente correto que eles deem subsídios [agrícolas]. Porque a terra e a água são recursos escassos, e operá-los de modo ineficiente não é sustentável.

"É melhor plantar aqui no Brasil, onde a agricultura está cada vez mais avançada tecnologicamente, do que produzir na França."

Os atritos entre o Brasil e seus parceiros europeus contribuíram para o impasse na ratificação de um acordo comercial negociado a duras penas durante 20 anos entre a UE e o Mercosul.

Bruxelas está relutante em avançar na ratificação do acordo por causa da forte oposição de alguns países-membros, que acreditam que o Brasil em particular não está fazendo o suficiente para combater o desflorestamento.

França afirmou que o pacto comercial "não está avançando".

Um diplomata de carreira de perfil discreto que serviu períodos nos Estados Unidos, na Bolívia e no Paraguai, França já foi chefe de protocolo no palácio presidencial com Bolsonaro. Ele foi nomeado ministro das Relações Exteriores em março, substituindo Ernesto Araújo, um declarado ideólogo do movimento bolsonarista conhecido por sua admiração a Donald Trump e rejeição do "globalismo", e que já foi acusado de hostilidade em relação à China.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.