Tesouro vê superávit suficiente para queda da dívida pública até o fim da década

Relatório inédito do órgão traça projeções fiscais para os próximos 10 anos; divulgação será semestral

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Brasília

As contas públicas do país devem sair do vermelho e registrar superávit a partir de 2024, resultado que ganhará força nos anos seguintes e recolocará a dívida pública em trajetória de queda até o fim da década, projeta o Tesouro Nacional.

As estimativas foram divulgadas pelo órgão em um documento inédito, que traça um panorama detalhado para a situação das finanças do país em um horizonte de dez anos. A atualização desses dados ocorrerá a cada seis meses.

O secretário do Tesouro Nacional, Paulo Valle, destacou que o novo Relatório de Projeções Fiscais será importante para subsidiar o debate sobre as políticas públicas no país, inclusive no momento em que diferentes candidatos à Presidência da República defendem mudanças nas regras fiscais —a principal delas o teto de gastos, que limita o avanço das despesas à inflação.

O secretário do Tesouro Nacional, Paulo Valle, em entrevista coletiva - Washington Costa - 29.out.2021/Ascom ME

"Somos uma fonte essencial de dados, e nosso objetivo é fornecer esses dados para gerar o debate", disse Valle nesta quarta-feira (29). "O objetivo é que ele realmente sirva não só ao debate na eleição, quando esse tipo de dado é até mais observado, mas permanentemente."

Na avaliação do secretário, os cenários traçados pelo Tesouro, com base em premissas técnicas, podem "facilitar as escolhas futuras" de políticas. O documento é resultado do trabalho de um grupo de quase 20 técnicos do órgão.

Segundo as estimativas, a dívida bruta do governo geral deve fechar este ano em 78,3% do PIB (Produto Interno Bruto), subir a 78,5% em 2023 e cair paulatinamente até 69,9% do PIB em 2031 —patamar próximo ao que era observado em 2016.

Já a dívida líquida, que desconta ativos como as reservas internacionais, deve fechar o ano em 59,9% do PIB e continuará subindo até 2027, mas depois inicia uma trajetória de queda, atingindo 60,9% do PIB em 2031.

Os cálculos do Tesouro indicam a possibilidade de o Brasil registrar superávits crescentes em suas contas. Neste ano, a previsão ainda é negativa, com rombo equivalente a 0,6% do PIB. Mas em 2024 as contas voltariam ao azul, com superávit de 0,2% do PIB, após 10 anos de rombos sucessivos, desde 2014.

O resultado continuaria melhorando de forma consistente até atingir 2,5% do PIB em 2031. O superávit nada mais é que um sinal de que o governo arrecada mais do que gasta. Essa economia é usada no pagamento de juros da dívida pública.

Tão importantes quanto os resultados de médio e longo prazo, porém, são as premissas usadas pelo Tesouro Nacional. A primeira delas é a manutenção do desenho atual do teto de gastos ao menos até 2026.

A partir de 2027, o órgão considera que os precatórios (dívidas após sentença judicial definitiva) voltarão a ser pagos integralmente, revertendo o parcelamento aprovado na PEC dos Precatórios.

Para manter um nível sustentável de despesas discricionárias, que incluem os investimentos e o custeio da máquina pública, o Tesouro também adota como premissa que o teto de gastos passará a permitir um crescimento real das despesas (isto é, acima da inflação) de 1,5% ao ano a partir de 2027.

"Não se trata de um posicionamento do Tesouro sobre políticas públicas específicas", ressaltou o subsecretário de Planejamento Estratégico da Política Fiscal do Tesouro, David Athayde. Segundo ele, as simulações demonstram a importância de ter uma regra fiscal consistente e duradoura, seja ela qual for.

"Qualquer discussão que venha a ter sobre teto de gastos, é fundamental para ter visão de médio e longo prazo", afirmou.

Valle também destacou que o saldo final das contas em 2022 não deve ser tão afetado pelas recentes medidas em tramitação no Congresso Nacional para minimizar o impacto da alta dos combustíveis.

A PEC (proposta de emenda à Constituição) que prevê o estado de emergência em função dos preços de petróleo e derivados abriu caminho para R$ 38,7 bilhões em despesas com benefícios sociais em ano eleitoral, todas feitas fora do teto de gastos. O governo ainda abriu mão de outros R$ 16,8 bilhões em receitas para desonerar tributos federais sobre gasolina e etanol até o fim do ano.

O custo total de R$ 55,5 bilhões do novo pacote deve ser compensado pelo ingresso de receitas extraordinárias com a privatização da Eletrobras (R$ 26,6 bilhões) e dividendos adicionais da Petrobras (cerca de R$ 10 bilhões no próximo trimestre) e do BNDES (R$ 18,8 bilhões referentes a anos anteriores).

O subsecretário da Dívida Pública do Tesouro, Otávio Ladeira, afirmou que o novo relatório amplia o horizonte das análises fiscais do governo, hoje restritas a um período de três anos, como usualmente é contemplado na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e na LOA (Lei Orçamentária Anual).

"Quando a análise se limita a três anos, ainda que seja razoável para algumas observações, para outras não ajuda", disse. Ele também ressaltou que o Tesouro terá mais liberdade para "trazer um ponto interessante ou outro" para fomentar o debate.

Na avaliação do subsecretário, uma das grandes contribuições do documento é mostrar que, mesmo com esforços recentes para controlar a dívida pública, o Brasil ainda está longe de seus pares. Economias emergentes têm um endividamento ao redor de 64% do PIB.

Países com grau de investimento, selo de bom pagador que dá acesso a um mercado mais amplo e com custo menor de juros, têm um nível ainda menor de dívida pública.

"Não é uma discussão de sustentabilidade, a dívida [do Brasil] tem se mostrado sustentável sem tantas preocupações. A questão é o quão relevante é a discussão do financiamento a custos mais razoáveis, e isso é uma discussão eminentemente política", afirmou Ladeira.

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