Descrição de chapéu The New York Times

Disparada dos aluguéis faz casais se juntarem mais cedo nos EUA

Disparada dos preços motiva jovens a morarem juntos antes do que planejavam

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Anna P. Kambhampaty
The New York Times

Xin-rui Lee não queria morar com seu namorado no começo.

Eles estavam juntos há um ano e oito meses mas, depois de uma semana de teste de convivência durante uma viagem à Cidade do México, Lee se lembra de ter voltado com o forte sentimento de que aquela não era uma situação que gostaria de tornar permanente.

"Eu por fim cheguei à conclusão de que, vivendo com um parceiro, eu não me sentiria confortável para ser tola como gosto de ser às vezes", disse Lee, 26, que é especialista em comunicações.

"Eu estava cansada do trabalho, uma noite, e comi um doce com maconha, mas ele estava por perto o tempo todo e eu simplesmente não queria que ele reparasse naquilo. Fiquei me sentindo embaraçada demais".

Aluguéis em alta motivaram alguns jovens casais a morarem juntos mais cedo do que o planejado - Richard A Chance/The New York Times

​O desejo dela de morar sozinha foi mudando lentamente, quando as realidades atuais do mercado de locação se fizeram sentir. O senhorio de Lee anunciou que o aluguel atual dela aumentaria em US$ 300 por mês e, depois de uma rápida busca online de imóveis para alugar, ela chegou à conclusão de que morar com seu parceiro talvez fosse a escolha certa. Com isso, os dois começaram a procurar apartamentos juntos, e esperam encontrar um lugar até o final do próximo trimestre.

Com a disparada dos aluguéis nos Estados Unidos, nos últimos meses, muitos casais estão escolhendo morar juntos antes do que esperavam, para poder bancar seus aluguéis, apresentar candidaturas mais fortes a imóveis ou encontrar o bairro ideal. Com o relaxamento das restrições da pandemia e as pessoas voltando para as cidades, o mercado de moradias para alugar não está conseguindo acompanhar a demanda.

Em maio, o valor mediano de locação de um apartamento na região nova-iorquina de Manhattan atingiu o valor recorde de US$ 4.000, de acordo com a corretora de imóveis Douglas Elliman. Nos Estados Unidos como um todo, os valores pedidos para locação subiram em 15% em maio ante o mesmo mês em 2020, de acordo com a corretora de imóveis Redfin.

Muitos casais agora estão empolgados quanto a dar o próximo passo em seu relacionamento, mas também surgiram medos novos, relacionados a depender de outra pessoa mais cedo do que o planejado, em termos financeiros e de localização.

"Onde fica a porta de escape?"

Embora Lee continue preocupada quanto a certos aspectos de viver com seu namorado, ela vê positivamente a oportunidade de somar recursos a fim de criar um lar melhor.

"Quero ter uma casa bonitinha e aconchegante, e juntos isso pode se tornar possível. Vamos poder caprichar nos tapetes. Vamos poder caprichar na arte", disse Lee. "A falta de espaço para que possamos nos distanciar um pouco um do outro me preocupa, mas também confio em que conseguiremos criar um ritmo que funcione para nós".

"Fico um pouco ansiosa ou temerosa de que morar juntos tenha impacto negativo sobre o nosso relacionamento, mas também pode ser que seja uma oportunidade maravilhosa", afirmou.

Xin-rui Lee e Addison Bale, que uniram seus recursos para encontrar um apartamento juntos, em Nova York, em 17 de junho de 2022 - Hilary Swift/The New York Times

A ansiedade que o casal sente pode ter bons motivos. Arielle Kuperberg, professora associada de sociologia e estudos de gênero na Universidade da Carolina do Norte em Greensboro, disse que "quando você vai morar com alguém, se separar da pessoa se torna muito mais difícil. Seria preciso encontrar um novo apartamento. Seria preciso cancelar um contrato ou, ainda mais complicado, continuar a dividir a casa com alguém de quem você está separado".

Essas barreiras adicionais a uma separação significam que certas características ou desacordos que teriam significado o fim de um relacionamento, antes que o casal morasse junto, agora passam a ter de ser tolerados ou resolvidos, disse Kuperberg.

Se você vive com o seu namorado ou namorada, "é provável que divida a cama com a pessoa. Onde fica a porta de escape?", disse Sharon Sassler, coautora de "Cohabitation Nation" e professora de sociologia na Escola de Política Pública da Universidade Cornell.

Mesmo para casais que já estivessem planejando dividir um apartamento, o mercado desordenou planos. Jennifer Gamarra, 25, e Michael Kaplan, 26, estavam namorando há dois anos e planejavam encontrar um novo apartamento e viver juntos quando seus contratos atuais de locação acabassem, em julho.

Eles queriam morar no Upper West Side de Nova York, em um apartamento de dois quartos e um edifício que oferecesse comodidades adicionais como uma sala de ginástica e espaço de armazenagem para bicicletas, e por isso registraram suas especificações no StreetEasy e iniciaram sua busca."Minha esperança era de que combinar nossos orçamentos permitisse encontrar um lugar um pouco mais chique", disse

Kaplan, que é engenheiro de software. Mas eles rapidamente descobriram que isso não seria possível. "Muitos dos lugares que visitamos, mesmo aqueles com preço superior a US$ 5 mil por mês, não tinham salas de estar confortáveis, e não havia espaço adequado para trabalhar em casa", disse Kaplan.

O casal decidiu que Gamarra simplesmente se mudaria para o apartamento de um quarto em que Kaplan mora, cujo aluguel subiu de US$ 2,2 mil para US$ 3 mil por mês.ll

Embora os dois estejam contentes por dividir a casa, como esperavam, há novas preocupações surgidas com a mudança de Gamarra para a casa de Kaplan.

"Queríamos um lugar novo ao qual pudéssemos dar a nossa cara, mas estou me mudando para o apartamento dele, o que cria a sensação de que vou morar na casa dele, e não na nossa casa", disse Gamarra, que está fazendo doutorado. "Tentar fazer com que o apartamento seja o nosso primeiro lar juntos será mais difícil para mim".

O The New York Times tinha entrevistado um casal que decidiu não participar mais desta reportagem depois de perceber que discordava quanto aos motivos que tinha para dividir uma casa. Os dois trabalham na área de serviços de alimentação. Enquanto um dizia que o aluguel alto era um motivo para que eles dividissem um apartamento, o outro afirmava que dividir a casa era o próximo passo no relacionamento.

"Discordar não é a melhor receita para o sucesso ou satisfação em um relacionamento. Se, dentro de um ano, o parceiro que considerava morar juntos o passo certo a tomar quiser um noivado, e o outro não, o que acontece?", questionou Sassler.

Mas se o relacionamento for forte, dividir um apartamento pode ser uma decisão ótima, ela acrescentou. "Quando você acorda ao lado de alguém todo dia, vai descobrir se a pessoa prepara o café e o serve na cama. Não é algo que alguém com quem você só divida um apartamento faz", ela disse.

Essa proximidade romântica adicional é exatamente aquilo que Kenneth Yeung, 23, um gerente de produtos que mora em Brooklyn, esperava.

Yeung e seu namorado estavam juntos há menos de um ano, e os dois queriam continuar morando em seu bairro, Williamsburg, onde o aluguel médio de um apartamento de um quarto subiu em 25% nos últimos 12 meses. Yeung teve a sorte de conseguir um lugar de preço acessível, e os dois planejavam dividir um apartamento de um quarto e aluguel mensal de US$ 2,7 mil, a partir de julho. O sonho deles era comprar uma mesinha de café Noguchi e projetar uma casa de acordo com suas preferências.

"Nós teríamos preferido esperar pelo menos para que nosso relacionamento completasse um ano", disse Yeung. "Mas, com o mercado de locação atual e nosso forte desejo de ficar no mesmo bairro, achamos que fazia mais sentido morar juntos".

No entanto, depois de sua primeira conversa com o The New York Times, Yeung e seu namorado decidiram desmanchar.

"A pressão criada por termos uma data firme para morar juntos nos levou a reavaliar se essa era uma boa decisão neste momento", disse Yeung. "E criou muito estresse para que fizéssemos dar certo".

Agora Yeung vai se mudar para o apartamento sozinho e, sem alguém com quem dividir o aluguel, terá de planejar seu orçamento meticulosamente. "Vou pedir menos comida fora, jantar fora só uma vez por semana, parar de pedir café delivery", ele disse. "Vou tentar cortar todos esses pequenos luxos cotidianos para poder pagar o aluguel". Ele também teve de se despedir do sonho da mesinha Noguchi.

E talvez não morar com seu parceiro romântico prove ser a melhor solução. "Agora que a cidade enfim está se reabrindo, a sensação é de que há muita vida a viver. Eu fiquei preocupado com a possibilidade de que morar com um namorado me privasse dessa nova liberdade", disse Yeung. "Acho que a situação que existia é que nos levou a assumir um compromisso sério tão rápido".

Tradução de Paulo Migliacci

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