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Veja quando vale a pena pegar o empréstimo consignado do Auxílio Brasil

Especialistas só recomendam pegar o crédito para casos extremos

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São Paulo

Mais de 20 milhões de cidadãos que recebem o Auxílio Brasil do governo federal poderão, a partir de setembro, contratar o crédito consignado atrelado ao benefício. O limite de comprometimento da renda é de até 40%: 35% com o empréstimo pessoal consignado e 5% com o cartão de crédito consignado.

O crédito tem sido alvo de críticas pela possibilidade de levar a população mais vulnerável ao endividamento, mas há ao menos duas situações em que o empréstimo pode ajudar: para empreender e para pagar parcelas da casa própria, caso haja alto risco de perder o bem. Para os especialistas consultados, só é indicado trocar uma dívida pelo consignado do auxílio se isso estiver comprometendo a subsistência. Há outras formas de tentar negociar com bancos e financeiras sem precisar do consignado, que diminuirá a renda por anos, afirmam os consultores ouvidos pela reportagem.

O Auxílio Brasil é pago a famílias em situação de extrema pobreza (com renda de até R$ 105 por pessoa da família) e pobreza (R$ 105,01 e R$ 210 por pessoa da família), no valor de R$ 400 por mês. O governo pagará R$ 600 de agosto até dezembro, medida aprovada em ano em que o presidente Jair Bolsonaro (PL) tenta a reeleição.

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Beneficiários do Auxílio Brasil poderão pegar crédito consignado a partir de setembro - Gabriel Cabral/Folhapress

Os juros do consignado do Auxílio Brasil serão definidos pela instituição que estiver apta a oferecer o crédito. Por enquanto, nenhuma delas informou quanto cobrará, mas já há casos em que a taxa chega a 79% ao ano, conforme pré-cadastro feito por beneficiários.

O governo ainda não detalhou se haverá uma taxa máxima que as instituições financeiras poderão oferecer nesse tipo de crédito, regra que é aplicada hoje no consignado de aposentados e pensionistas do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Ainda falta sair uma regulamentação sobre o crédito.

O Ministério da Cidadania informou que "taxas de juros, prazos de pagamento, número de parcelas e carência serão definidos pelas instituições financeiras cadastradas para realizar a operação".

Regulamentação futura do governo pode mudar as regras, mas a reportagem apurou que a intenção é manter em aberto as normas para sejam definidas conforme a concorrência entre as instituições.

Antes de pegar o crédito será preciso comparar os juros do consignado oferecido pela instituição e as taxas de outras modalidades, como o empréstimo pessoal.

O segundo ponto a ser considerado é pessoal e deve estar ligado às possibilidades futuras de pagar a dívida, já que o auxílio não é permanente e pode ser cortado.

A pedido da Folha, a educadora financeira Cíntia Senna, da Dsop, fez simulações de empréstimos que comparam as parcelas e a dívida do consignado com outras modalidades de crédito, como cheque especial, cartão de crédito e CDC (Crédito Direto ao Consumidor).

As simulações consideram valores emprestados de R$ 600 a R$ 3.000, a serem pagos em 24 parcelas (dois anos). Para o consignado, o juro utilizado na simulação é estimado em 5% ao mês.

No caso do cheque especial, os juros são de 8%. Nesta modalidade, há duas opções: sem pagar parcelas mensais e pagando um valor por mês para não se endividar ainda mais. Os juros do cartão de crédito são de 9,48% ao mês e, no CDC, os juros médios utilizados nas simulações são de 4,29%.

Confira as simulações, em R$

Prós e contras do empréstimo

Ricardo Teixeira, coordenador do MBA de gestão financeira da FGV (Fundação Getulio Vargas), afirma que, do ponto de vista financeiro, o consignado é um empréstimo que vale a pena por ter juros mais baixos. No entanto, do ponto de vista social, levando em conta a vulnerabilidade dos beneficiários do Auxílio Brasil, não compensa.

"Para que a pessoa tome a decisão [sobre emprestar ou não], a minha orientação é: use o Auxílio Brasil sem pagar juros. Esse dinheiro está sendo liberado para que você possa sobreviver e, sobrevivendo, você poder procurar alguma forma de produzir renda", diz.

O especialista afirma que, se já estiver endividado, o cidadão deve tentar negociar a dívida de outra forma, sem pegar o consignado do Auxílio Brasil para tentar quitá-la.

A educadora Cíntia Senna concorda com Teixeira. O beneficiário com dívidas deve tentar outras alternativas antes de pensar em fazer um empréstimo consignado que tem como garantia o benefício que recebe.

Segundo ela, é preciso pensar que passará muito tempo ganhando um valor bem menor. "Eu não recomendaria num primeiro momento esse tipo de empréstimo, mesmo quando a gente olha a taxa de juros, porque o principal aspecto do consignado é que ele já come a renda na fonte."

O defensor público Luiz Fernando Baby Miranda, coordenador auxiliar do núcleo de defesa do consumidor da Defensoria Pública de SP, diz que há uma preocupação com fraudes envolvendo esse consignado, o que pode prejudicar ainda mais as famílias vulneráveis.

A Defensoria Pública integra um grupo de instituições que assinaram manifesto pedindo o adiamento do consignado do Auxílio Brasil. "Em regra, os juros são menores, mas uma questão anterior é a capacidade de tomada de crédito de uma pessoa que está em uma situação difícil como essa. Eu fico preocupado. Como esperar que ela viva com 60% do benefício?"

O manifesto deverá ser encaminhado ao Ministério da Cidadania. A intenção do grupo é ter acesso a estudos que comprovem benefícios do crédito consignado no Auxílio Brasil. Para Miranda, no entanto, a liberação de microcrédito para esse público poderia ser mais vantajosa. "Não somos contra crédito nem contra a bancarização, mas há outras formas de se trabalhar isso", diz.

Quando o consignado pode valer a pena?

Há três situações em que o consignado para os beneficiários do Auxílio Brasil pode ajudar, mesmo tratando-se de uma dívida a ser paga por um longo período de tempo.

1 - Para empreender

  • Os especialistas concordam que utilizar o empréstimo consignado para tentar empreender é o melhor destino ao dinheiro, mas acreditam que, primeiro, o cidadão deve pensar em garantir sua sobrevivência antes de se endividar.
  • Para Miranda, da Defensoria de SP, uma ferramenta que poderia ser destinada a esse público é um microcrédito. "Entendemos que elas precisam muito de recursos", diz.

2 - Para não perder a casa própria

  • Segundo Cíntia, da Dsop, a negociação das parcelas da casa própria quando há um risco iminente de perda do bem pode ser feita com consignado, mas ela indica tentar outras alternativas. A especialista diz que há a possibilidade de pedir uma pausa no financiamento, por exemplo.
  • Para ela, é possível ainda tentar colocar o imóvel à venda para quitar o empréstimo imobiliário, não perder o bem e ter dinheiro para ajustar a vida da família. "É preciso buscar alternativas que tenham a educação financeira como base", afirma.

O que dizem os bancos

Os maiores bancos do país estão divididos entre oferecer ou não o consignado.

Em nota, o Itaú disse que "não oferece o consignado para os beneficiários do Auxílio Brasil, e não tem perspectiva de vir a oferecer".

O Santander também afirmou que não oferece. Já o Bradesco informou que, a princípio, "não vai oferecer a linha de crédito consignado para beneficiários do Auxílio Brasil".

O Banco do Brasil disse que "avalia condições técnicas e negociais com base na regulamentação definida pelo governo federal" e a Caixa afirmou que irá oferecer o consignado. "A Caixa informa que as condições do crédito consignado do Auxílio Brasil serão divulgadas e oferecidas após a publicação de portaria do Ministério da Cidadania, com as normas complementares sobre a operação", diz nota do banco.

O Banco Pan irá oferecer o crédito, mas informa que aguarda "efetiva regulamentação da linha por parte das autoridades competentes".

O Banco Daycoval, que opera com crédito consignado há quase 20 anos, disse que estuda operar o consignado do Auxílio Brasil "seguindo as regras de mercado". "O Banco Daycoval aguarda a liberação do órgão competente para ver a demanda dos clientes e estruturar suas operações", afirmou, em nota.

O Banco Central informou que irá monitorar as operações "de forma agregada no conjunto das demais operações de crédito consignado" e diz que tem plataformas de educação financeira para a população em geral, incluindo os mais vulneráveis.

Cidadania não detalha instituições participantes

O ministro da Cidadania, Ronaldo Bent, disse, na última semana, que há 17 instituições homologadas e aptas para conceder o empréstimo. Procurado, o Ministério da Cidadania não informou quais são as instituições.

Segundo o órgão, benefícios complementares ou temporários não entram no cálculo para definir o valor do empréstimo.

Entenda o empréstimo

O crédito consignado é um benefício que tem desconto direto na folha de pagamento, com isso, o risco de calote para os bancos e instituições financeiras que emprestam é praticamente zero, o que faz os juros serem menores do que as demais modalidades. No caso do consignado do INSS, há controle de juros e número de parcelas.

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