Operadoras de telecom entram no mercado de energia solar para competir com elétricas

Modelo oferecido pelas empresas vincula cliente a uma usina remota, classificada como geração distribuída compartilhada

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Letícia Fucuchima
São Paulo | Reuters

A popularização da energia solar no Brasil atraiu a atenção de grandes operadoras de telecom, que estão com projetos-pilotos ou se preparando para ofertar o serviço por assinatura a parte de seus clientes, no que promete ser o início de um movimento importante de concorrência com as companhias elétricas.

Claro e Oi foram as primeiras a tatear o mercado, colocando na rua iniciativas para oferecer energia solar por assinatura a pessoas físicas, um serviço contratado online, de forma simples e dispensando instalações, que se traduz em uma redução na conta de luz mensal.

A "assinatura solar" oferecida pelas operadoras não envolve instalação de painéis solares ou adaptações no próprio local de consumo de energia. Ao contratar o serviço, os clientes são vinculados a uma usina solar remota --geralmente construída e operada por um terceiro--, classificada como "geração distribuída compartilhada".

Painéis fotovoltaicos no Reino Unido - Ben Stansall/AFP

A energia gerada por esse empreendimento é injetada na rede elétrica e revertida em "créditos" que serão abatidos do valor final que os consumidores pagam pela energia elétrica, um bom negócio para empresas e clientes.

"A companhia tem olhado para esse mercado com atenção e, baseado nos nossos resultados, não descarta a possibilidade de ampliar para outras regiões", disse Hamilton Silva, diretor de Infraestrutura da Claro, a primeira a ofertar o serviço, em julho do ano passado.

Oferecendo energia renovável para clientes de telecom pessoa física nos Estados de Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina, a "Claro Energia" promete 10% de economia em relação à tarifa de energia do mercado regulado.

Silva não comenta números sobre o projeto, mas afirma que a receptividade do mercado tem sido "muito boa".

À Reuters, as operadoras de telecom disseram enxergar a energia solar, que cresce a taxas de dois dígitos no Brasil, como um serviço atrativo e que pode agregar a seus negócios, compondo uma oferta mais completa de produtos a seus clientes.

A avaliação é que as operadoras contam com importantes diferenciais competitivos para "capturar" o cliente pessoa física, como a possibilidade de ofertar bônus e descontos em serviços de telecom.

O consumidor recebe um boleto da operadora referente à sua assinatura solar e outro da distribuidora de energia, no qual deverá pagar outros itens da conta de luz, como taxas e impostos.

A Oi ingressou nesse mercado em Minas Gerais, mas já projeta expansão.

"Começamos oferecendo para colaboradores e expandimos para clientes da Oi em baixa tensão. Pretendemos ampliar para diversas praças do Brasil à medida que a gente feche novos contratos de capacidade de geração", explicou Bernardo Estefan, gerente de Novos Negócios da Oi.

Por se tratar de um negócio novo e ainda incipiente, as empresas não abrem detalhes sobre quantidade de clientes, capacidade instalada solar para atendê-los e faturamento.

A TIM, por sua vez, está se preparando para estrear no segmento neste ano.

Telefônica Brasil e Algar Telecom também estão estudando como se posicionar, tendo por enquanto lançado soluções de energia solar voltadas a clientes corporativos.

NOVA ROTA

Diferentemente da Claro e Oi, a TIM não vai usar a marca própria para ofertar energia solar --em vez disso, vai se juntar a uma empresa parceira para construir uma marca nova.

A parceira, ainda a ser escolhida, terá acesso à base de clientes da TIM e, em troca, a operadora receberá uma participação acionária e parte das receitas geradas com o produto.

Essa é a mesma estratégia usada pela TIM para avançar em outros serviços considerados "úteis" a seus clientes: no setor financeiro, por exemplo, a operadora se juntou ao C6, que virou o "banco oficial da TIM".

"Convidamos diversas empresas a nos apresentarem proposta de parceria... Devemos ter o resultado desse processo ao longo do primeiro trimestre deste ano", disse Renato Ciuchini, vice-presidente de Novos Negócios e Inovação da TIM.

Outras operadoras também miram esse mercado. À Reuters, a Vivo disse já oferecer em parceria com a SouVagalume (subsidiária da Comerc) um produto pelo qual empresas podem obter créditos com compartilhamento de energia solar, e que "avalia constantemente novas oportunidades no mercado".

Já a Algar Telecom disse que desenvolve, com a (re)energisa, do grupo Energisa, uma solução que fornecerá energia fotovoltaica para os clientes de micro e pequenas empresas em Minas Gerais.

VANTAGENS E DESAFIOS

As "telcos" avaliam ter importantes diferenciais competitivos na energia solar por assinatura. Um deles é a possibilidade de ofertar descontos e recompensas em outros produtos, como dados de internet e telefonia, para atrair os consumidores para essa nova contratação.

Outro é a experiência em trabalhar a recorrência dos clientes, isto é, garantir a fidelidade de milhões de clientes --o que hoje não é um forte das elétricas, especialmente as que operam no mercado regulado de energia.

"É uma tese que faz muito sentido para empresas que tenham alavancas varejistas... Temos a competência de trabalhar a recorrência do cliente, já emitimos fatura, já temos o 'billing', o atendimento, falamos com o cliente com muita regularidade e frequência", destacou Estefan, da Oi.

Ele avaliou ainda que ter uma marca forte e consolidada no mercado faz diferença, uma vez que se trata de um serviço novo e desconhecido. "O cliente acaba tendo menos receio em contratar."

Há, porém, desafios para que as empresas consigam escalar o negócio e oferecê-lo de forma massiva a todos seus clientes, sendo um deles garantir a capacidade disponível de energia.

Devido a especificidades técnicas do mercado solar, as usinas geradoras precisam ser construídas em locais próximos aos consumidores. Diante disso, as operadoras e suas parceiras precisam mapear bem os mercados com maior potencial de adesão aos serviços, para não correr o risco de ter muita capacidade de geração para pouco cliente, ou vice-versa.

"A capacidade de geração não vai estar totalmente disponível no primeiro dia, é diferente de um banco digital, de um serviço de telemedicina, que operam centralizados", observa Ciuchini, da TIM.

MERCADO DAS ELÉTRICAS

A entrada das operadoras de telecom torna ainda mais competitivo o segmento de energia solar, já bastante pulverizado, e complica o cenário para as companhias elétricas, especialmente para as distribuidoras, que vêm "perdendo" consumidores para o mercado livre de energia e para a geração distribuída solar.

No futuro, com a abertura total do mercado de energia, todos os consumidores do país terão liberdade para escolher seu fornecedor, assim como ocorre hoje com telecom --o que vai exigir das elétricas uma importante mudança em suas estratégias comerciais.

Atualmente, os principais players de "energia solar por assinatura" são empresas menores, como Sun Mobi e Órigo, que concentram seus negócios nesse nicho. Uma exceção é a Cemig, que criou uma subsidiária exclusiva para a geração distribuída, a Cemig SIM, já tem quase 90 megawatts-pico (MWp) em usinas para fornecer energia solar a clientes da baixa tensão em Minas Gerais.

O uso da base de clientes das empresas de telecom é uma facilidade para captar novos consumidores que as novatas não têm. Essas precisam contar com agentes autônomos de vendas do serviço, como é o caso da comercializadora CMU, que atua em Minas Gerais.

"São de 10 mil a 12 mil (agentes)... que não vendem somente energia, vendem plano de saúde, gás... Foi assim que conseguimos chegar nesse público, queremos ter escala", disse Walter Fróes, presidente da CMU, afirmando que a meta para 2023 é chegar a 300 mil clientes, mais que o dobro da base atual.

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