Descrição de chapéu Folhainvest inflação

Com expectativa de corte dos juros, investidores veem virada em ações do varejo

Perfil do público, estratégias para aumentar o consumo e enxugamento de custos vão ditar a performance das companhias do setor no ano, segundo especialistas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Com a perspectiva de que o Banco Central inicie o ciclo de baixa da Selic a partir de agosto, investidores já começaram a sinalizar que enxergam uma melhora do varejo. Desde o início de maio até o pregão de quinta (18), das 20 ações que mais subiram entre as que compõem o Ibovespa, 7 são de varejistas, segundo levantamento do TradeMap.

É um ponto de virada, porque no acumulado deste ano apenas o Magazine Luiza e a Petz representavam as varejistas entre as maiores altas da Bolsa brasileira. A ação do Magalu, aliás, está em sexto lugar do ranking, com valorização de quase 30% desde o início do ano.

O otimismo relativo dos investidores coincide com as previsões de analistas ouvidos pela Folha e apontam para um cenário diferente do revelado pelas demonstrações financeiras das companhias no começo deste ano.

Imagem em movimento de uma mulher com a caixa de um produto na mão, em uma loja física da Magazine Luiza.
Consumidor em liquidação da Magazine Luiza na marginal tietê, em SP - Adriano Vizoni - 6.jan.2023/Folhapress

A despeito das particularidades de cada segmento, as varejistas no geral têm sido afetadas pelo patamar elevado da taxa básica de juros, mostram os balanços do primeiro trimestre deste ano já divulgados pelas companhias do setor.

As despesas financeiras, pressionadas pelos juros altos, prejudicaram a lucratividade até mesmo das que obtiveram resultados operacionais robustos, com forte crescimento de receita, e aquelas que são mais resilientes à inflação alta —como as varejistas que atendem perfis de públicos com poder de consumo maior.

Um exemplo é a Arezzo, que registrou recorde de faturamento de janeiro a março deste ano, com R$ 1,3 bilhão de receita bruta, alta de 23,4% ante o mesmo período do ano anterior.

A margem líquida, contudo, que mede a relação do lucro líquido e das receitas da empresa, teve um avanço tímido, de 0,2 ponto percentual, impactada pelo aumento de despesas financeiras. A Arezzo observou uma elevação de 273% do seu endividamento do ano passado para este ano.

O grupo Soma, dono das marcas Hering, Farm e Animale, também registrou recorde de faturamento no primeiro trimestre, com receita bruta, ou seja, valor total de entrada de dinheiro com vendas, de R$ 1,4 bilhão. Mas a companhia viu sua margem líquida recuar 0,4 ponto percentual na comparação com janeiro a março de 2022, em linha com a piora em seu resultado financeiro.

O analista de investimentos Bruno Mazzoni enxerga um cenário melhor para esse impacto financeiro no segundo semestre. "O lucro operacional talvez não melhore muito a curto prazo, porque do segundo trimestre para o terceiro sazonalmente é ruim, não tem nenhuma data muito importante. Mas o resultado financeiro, sim, deve melhorar", diz ele.

Danniela Eiger, que encabeça o time de analistas de varejo da XP Investimentos, endossa a ideia de que as empresas do segmento ainda devem enfrentar um ambiente de consumo mais fraco no segundo trimestre. "Nas teleconferências de resultados das companhias isso tem aparecido", diz.

A queda de juros é o que deve dar um alívio a partir do segundo semestre porque, além de contribuir positivamente para a dívida das varejistas, também deve ajudar pelo lado dos clientes que estão inadimplentes.

A Renner, por exemplo, reportou alta de 6,2 pontos percentuais no volume de vencidos em sua carteira total de crédito do primeiro trimestre de 2022 para o mesmo período deste ano, devido ao cenário da inadimplência alta.

Outro fator que deve afetar positivamente a situação financeira das varejistas, segundo Mazzoni, é o programa de renegociação de dívidas do governo federal, o Desenrola.

EXPANSÕES E FECHAMENTOS DE LOJAS

Analista do setor de varejo da Genial Investimentos, Vinícius Esteves observa que as companhias que nos últimos dois anos aproveitaram juros mais baixos para fazer expansões acabaram registrando uma alta em suas despesas, tanto operacionais quanto financeiras, devido às aquisições. É o caso de Assaí e Pague Menos.

"Mesmo o segmento de alimentos e remédios sendo mais resilientes à baixa do consumo, o desempenho dessas companhias não foi o suficiente para compensar as despesas advindas dessas aquisições", diz Esteves.

No lado oposto, as empresas que iniciaram processo de fechamento de lojas nos últimos meses —como a Camicado, subsidiária da Renner—, tiveram baixa na receita, e a contenção de custos com esses fechamentos ainda não apareceu em seus balanços. Uma melhora nas despesas dessas companhias, portanto, deve vir nos próximos trimestres.

A diminuição da expansão e investimentos dessas empresas, portanto, deve ser crucial para uma melhora dos balanços das varejistas, segundo o também analista de varejo da Genial Iago Souza.

Outro ponto que está no foco das companhias do setor é a otimização do giro de estoque, para que as mercadorias fiquem o mínimo possível de tempo paradas.

EFEITO AMERICANAS

Os analistas ressaltam que as empresas que estão muito alavancadas, ou seja, com uma relação dívida líquida por lucro operacional acima de três vezes, enfrentarão uma situação mais complicada no próximo trimestre.

Essas varejistas terão que buscar captação de dinheiro no mercado, como emitir debêntures ou buscar empréstimo bancário, em um cenário de dificuldade para conseguir crédito depois da crise na Americanas e de juros ainda altos.

Poucas empresas também estão dispostas a abocanhar a lacuna deixada pela Americanas no mercado de lojas de conveniência, após o escândalo envolvendo a varejista. "Ninguém quer o mercado da Americanas", diz Esteves.

O analista explica que a relação entre o custo de capital e a rentabilidade do segmento de lojas de conveniência não encoraja as varejistas a entrarem nesse segmento.

"Esse é um mercado altamente promocional, ligado a cupons de desconto, a algumas metodologias específicas. Quando a gente coloca tudo isso na conta, percebe um alto custo de capital, de quase 14% ao ano", diz Esteves. "As empresas não vão querer colocar seus recursos em um ambiente que provavelmente não vai trazer um retorno atrativo", completa.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.