Equador fecha acordo histórico para proteger Galápagos e economizar dinheiro

País prevê economizar mais de US$ 1 bilhão em pagamentos futuros de juros

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Catrin Einhorn
The New York Times

O Equador anunciou um acordo recorde na terça-feira (9) destinado a reduzir sua dívida e liberar centenas de milhões de dólares para financiar a conservação marinha nas Ilhas Galápagos, um arquipélago de biodiversidade única que é famoso por ter inspirado a teoria da evolução de Darwin.

A negociação, conhecida como acordo "dívida por natureza", é um pouco como o refinanciamento de uma hipoteca, mas com títulos do governo.

Gustavo Manrique Miranda, ministro das Relações Exteriores do Equador, chamou-o de um acordo histórico, que leva em consideração o valor da natureza. Ele disse que o Equador é tão rico quanto qualquer dos países mais ricos do mundo, "mas nossa moeda é a biodiversidade".

Quando os países precisam de dinheiro, geralmente vendem títulos, que pagam ao longo do tempo com juros. Porém, o Equador está lutando com dívidas e turbulência política.

Vista da Ilha Bartolomé, parte das Ilhas Galápagos, no Equador - Carlos Espinosa-15.abr.23/AFP

Seus títulos perderam tanto valor no mercado que alguns investidores, presumivelmente temendo perdas maiores, se dispuseram a vender US$ 1,6 bilhão (cerca de R$ 7,9 bi) para o banco Credit Suisse a uma média de US$ 0,40 (R$ 1,98) por dólar.

O banco então os converteu em um título marítimo de Galápagos de US$ 656 milhões (cerca de R$ 3,249 bi), que usou para financiar um empréstimo que ajudará o Equador a promover a conservação. Isso torna o acordo a maior troca de dívida por natureza da história.

Os investidores do banco ficam "muito entusiasmados" com as oportunidades que geram um impacto positivo na natureza e na sociedade, disse Ramzi Issa, que administrou a transação no Credit Suisse.

A reestruturação significa que o Equador economizará mais de US$ 1 bilhão (cerca de R$ 4,9 bi) em pagamentos futuros de juros e principal. Os antigos detentores de títulos, por sua vez, evitam o risco de perdas maiores.

O banco de desenvolvimento do governo dos Estados Unidos forneceu o seguro contra riscos políticos.

A mudança climática não é a única calamidade ambiental. Os cientistas estimam que 1 milhão de plantas e animais estão em risco de extinção à medida que os humanos aram e pavimentam a terra, pescam demais nos mares e superaquecem o planeta.

À medida que os ecossistemas se decompõem, o mesmo acontece com a capacidade da natureza de fornecer água e alimentos, dos quais dependem os seres humanos e o resto da vida na Terra.

Em dezembro, países concordaram em tomar medidas para impedir a perda de biodiversidade. Mas essa ação requer dinheiro. Os países mais biodiversificados do mundo tendem a estar no Sul global, ainda sofrendo com os legados do colonialismo e frequentemente se recuperando de dívidas.

"Países com dívidas pesadas ou em risco de inadimplência não têm meios de priorizar a proteção ambiental e podem ser pouco atraentes para os investidores devido às baixas classificações de crédito", disse Alice Hughes, professora de biologia da conservação na Universidade de Hong Kong, que estudou acordos de dívida por natureza. Essas trocas "fornecem os meios para superar esses problemas".

O acordo de dezembro exige que os países protejam 30% da terra e da água do mundo até 2030. Para os oceanos, isso significa não apenas criar áreas marinhas protegidas, mas também gerenciá-las, monitorá-las e policiá-las. Apesar de ter certas proteções há anos, as Galápagos correm o risco de pesca ilegal, mudança climática e turismo insustentável.

Como parte do acordo de dívida por natureza, o Equador se comprometeu a gastar mais de US$ 323 milhões (R$ 1 bilhão) em cerca de 18 anos na conservação da região de Galápagos, principalmente para gerenciar e monitorar a Reserva Marinha Hermandad, uma nova área protegida anunciada pelo governo em 2021. O dinheiro da transação também ajudará a criar uma dotação para financiar tais atividades em caráter permanente.

"O sucesso depende de garantir os recursos financeiros necessários para alcançar a proteção efetiva dos oceanos", disse Giuseppe Di Carlo, diretor do Projeto do Legado Oceânico Pew Bertarelli, que ajudou a organizar o acordo das Galápagos. "Acreditamos que o setor financeiro pode desempenhar um papel muito importante."

O acordo ocorreu num momento turbulento para o Equador e o Credit Suisse.

O Congresso do Equador se prepara para uma votação sobre o impeachment do presidente Guillermo Lasso, por acusações de corrupção. O Credit Suisse está no meio de uma aquisição por seu antigo rival, UBS.

A capacidade de fechar o negócio nesse cenário é uma evidência de que as trocas de dívida por natureza são cada vez mais reconhecidas como vitórias gerais que sobreviverão a mudanças de liderança, de acordo com Oscar Soria, que se dedica a biodiversidade e política climática no grupo de defesa Avaaz.

Soria, que não participou da transação, chamou-a de "muito promissora" e observou que outras estão em andamento.

As trocas de dívida por natureza existem desde a década de 1980, mas parecem ter um novo impulso. Recentemente, esses acordos criaram áreas marinhas protegidas ou financiaram outras medidas de conservação nas águas de Belize, Barbados e Seychelles.

Mas esses acordos têm desvantagens, disse Patrick Bigger, analista de políticas de pesquisa da Universidade da Califórnia em Berkeley e diretor de pesquisa do grupo de pesquisas Climate and Community Project.

Por exemplo, apesar de seu escopo recorde, o alívio da dívida na transação de Galápagos representa uma pequena fração da dívida do Equador, que é de mais de US$ 60 bilhões (R$ 297,2 bilhões), disse Bigger.

Além disso, "os juros ainda estão fluindo dos países mais pobres, que sofrem os piores impactos da mudança climática, para a qual contribuíram relativamente pouco, para os países ricos e os bancos, que carregam a maior parte da responsabilidade pela crise ecológica".

Tradução de Luiz Roberto Gonçalves

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