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Lobby de sindicatos mudou regra de trabalho em feriados, e Congresso quer derrubar medida

Parlamentares se articulam contra portaria do governo federal; Ministério do Trabalho diz que corrige 'ilegalidade'

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São Paulo

A portaria do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que altera o trabalho em feriados no comércio foi editada a pedido de sindicalistas. A medida levou a reações de parlamentares, que querem derrubá-la no Congresso Nacional.

De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego, o texto publicado na quarta-feira (14), véspera do feriado de Proclamação da República, corrige uma "ilegalidade" de portaria editada no governo Jair Bolsonaro (PL).

Segundo a nova regra da portaria 3.665, o trabalho nos feriados só poderá ocorrer se estiver previsto em acordo ou convenção coletiva —o que beneficia sindicatos, base do governo Lula— ou se for liberado em legislação municipal, conforme determina lei de 2000.

Antes, o trabalho poderia ser realizado por imposição do empregador, sem negociação.

Novas regras de trabalho aos feriados afeta comércio, em especial supermercados e hipermercados - Rubens Cavallari - 24.abr.22/Folhapress

Em nota, a pasta afirma que a alteração do governo atual na portaria 671, de 2021, faz com que lei específica sobre o tema seja a única válida neste caso.

"A portaria 3.665/2023 tem como objetivo adequar a portaria 671/2021 ao texto da lei 10.101/2000. Isto porque os itens da portaria 671 sobre trabalho aos feriados são ilegais", afirma o ministério.

"Uma portaria não se sobrepõe a uma lei e —por esta razão— o ministério revogou este artigo", diz a pasta comandada por Luiz Marinho, ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e ex-presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores), sobre artigo que liberava de forma irrestrita o trabalho no comércio.

À Folha a assessoria de Marinho afirma que a mudança na norma foi feita para atender a um pleito de sindicatos de comerciários.

Ricardo Patah, presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores) e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, entidade com 500 mil comerciários, confirma que a central esteve com o ministro para tratar do tema, assim como de outros assuntos ligados aos trabalhadores.

UGT é a central com sindicatos ligados à área comercial, que abrange hoje cerca de 10 milhões de trabalhadores no país. Segundo Patah, as tentativas de negociação entre sindicatos patronais e de empregados para compensação do trabalho em feriados seguiam sem sucesso.

Os encontros de sindicalistas com o governo fazem parte do movimento de autorregulação dos sindicatos de empregados e patronais. O tema, assim como diversos outros, têm sido levados a reuniões entre as partes, mas sem sucesso.

"Os sindicatos da área do comércio são retrógrados, são os mais difíceis em termos de negociação coletiva", afirma Patah.

O sindicalista diz ainda que há um movimento por parte dos sindicatos de trabalhadores para que o MTE module a portaria e as novas regras passem a valer apenas a partir de 2024, já que os feriados de 2023 já estão definidos.

"A gente pode dar uma demonstração de grandeza e fazer com que a portaria passe a valer somente no ano que vem. A portaria reestabelece o diálogo e traz equilíbrio", diz.

"A UGT não vai criar problema para uma situação que pode beneficiar trabalhadores, que querem trabalhar, o comércio, que quer vender, e os consumidores, que querem comprar", afirma Patah.

Luiz Marinho tem afirmado em encontros com sindicalistas e empresários que irá "arbitrar para o lado do trabalhador", utilizando as ferramentas legais que couber ao ministério, quando não houver acordo entre empresa e empregado.

A mudança na portaria de 2021 desagradou o setor de comércio, especialmente no ramo alimentício, o principal afetado, e já há um projeto de decreto legislativo para derrubar a portaria.

O projeto 4.040, de autoria dos senadores Efraim Filho (União-PB) e Alan Rick (União-AC), tem como objetivo trazer de novo a possibilidade de que o trabalho em feriados em supermercados, hipermercados e demais comércios varejistas de alimentos seja realizado sem negociação coletiva, apenas por determinação da empresa.

Na justificativa, o senador diz que o texto editado pelo MTE significa um retrocesso à atividade econômica e "empodera" os sindicatos, afetando trabalhadores.

Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição no Senado e ex-secretário de Previdência e Trabalho da gestão Bolsonaro, quer convocar o ministro Marinho para audiência na Casa. A ideia é cobrar esclarecimentos.

Em requerimento, que ainda precisa ser aprovado, Rogério Marinho afirma que "o governo retirou arbitrariamente a concessão, em caráter permanente, que autorizava o trabalho aos domingos e feriados em 12 atividades comerciais", e cita uma lista delas. Ele diz ainda que não houve negociação patronal.

Em nota, a FecomercioSP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo) diz ver com preocupação os efeitos da medida, por ferir a Lei de Liberdade Econômica, também editada no governo Bolsonaro, além de "aumentar a burocracia" nas relações de trabalho.

"A federação espera que, nos próximos dias, a norma seja modulada e que seus efeitos possam garantir segurança às categorias envolvidas, bem como às entidades representativas enquadradas nesses planos de atividade, além do mercado consumidor", diz.

A CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) afirma que a nova regra desconsidera que certas atividades do comércio são essenciais e de interesse público.

Por haver regra específica na lei de 2020, sobre o trabalho no comércio, a confederação considera "que a portaria contribui para gerar um clima de insegurança jurídica".

A Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) diz que a portaria 3.665 causa preocupação ao revogar a "possibilidade de negociação direta, via contrato, entre as partes".

"Instituir a necessidade de convenção coletiva fere a autonomia dos trabalhadores e cria um passo adicional desnecessário em um país já extremamente complexo", diz a entidade.

O principal argumento de todo o setor patronal, no entanto, é sobre a dificuldade na geração de empregos.

Centrais sindicais rebatem, afirmando que não houve geração de empregos desde que a portaria 671 foi editada, mas houve abusos por parte de algumas empregas. Dizem ainda que os abusos serão coibidos e a negociação será privilegiada.

Para Patah, o argumento de que a portaria atual não é válida não poderá ser usado pela oposição, já que aceitaram a portaria de 2021 sem contestar.

Sindicalistas ouvidos pela Folha afirmam que a portaria não proíbe o trabalho, apenas prestigia a negociação entre as partes, e que o entendimento é de pode ser feito acordo coletivo e não apenas convenção, respeitando o que diz a nova CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), de que o negociado prevalece sobre o legislado.

Na nota, o Ministério do Trabalho fala ainda em "justeza da promoção da negociação coletiva" e explica que, como a portaria não pode alterar o que a lei estabelece, "foi necessária uma adequação ao texto legal sobre os feriados, não mudando nada em relação aos domingos".

As atividades comerciais deverão observar agora o que diz a lei de 2020. Quem não cumpre as regras pode ser multado.

COMO É O TRABALHO nos feriados

Os profissionais que precisam trabalhar nos feriados podem receber hora extra em dobro caso não haja folga compensatória. A legislação brasileira proíbe o trabalho em feriados nacionais, mas há exceções, conforme as categorias e o tipo de atividade exercida, se é essencial ou não.

Dentre os setores considerados essenciais estão saúde, indústria, comércio, transporte, energia e funerário, entre outros.

Trabalhar e receber por esse dia é um direito, segundo especialistas.

Com William Castanho

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