Itaipu acata sentença e deposita salários no Brasil; Paraguai inicia pagamento sem aval do sócio e recua

Diretoria brasileira afirma que tratado prevê a cada lado o direito de seguir a lei de seu país em caso de impasse na Justiça

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São Paulo

A margem brasileira de Itaipu Binacional efetuou o pagamento dos empregados nesta quinta-feira (25). Foram depositados vales-refeição e alimentação, salários, adiantamento do 13º e férias em atraso.

Segundo a Folha apurou, os pagamentos foram iniciados do lado brasileiro no final da manhã, sem aval do Paraguai, para cumprir a decisão da Justiça do Trabalho no Brasil.

Na sequência, os sindicatos do outro lado da fronteira enviaram nota à diretoria Paraguai pedindo a equiparação da medida.

Usina Hidrelética Itaipu Binacional
Vista da usina Itaipu Binacional; direção do lado brasileiro faz pagamentos e é seguida pelos paraguaios - José Fernando Ogura - 29.out.23/ANP

Iniciou-se um mobilização na diretoria do país vizinho, que incluiu consulta ao presidente do Paraguai, Santiago Peña, para saber se poderiam pagar sem o aval do Brasil, pois trata-se de decisão delicada que pode levar o sócio a descumprir o acordo bilateral que rege as relações dos parceiros.

Segundo pessoas que acompanham a discussão no Paraguai, a diretoria de Itaipu no país vizinho conseguiu um parecer jurídico para justificar o direito de equiparação com o Brasil e iniciou as operações internas para fazer os depósitos em benefício dos trabalhadores do seu lado da fronteira.

Quando os procedimentos estavam prontos para iniciar os pagamentos, veio uma contra-ordem para não realizar os depósitos. A diretoria da margem paraguaia estornou todos os lançamentos, e a tesouraria não fez as transferências para os bancos.

A interpretação de quem acompanha a empresa é que a movimentação desta quinta abriu um precedente perigoso na boa convivência dos sócios, pois ambos se mobilizaram para tomar decisões unilaterais, quebrando o princípio do diálogo bilateral.

No caso do Brasil, no entanto, o pagamento dos trabalhadores está embasado pelo tratado binacional, segundo a empresa.

Em nota, a diretoria brasileira afirmou que cumpriu integralmente a determinação judicial proferida pela juíza titular da 2ª Vara do Trabalho de Foz do Iguaçu, Tatiane Raquel Bastos Buquera, seguindo um dispositivo do tratado que prevê o cumprimento de decisões judiciais dentro das leis de cada país.

"A decisão judicial foi tomada com base no princípio da legalidade, que é essencial em um estado democrático de direito, e nas disposições do Tratado de Itaipu e seu Protocolo Sobre Relações de Trabalho e Previdência Social - Decreto nº. 74.431/74, que estabelece a aplicação da lei do local de celebração do contrato individual de trabalho e a competência dos juízes e tribunais locais para julgar tais ações", destacou Itaipu, em nota.

A empresa disse ainda que a decisão judicial atendeu ao pleito do Sinefi (Sindicato dos Empregados da Itaipu) que ingressou na Justiça segunda-feira (22) para garantir o pagamento.

A liberação de recursos em Itaipu ficou represada por causa de é um impasse entre diretorias e conselhos de Brasil e Paraguai sobre o preço da energia elétrica para este ano. A tarifa de Itaipu é avaliada anualmente.

Se acordo sobre a tarifa, o Paraguai não quis validar o orçamento, travando todos os pagamentos, incluindo a empregados, fornecedores e prestadores de serviços.

A decisão da Justiça Trabalhista é pontual, e essa situação não foi alterada. Itaipu segue sem orçamento aprovado para quitar compromissos. Agora, há preocupação em relação ao pagamento dos royalties, que atendem prefeituras.

O ideal seria que os sócios, em comum acordo, chamassem uma reunião e aprovassem o orçamento de 2024 para destravar todos os pagamentos, avaliam pessoas que acompanham o impasse sobre o valor da tarifa.

Efetivamente, no entanto, quem conhece a história de Itaipu afirma que a tarifa da hidrelétrica binacional não é fruto de negociação. As bases para o seu cálculo estão definidas no acordo bilateral entre os sócios. Nos documentos, a tarifa tem o nome de Cuse (Custo Unitário dos Serviços de Eletricidade).

Os valores começaram a ser acertados entre as partes à medida que o custo da dívida para construção da usina caiu e aumentou a demanda por recursos para obras dos dois lados da fronteira, abrindo espaço para a criação do impasse que se vive hoje.

A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), por sugestão da parte brasileira de Itaipu, aprovou, em dezembro de 2023, em caráter provisório, a manutenção do valor do ano passado para este ano, de US$ 16 por kW.

Pessoas que conhecem a rotina na binacional dizem que a sinalização de manter o valor teria sido ruim na mesa de negociação, pois fixou o piso nesse patamar, abrindo brecha para o Paraguai pressionar por um preço mais elevado.

Executivos que acompanham a discussão dizem que existe um pleito do Paraguai para que a tarifa seja elevada para US$ 20 pelo kW ao mês neste ano.

O texto da decisão judicial desta quarta-feira (24) relata que, conforme afirmou Itaipu, o impasse sobre o valor da tarifa já ocorreu em anos anteriores, mas que isso não impediu o regular cumprimento das obrigações salariais. Foi possível adotar "procedimentos provisórios extraordinários", explicou a usina.

Neste ano, no entanto, nem sequer houve consenso para a adoção de tais procedimentos.

No final do governo Jair Bolsonaro (PL), por exemplo, foi fixado do lado do Brasil, unilateralmente, uma tarifa de US$ 12,67. O Paraguai na época também trabalhou para manter o valor de US$ 20,75, que havia sido efetivado por ambos os lados em 2022.

O governo Lula assumiu, e foi definido para 2023 o valor de US$ 16 por kW. Em nenhum momento o orçamento foi paralisado.

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