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Professores ajudam a resolver frustrações com o ambiente corporativo

Huggy Rao e Bob Sutton, da Universidade de Stanford, compartilham dicas para eliminar pontos de desgaste em empresas

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Andrew Hill
Los Angeles | Financial Times

Os professores Huggy Rao e Bob Sutton perceberam que estavam no caminho certo quando executivos em suas aulas de gestão e inovação na Universidade de Stanford começaram a oferecer descrições vívidas dos obstáculos que atrapalhavam seu trabalho.

"Eu trabalho em uma fábrica de frustração", disse um dos alunos matriculados em seu último curso. Outro, de uma empresa de tecnologia da Califórnia, foi mais direto. "Professor, estou nadando em um mar de merda. Mal consigo manter minha cabeça acima da água. E você quer que eu mostre iniciativa? Como isso é possível?"

Ilustração mostra close up de uma mão tentando passar uma corda por um buraco de agulha
Ilustração mostra em detalhe uma mão tentando passar uma corda por um buraco de agulha - Catarina Pignato

Uma vez que Sutton e Rao liberaram a exasperação dos funcionários envolvidos em burocracia, desgastados por regras e procedimentos mesquinhos, e impedidos por gerentes minuciosos e líderes indecisos, foi difícil detê-los.

Os funcionários falaram sobre "morte por reunião", "a torre do não", "chefes fanfarrões" e "liderança por palavras sem sentido".

A dupla, que junta dedicou mais de 70 anos ao ensino e estudo do comportamento organizacional, começou a compilar e categorizar as evidências dessa frustração.

Sete anos depois, eles destilaram tudo isso em um novo livro, "The Friction Project" (O projeto da fricção, ainda sem edição em português).

É um título surpreendentemente suave para um problema que provoca tanta irritação universal. Na verdade, por um tempo, eles queriam chamá-lo de "Os Consertadores de Merda", que era o nome de sua série de webinars sobre o assunto e seu termo inicial para pessoas que trabalham para eliminar a fricção negativa —ou ineficiências— nas empresas.

"A triste ironia era: convidamos [para o programa] essas pessoas que consertavam a fricção e elas vieram e disseram: 'adoraríamos ajudar vocês, mas podem mudar o nome de Consertadores de Merda para Consertadores?'", disse Rao em uma entrevista virtual ao lado de Sutton.

Os convidados disseram que adoraram o título, mas seu chefe-executivo não "gostaria que o mundo soubesse que nossa empresa está cheia de merda".

Os dois formam uma dupla alegre. Sutton também é autor dos best-sellers de autoajuda "A Regra do Babaca" e "O Guia de Sobrevivência do Babaca", que mostram como civilizar o local de trabalho e domar os idiotas que muitas vezes o dominam.

O último livro como coautores foi "Scaling Up Excellence" (algo como "dando escala à excelência", em português) de 2014, sobre como as empresas podem crescer sem se sobrecarregar com processos e hierarquia. Nele, eles celebraram histórias de sucesso do Vale do Silício, como Google, Facebook e Salesforce. Mas Sutton explica que quase uma década depois, "se você conversar com as pessoas de lá, está cada vez mais difícil fazer as coisas nessas organizações".

Essa sensação de frustração crescente os inspirou a buscar maneiras pelas quais os consertadores de fricção, como eles os chamam agora, poderiam reduzir as camadas de burocracia desnecessária e de servilismo que assolam muitas organizações.

Alguns dos exemplos que eles escolhem provocarão um aceno de reconhecimento: o representante de atendimento ao cliente de uma empresa de biotecnologia forçado a alternar entre "15 aplicativos e 20 janelas na tela de 13 polegadas de seu laptop da empresa" por causa de uma sobrecarga de novos softwares liberados pelos gerentes de TI; o CEO de saúde apelidado de dr. TLDR (sigla para "muito longo, não li") por seus memorandos prolixos e frequentes; ou o documento de "obtenção de uma licença" de 58 páginas, emitido pela Comissão de Planejamento de São Francisco, que adverte explicitamente os usuários de que estão prestes a entrar em "um dos processos mais confusos que você pode experimentar".

Uma das razões pelas quais eles demoraram tanto para escrever o livro, no entanto —além do hábito quase diário de compartilhar os últimos artigos revisados por pares sobre o assunto um com o outro— é que eles queriam demonstrar como a fricção é, nas palavras de Sutton, "uma faca de dois gumes". "Por um lado, esgota a iniciativa e a colaboração e, por outro, estão as virtudes construtivas da 'boa fricção'".

Os consertadores de fricção —essencialmente funcionários focados em suavizar as práticas de trabalho— precisam realizar regularmente "revisões de boas práticas" que avaliam e eliminam processos, regras e hábitos ruins. Mas eles também devem perguntar: "O que é muito simples, fácil, rápido e barato por aqui?"

Ed Catmull, quando presidente da Pixar, o estúdio de animação, incorporou uma boa fricção ao processo de desenvolvimento de filmes como Toy Story.

"O objetivo não é a eficiência, é fazer algo bom, ou até mesmo ótimo", ele explicou a Sutton e Rao sobre a forma como sua equipe trabalhava através de múltiplas versões da ideia original, melhorando-a à medida que o filme se desenvolvia.

Colette Cloosterman-van Eerd, da Jumbo, uma rede de supermercados holandesa, viu a necessidade de equilibrar a busca por mais eficiência com uma boa fricção. Ela instituiu "faixas lentas" que permitiam que os funcionários do caixa conversassem com os clientes, especialmente idosos que valorizavam a interação social mais do que a velocidade.

Às vezes, uma boa fricção pode até ser usada para eliminar uma fricção ruim. Laszlo Bock, quando chefe de operações de pessoas no Google, enfrentou críticas ao longo processo de recrutamento da empresa de tecnologia, que às vezes envolvia candidatos e executivos em até 25 reuniões. Ele insistiu que os colegas pedissem sua permissão para conduzir mais de quatro entrevistas. A relutância deles em confrontar o chefe automaticamente agilizou o processo.

Sutton adverte, no entanto, que exemplos simples são excepcionais. Na maioria das vezes, remover uma fricção ruim é "um processo longo e trabalhoso".

Em 2015, a empresa farmacêutica AstraZeneca lançou um "centro de excelência em simplificação" sob a liderança da executiva Pushkala Subramanian. O objetivo do "desafio de um milhão de horas" da AstraZeneca era "devolver" 30 minutos por semana para cada funcionário. As iniciativas individuais incluíram redução de papelada, encurtamento do tempo padrão de reuniões e implementação mais rápida de tecnologia para novos funcionários.

O projeto teve sucesso, mas Subramanian diz que, após sua experiência na AstraZeneca e em uma tarefa posterior de simplificação em outra empresa, ela ficou esgotada. Agora, ela administra uma startup relativamente simples, a Hellowiz, que conecta profissionais experientes a empreendedores em busca de conselhos.

"Muitas vezes, a motivação para simplificar em nível empresarial requer que as pessoas abandonem os velhos hábitos, experimentem novas formas e tentem influenciar consistentemente a liderança", diz Subramanian. "Isso se tornou tão mentalmente exaustivo".

A correção de fricções também é em grande parte não reconhecida. Raramente se pergunta aos candidatos a cargos de liderança como eles eliminaram uma fricção ruim ou adicionaram obstáculos para retardar decisões precipitadas. Em vez disso, "eles continuam adicionando cada vez mais", diz Rao, criando o que os dois acadêmicos chamam de "doença da adição". Isso pode levar a uma "tragédia dos comuns" organizacional, onde as pessoas são incentivadas inadvertidamente a criar danos coletivos.

Em vez de pressionar todos a se moverem mais rápido, os líderes devem se considerar guardiões do tempo dos outros, diz Rao. "Quando você enfatiza a velocidade, está criando uma pobreza de tempo na organização. E sempre que as pessoas enfrentam uma escassez de tempo, pessoas boas podem facilmente fazer coisas ruins".

Por outro lado, quando a correção de fricções é feita de forma adequada, pode trazer benefícios para toda a organização. Por exemplo, em dois anos após o início de sua iniciativa de simplificação, a AstraZeneca economizou 2 milhões de horas, reinvestindo o tempo em testes de medicamentos e melhoria do atendimento ao cliente. Subramanian e a equipe da AstraZeneca então conseguiram implementar um último ato de correção de fricções. Eles transferiram a tarefa contínua de simplificação para os departamentos e funções individuais e desmantelaram completamente seu centro de simplificação.

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