Descrição de chapéu Selic

Juros futuros apontam alta da Selic em 2025, na contramão de economistas

Aumento do risco fiscal e da inflação prevista elevam expectativas para a taxa básica de juros

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São Paulo

A expectativa do mercado financeiro por uma Selic de um dígito em 2025 parece ter ficado para trás. Depois de apontar uma taxa de 8,50% no próximo ano, os juros futuros —contratos que levam em conta a expectativa quanto à Selic futura— agora não apontam mais cortes de juros, e sim uma alta de 0,25 ponto percentual na taxa no segundo semestre do próximo ano, o que levaria a Selic dos atuais 10,50% para 10,75%.

Só que as taxas cobradas nesse contratos não refletem a pesquisa Focus, que aponta uma Selic de 9% em 2025, nem as previsões mais atualizadas dos grandes bancos. De dez instituições financeiras consultadas pela reportagem, sete esperam que a taxa básica de juros caia para um dígito ao fim do próximo ano.

Roberto Campos Neto discursa ao microfone, em bancada do banco central
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, durante coletiva de imprensa na sede do Banco para falar sobre política monetária e inflação. - Pedro Ladeira/Folhapress

Segundo Dalton Gardimam, economista-chefe da Ágora Investimentos, tamanho descasamento de expectativas se deve ao ambiente volátil, provocado pela mudança nas expectativas quanto aos juros nos Estados Unidos e à desancoragem das expectativas para a inflação brasileira.

"O Fed prometia um corte de juros que não aconteceu, e o mais importante ativo financeiro do mundo, que é o juro dos EUA, mudou de patamar e de direção", diz Gardimam.

Fed é o banco central dos EUA, que mantém a Selic americana no maior patamar desde 2001, entre 5,25% e 5,50% ao ano. A expectativa no início do ano era que a autoridade monetária reduzisse a taxa ainda no primeiro semestre. Porém, uma inflação mais forte do que o esperado mudou as apostas. Agora, o mercado está dividido. Metade espera que os cortes comecem em setembro, e a outra metade, em novembro.

No Brasil, a inflação também surpreendeu. Em abril, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) acelerou a 0,38%, ante 0,16% em março. Nos últimos 12 meses, soma 3,69%, dentro do intervalo de tolerância do Banco Central brasileiro, mas acima do centro da meta, que é 3%.

Após essa divulgação, o mercado passou a esperar que o IPCA termine 2024 ainda maior, a 3,86%, segundo a pesquisa Focus, levantamento com diversas instituições financeiras do mercado.

Gardimam espera apenas mais um corte de 0,25 ponto percentual na Selic neste ano, levando-a a 10,25%, e um IPCA de 4%, acima da meta de 3%. "No ano que vem, [a Selic] pode ir para 9,50%, o que ainda é uma taxa de juros muito alta, com um IPCA de 3,5%."

A previsão de uma inflação acima da meta do Banco Central, chamada de desancoragem de expectativas, é um risco adicional, pois indica falta de credibilidade na autoridade monetária, cuja tarefa-fim é conduzir a alta de preços para o intervalo predeterminado. O Focus aponta IPCA de 3,86% e 3,75% neste ano e no próximo. Ambos dentro da margem de tolerância de 1,5 ponto percentual, mas acima do objetivo de 3%.

No pós-pandemia, a alta de preços tem aproximado o IPCA do teto da meta, com o descasamento das cadeias de suprimento globais. Agora, o que provoca a inflação, tanto no Brasil como nos EUA, são o baixo desemprego e a alta nos salários.

Em abril, a taxa de desemprego no Brasil foi ao menor nível dos últimos dez anos, de 7,5%, segundo a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, do IBGE). Nos EUA, ela está perto de mínimas históricas, a 3,9%.

"A inflação de serviços no Brasil está muito pressionada e é o componente que impede, principalmente nas nossas projeções, que a inflação convergisse para os 3%. E isso vem de um mercado de trabalho muito aquecido", diz Fernando Gonçalves, superintendente de Pesquisa Econômica do Itaú.

Outro ponto que pressiona o IPCA é o câmbio —neste ano, o dólar acumula alta de 7,35%, a R$ 5,25. De acordo com analistas, um dos fatores que têm desvalorizado a moeda brasileira é o aumento do risco fiscal brasileiro, com a mudança da meta fiscal de 2025 —de superávit de 0,5% para equilíbrio entre receitas e despesas—, com a piora na arrecadação e com o aumento dos gastos com a tragédia no Rio Grande do Sul.

Quanto mais altas as expectativas de inflação, mais difícil fica contê-la, já que elas balizam as correções de preços. Se o comerciante acha que a conta do fornecedor vai subir, ele pode aumentar o preço dos produtos de forma antecipada.

"É lamentável que esteja havendo essa deterioração de expectativas, mas é a principal razão para ficarmos mais preocupados e acharmos que a Selic tem pouco espaço para cair abaixo dos dois dígitos", afirma Gonçalves.

Em maio, o Itaú revisou sua previsão para a Selic, de 9,75% a 10,25% em 2024 e em 2025.

A última vez em que a Selic ficou abaixo de 10% foi no começo de 2022, quando o Banco Central elevou a taxa do mínimo histórico de 2% —que visava mitigar o impacto econômico da pandemia— para 13,75%, a fim de conter a inflação gerada no processo.

Segundo o UBS, ainda há espaço para que o cenário se repita em 2024. A instituição espera que a Selic termine o ano a 9,75% e continue caindo até 8,50% no próximo.

"O BC volta a cortar juros em setembro, mas só se o Fed também cortar, a inflação estiver sob controle e a próxima decisão do Copom for unânime", diz Alexandre de Ázara, economista-chefe para Brasil do UBS BB.

A divisão na mais recente reunião de política monetária contribuiu para a piora nas expectativas, dizem economistas. Todos os indicados pelo governo Lula votaram por um corte maior do que o efetuado, de 0,5%, sob o argumento de que era esse o cenário previamente desenhado pela autoridade.

"Se a próxima decisão não for unânime, as expectativas de inflação vão subir", afirma Ázara.

Apesar da divergência nas projeções, a perspectiva de que a próxima reunião do Copom, em 19 de junho, é decisiva para as expectativas futuras é unânime no mercado.

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