Plano Real marcou história, mas não foi vitória definitiva contra a inflação, diz Pedro Malan

Ex-ministro diz que outras medidas, como a organização das contas públicas, também foram essenciais

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Participante do núcleo duro criado para combater a hiperinflação no início da década de 1990, o ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central Pedro Malan disse nesta quinta-feira (6) que o Plano Real marcou história, mas não representou uma vitória definitiva contra o descontrole de preços.

Em julho, o plano implementado pelo então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso completa 30 anos. Durante evento em São Paulo organizado pela B3 e pela Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), Malan e o ex-presidente do BC Gustavo Franco relembraram os bastidores daquele marco da história brasileira.

Logo no início de sua fala, Malan relembrou outros instrumentos implementados nos anos seguintes ao Plano Real, que foram importantes no controle dos preços, como o câmbio flutuante, o regime de metas de inflação e a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Pedro Malan e Fernando Henrique Cardoso durante o lancamento do livro "Uma certa ideia de Brasil: entre passado e futuro", de Malan
Pedro Malan e Fernando Henrique Cardoso durante o lancamento do livro "Uma certa ideia de Brasil: entre passado e futuro", de Malan - Marcus Leoni/Folhapress

"Não foi uma operação milagrosa em 400 dias, entre a entrada de Fernando Henrique na Fazenda em maio de 1993 e o lançamento do Real em 1º julho de 1994", disse. "Foram 400 dias que foram um divisor de águas, que marcaram a história do Brasil, mas não representaram uma vitória definitiva contra a inflação", acrescentou.

"Teve uma longa jornada não trivial nos meses e anos que se seguiram", afirmou em outro momento de sua fala.

Segundo Malan, várias medidas tiveram de ser implementadas para consolidar a ideia de que o Brasil tinha condições de conviver com uma inflação que preservasse o poder de compra na moeda nacional.

O ex-ministro citou como exemplo o Plano de Ação Imediata, que surgiu antes do lançamento do Real e que buscava reorganizar as contas públicas. Ou seja, o Plano Real começou com uma espécie de ajuste fiscal.

Malan lembrou das dificuldades que o Brasil tinha em reconhecer que convivia com uma hiperinflação, tema sensível para os brasileiros.

Segundo ele, durante as três décadas que seguiram do início de 1960 ao começo de 1990, o país foi recordista mundial de inflação. Junto ao Brasil estavam somente Rússia (recém-saída da União Soviética), Ucrânia e Congo.

Apesar de Malan ter dito que a operação em si do lançamento do Real não foi um milagre sozinho, Gustavo Franco, que também fez parte daquele núcleo duro de combate à hiperinflação, diz que, dada a realidade dos interesses em Brasília, o que Fernando Henrique Cardoso fez na época foi milagroso.

"Se a gente fosse dizer, em 1994, que em quatro anos íamos trazer a inflação de 2.500% para 1,6%, seríamos recebidos com uma gargalhada", diz.

"A agenda de consolidação fiscal é complicada em Brasília. O Fernando Henrique foi para nós um milagre", afirma. "Não temos mais essa capacidade de articulação em Brasília", completa.

Apesar disso, Franco diz que o país tem mais condições de resolver essa questão hoje do que tinha naquele momento.

"O bom comportamento fiscal pode trazer taxas de juros menores e criação de riquezas", disse em referência ao fato de o governo atual focar suas ações olhando apenas para o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto).

Para Malan, o Plano Real trouxe lições importante para os governos atuais nesse sentido. Segundo ele, é preciso liderança política para o governante formar ao redor de si uma equipe com pessoas que estejam entrosadas e que não queiram competir entre elas.

Ele defendeu que a agenda fiscal seja perseguida em algum momento e lembrou que, diferentemente de medidas implementadas no passado —como as metas de inflação e o regime de câmbio flutuante, que são fixos e que para serem mudados é necessária a aprovação de uma nova política—, o regime fiscal não traz clareza para além do horizonte do governo da vez. "Estamos devendo isso ainda".

Ele criticou o fato de o governo brasileiro ainda conviver com despesas obrigatórias que comem mais de 90% do orçamento total do país, o que engessa o controle das contas públicas.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.