China converte ressentimento numa arma do nacionalismo
A briga pelas ilhas Senkaku (nome japonês) ou Diaoyu (para a China) vai muito além da disputa por território ou pelo controle das riquezas do subsolo marinho.
Envolve questões de política interna nos dois países e um passado ainda não resolvido de ressentimento e nacionalismos, guerras, invasões e mortes. Muitas mortes.
O controle das ilhas é disputado desde o final do século 19. A primeira guerra sino-japonesa acabou em 1895, de forma humilhante para a dinastia Qing, que desde o século 17 governava a China.
O Japão da era Meiji havia abandonado o isolacionismo uma geração antes e tinha Exército e Marinha modernos. A China, nem Exército nacional tinha. Levou mais uma surra, numa sucessão de derrotas esmagadoras.
Perdeu Taiwan, a posse de várias ilhas, entre as quais Senkaku/Diayou, e o controle sobre a península coreana. O Japão tornou-se a primeira potência asiática moderna.
Logo o Japão, que sempre sofrera de certo "complexo de inferioridade" em relação ao vizinho, muito maior e mais rico. Exércitos chineses haviam tentado sem sucesso invadir o país duas vezes no século 13. A China era a potência regional e o Japão, um país à sombra do gigante.
Com a vitória de 1895 veio a revanche. Durante 50 anos, Tóquio governou com mão de ferro territórios no continente. Em 1910, anexou a Coreia. Em 1931, invadiu a Manchúria. Em 1937, invadiu a própria China continental.
Em todos esses anos, os ultranacionalistas soldados japoneses cometeram crimes atrozes. Obrigaram milhares de mulheres (a maioria coreanas) a se tornar escravas sexuais das forças de ocupação.
Ocuparam Nanquim, então capital da China, e massacraram e estupraram boa parte da população. Decapitaram prisioneiros por diversão. Transformaram a Manchúria num campo de provas para armas químicas e biológicas, matando milhares.
Em agosto de 1945, todo o território sob ocupação japonesa foi libertado em poucos dias. Só a aliança com os EUA e o jogo político da Guerra Fria salvaram os japoneses da vingança chinesa.
Para complicar ainda mais o cenário, os líderes japoneses pós-1945 nunca se esforçaram em reconhecer os erros do país, ao contrário.
O ressentimento na Coreia e, principalmente, na China é um sentimento ainda muito forte, como sabe o Partido Comunista, sempre pronto a usar a arma do nacionalismo.
Até por um punhado de ilhotas que mal aparecem no mapa.
MARCO CHIARETTI é jornalista
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