Análise: No Brasil, presidenciáveis olham o passado para política externa
O Brasil, que em outras épocas mereceu o epíteto de "gigante autista" por causa de sua baixa integração com o resto do mundo, hoje tem investido pesadamente em projeção externa.
Na esteira dos megaeventos esportivos que o país sediará –Copa do Mundo e Olimpíada–, diversos atores sociais vêm buscando discutir e qualificar a nossa inserção internacional.
Salta aos olhos, neste momento, a forma como figuras importantes da oposição política à presidente da República têm abordado, com inédita ênfase, os temas da política externa.
Aécio Neves (PSDB-MG) dedicou-se recentemente ao assunto. Em documento que lança as bases da sua campanha ao Planalto, ressaltou o compromisso com uma "diplomacia da prosperidade", fortemente baseada nas alianças comerciais com EUA, Europa e asiáticos e numa volta à tradição de pragmatismo do Itamaraty.
Fernando Henrique Cardoso, por sua vez, pontificou em artigo na grande imprensa que a recuperação do dinamismo econômico do país estaria condicionada à assinatura de acordos de livre comércio com o mundo desenvolvido, bem como ao fim de alinhamentos automáticos com os países bolivarianos da América do Sul.
A visita de Dilma Rousseff a Davos, primeira na condição de chefe de Estado, também é uma indicação desse fenômeno.
Ante a possibilidade de reeleição da presidente, o mundo se pergunta o que vem por aí.
A proposta governista para a política exterior de um futuro mandato, porém, não está clara.
A descontinuidade na chefia do Ministério das Relações Exteriores, com a saída de Antonio Patriota e o ingresso de Luiz Alberto Figueiredo, gerou incertezas e algumas inconsistências.
Por essa razão, o discurso da mandatária brasileira no dia 24 de janeiro era aguardado com ansiedade pela organização do Fórum Econômico Mundial.
Esperava-se que a presidente Dilma pudesse entregar à audiência mais do que referências genéricas a desenvolvimento econômico, inclusão social ou sustentabilidade ambiental.
Correndo por fora nas eleições presidenciais deste ano, Eduardo Campos (PSB-PE) ainda não se posicionou sobre a política externa.
A julgar pelo manifesto institucional do seu partido, pode-se imaginar uma condução levemente inclinada à esquerda, guiada pelos princípios da igualdade soberana e do pacifismo.
As temáticas de meio ambiente e direitos humanos devem ganhar mais destaque, em função da provável composição de chapa com Marina Silva.
Em todo caso, fica a incômoda sensação de que as agendas internacionais de PSDB, PT e PSB voltam-se para as arengas do passado, e não para os dilemas do presente. Afinal, a encruzilhada na diplomacia do século 21 não é mais aquela que opõe liberalismo econômico a nacionalismo político.
Há um novo temário das relações internacionais sendo desconsiderado, fruto das mudanças profundas que acompanharam o fim da Guerra Fria.
Enquanto estas linhas são escritas, inúmeras situações dramáticas, relativas a uso de robôs em conflitos, ciberpirataria, escassez energética e de água potável, migrações e xenofobia, guerras civis e reconstrução de Estados devastados, pandemias, crime transnacional, emprego de armas de destruição em massa, descrédito do multilateralismo etc. estão sendo vivenciadas ao redor do planeta.
Muitas das quais, inclusive, com impactos diretos e imediatos sobre o Brasil.
DAWISSON BELÉM LOPES é professor de política internacional e comparada na UFMG e autor de "Política Externa e Democracia no Brasil: Ensaio de Interpretação Histórica" (Ed. Unesp, 2013)
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