Nanico irlandês se agiganta e vira estrela da eleição no Reino Unido
Paul Faith/AFP | ||
Arlene Foster, líder do DUP, e Peter Robinson, ex-líder da sigla, comemoram resultados em Belfast |
Com o resultado desastroso do governo Conservador na eleição antecipada do Reino Unido, quando tentava aumentar a base parlamentar e acabou ficando com minoria, o nanico Partido Democrático Unionista (DUP, na sigla em inglês), da Irlanda do Norte, surge como a estrela pós-eleitoral. Seus dez parlamentares eleitos, somados à bancada conservadora, garantem à primeira-ministra Theresa May a maioria para formar o governo.
A aliança não será novidade: o DUP já apoia a administração conservadora desde a eleição de 2015, quando David Cameron obteve maioria parlamentar apertada. Um ano depois, com a derrota de sua posição contrária à saída da União Europeia, no plebiscito que convocou sobre a questão, Cameron renunciou e sua ministra do Interior, Theresa May, assumiu o governo, sempre com apoio do partido unionista.
Agora, para não ser um governo de minoria, o mais provável é que o apoio se transforme em uma aliança formal, coalizão.
O DUP é o principal partido daqueles que defendem a manutenção da região norte da Irlanda no Reino Unido (por isso "unionista"), em vez da adesão à república da Irlanda, que ocupa a maior parte do território da ilha. Ele é a maior representante dos descendentes de imigrantes escoceses, predominantemente protestantes, que ocuparam a região durante o domínio britânico, formam a maioria da população local (que seria uma minoria dentro da Irlanda, predominantemente católica).
Foi nessa condição que o partido o principal responsável local pelas negociações de paz com os republicanos, liderados pelo Sinn Féin (chamado "braço político" do movimento armado IRA, que conduziu uma guerrilha de atentados, na Irlanda e na Inglaterra, entre 1969 e 1998).
Dois grupos radicais em seus lados, formaram uma aliança para conduzir juntos o governo da área, reconstituído pelo governo britânico após a pacificação, com o Acordo da Sexta-Feira Santa (10/4/1998). Foi um milagre de engenharia política, cujo equilíbrio surgiu da harmonia entre dois extremos.
Ben Stansall/AFP | ||
A primeira-ministra do Reino Unido Theresa May após as eleições da última quinta (8) |
Desde então, morreram seus dois principais líderes engajados na negociação da paz e condutores do processo de estabelecimento de um governo estável na paz: o reverendo protestante Ian Paisley, do DUP (em 2014), e o ex-militante da luta armada, Martin McGuinness (em março passado). Os dois obituários continham a memória dos elogios mútuos: a confiança entre os dois radicais adversários garantiu a coalizão improvável.
O sucesso da aliança deu aos dois lados o predomínio da política na Irlanda do Norte. Nesta eleição, o DUP ganhou dois assentos no Parlamento (tinha 8 antes) e o Sinn Féin, três (tinha 4, passa a 7). Com isso, sobrou apenas um deputado independente na região.
O partido nacionalista irlandês também representa uma irônica parte do processo pós-eleitoral. Embora seja radicalmente contrário aos Conservadores (o governo de sua líder Margaret Thatcher esmagou o IRA, enquanto o trabalhista Tony Blair devolveu a autonomia política à região) ele vai ajudar a sobrevivência de Theresa May, pois nunca assume as cadeiras no Parlamento –republicana, a sigla não reconhece a autoridade do governo britânico sobre a Irlanda.
Assim, com 7 deputados, o partido reduz o Parlamento a 643 cadeiras de fato.
No cenário nacional, DUP e Sinn Féin coincidem contra o "brexit": defendem juntos o virtual desaparecimento das fronteiras entre Irlanda do Norte e a república, que teriam que ser restabelecidas com um "brexit" mais radical; também a economia das duas áreas se fundiu radicalmente e ambos querem que continue assim. Ali ninguém quer um "brexit duro".
Por tudo isso, embora com uma dezena de deputados, o DUP será um radical defensor da saída suave da Europa. Com experiência bem-sucedida na condução do processo local, é possível pensar que o nanico venha a ser estrela não só pelo punhado de votos que oferece a May, mas também para forçar o governo conservador a conduzir uma boa negociação com a Europa.
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