Irlanda vota em referendo para possível revisão de lei contra aborto

Permitindo interrupção só por risco de morte da mãe, país tem uma das leis mais restritas da UE

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Mulher carrega, em Dublin, placa com propaganda favorável à revisão de lei contra aborto
Mulher carrega, em Dublin, placa com propaganda favorável à revisão de lei contra aborto - Max Rossi/Reuters
 
Bruxelas

A Irlanda vota nesta sexta-feira (25) em uma consulta histórica sobre as suas leis contra o aborto. O país decide se vai eliminar ou manter uma das legislações mais restritivas da Europa.

O voto diz respeito à oitava emenda da Constituição, que proíbe o aborto exceto quando há risco para a vida da mãe. As penas por realizar o procedimento chegam a 14 anos de prisão. Outros países europeus têm normas mais liberais —na Espanha, a interrupção é permitida nas primeiras 14 semanas de gravidez.

A consulta vai até as 22h locais (17h em Brasília), e a contagem começa apenas no dia seguinte. Votar "sim" significa repelir a lei vigente e introduzir normas permitindo o aborto até a 12ª semana. Com o "não", a regra fica como está.

Vence o lado que obtiver mais votos por maioria simples, e não há comparecimento mínimo para que a consulta seja considerada válida.

Sondagem do Sunday Business Post, feita de 10 a 16 de maio, mostra que 56% dos irlandeses vão votar no "sim", enquanto 27% vão preferir o "não". Indecisos são 17%. A empresa RED C, que entrevistou 1.015 pessoas, não divulgou a margem de erro.

Há a perspectiva, no entanto, de que o resultado surpreenda os analistas, como aconteceu em 2016 na consulta sobre o "brexit" (saída britânica da União Europeia) e na eleição de Donald Trump à Presidência dos EUA. Um dos fatores relevantes é que parte dos eleitores do "não" tem receio de declarar o voto, devido ao estigma social dessa opção.

"É muito cedo para dizermos qual vai ser o resultado", diz à Folha a deputada Ivana Bacik, que nos anos 1980 foi ameaçada de prisão por seu ativismo pró-aborto.

"Hoje temos as leis mais restritivas do continente, o que nos preocupa muito. Se vencermos, será um sinal de importante e real transformação social, e seremos um país com mais igualdade de gênero."

Também como no "brexit" e na eleição americana, existe o temor de interferência externa e circulam campanhas de desinformação. Gigantes como Google e Facebook anunciaram mudanças em suas regras de anúncios: o primeiro proibiu propagandas relacionadas à consulta, enquanto o segundo impediu estrangeiros de comprar anúncios.

Apesar de dizer respeito a uma legislação local, a consulta irlandesa atraiu a atenção estrangeira por ter sido apresentada como uma disputa mais global entre visões díspares sobre o aborto e a igualdade de gênero. De um lado, há argumentos quanto ao direito de a mulher decidir o futuro de sua gravidez. Do outro, discute-se o direito do feto à vida desde sua concepção.

"De fato, não seguimos o exemplo dos outros países europeus, mas isso não é ruim", afirma Emer Tobin, uma das líderes da campanha contra o aborto. "Há soluções melhores para a gravidez indesejada [do que o aborto], como campanhas de educação sexual mais efetivas."

Uma das razões pelas quais a Irlanda tem leis restritivas para o aborto é a ampla influência da Igreja Católica. Mas ela tem se diluído nas últimas décadas. Tobin diz que seu voto não é religioso, e sim moral.

As campanhas contrárias ao aborto reclamam de que não puderam expor suas opiniões amplamente e de que seus eleitores foram ridicularizados pela outra parte.

Tobin relata que a grande imprensa fez campanha a favor do "sim", e mesmo os políticos de mais destaque se alinharam para repelir a legislação. O primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar, e sua oposição declararam apoio ao aborto. "Não acho que tenha havido de fato uma campanha livre para essa consulta", diz Tobin.

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