Após anos em baixa, o preço do petróleo voltou a subir com força no mercado internacional. Em tempos passados, a notícia seria festejada na Venezuela, mas o sucateamento da estatal PDVSA e a delicada situação econômica do país deixam pouco espaço para celebração.
Consequência do recrudescimento das tensões entre EUA e Irã e da própria crise da produção venezuelana, o preço do barril do tipo Brent (referência para o mercado internacional) ultrapassou, nesta semana, a barreira dos US$ 80 —é a primeira vez que isso ocorre em quatro anos.
Desde o ano passado, o preço do barril já subiu 40%. Com o anúncio do presidente americano, Donald Trump, de que abandonaria o acordo nuclear com o Irã, a cotação do combustível já ficou US$ 5 mais cara neste mês.
Essa recuperação, porém, não teve impacto na economia venezuelana. Pelo contrário: o FMI projeta que o país deve fechar 2018 com uma queda de 15% do PIB (o quinto ano consecutivo de contração econômica) e uma hiperinflação de 13.864% —de longe, a maior do mundo.
O principal motivo é o declínio da produção desde a ascensão do presidente Hugo Chávez, em 1999, quando a Venezuela entregava 3,1 milhões de barris de petróleo por dia.
Atualmente, a produção venezuelana está estimada em cerca de 1,47 milhão de barris/dia, o pior nível em 33 anos.
A PDVSA, que sob Chávez passou a ter o monopólio da indústria petroleira, enfrenta outros problemas, vinculados a disputas em tribunais internacionais.
Uma decisão judicial deu à empresa americana ConocoPhillips o controle de terminais de exportação no Caribe, em meio a uma disputa sobre a indenização após a estatização de suas operações na Venezuela.
Sem essas instalações, a PDVSA perdeu parte de sua capacidade de envio de petróleo para a China e outros países.
Outra limitação para a Venezuela se beneficiar da alta do preço são os empréstimos contraídos com a China. São cerca de US$ 50 bilhões, a serem pagos com petróleo, além das taxas de juro.
A PDVSA também sofreu um inchaço de funcionários à medida que passou a administrar programas sociais e empresas de processamento de alimentos.
Segundo o dado oficial mais recente, de 2016, a estatal petroleira tinha 146 mil funcionários contratados. No início do governo Chávez, eram cerca de 27 mil —com o dobro de produção de petróleo.
Os cofres da estatal sofrem ainda com a sangria provocada pelos subsídios do mercado interno, que consome até 450 mil barris/dia. Atualmente, a gasolina é tão barata que, com apenas US$ 1 (R$ 3,74), é possível comprar 122 mil litros.
Um outro sintoma dos problemas é que, segundo a agência Reuters, a PDVSA, comprou o equivalente a US$ 440 milhões (R$ 1,6 bilhão) em petróleo e enviou o carregamento a Cuba, em vez de vender ao país aliado produto de suas reservas.
Simpático ao governo chavista, o economista Andrés Giussepe afirma que um erro de avaliação a partir de 2005 foi o motivo da queda da produção.
Estimando que o petróleo não cairia mais de preço, o governo Hugo Chávez passou a priorizar a faixa do Orinoco, de extração onerosa por se tratar de petróleo pesado e ultrapesado, em detrimento de recuperar a produção de campos velhos, explica o analista.
Giussepe diz que, antes de recuperar a produção dos campos para aproveitar a provável nova bonança, a PDVSA precisa renegociar o Petrocaribe, acordo de exportação subsidiada para países da região, combater a corrupção e o oligopólio de empresas de serviços petroleiros.
"Se não souberem o que fazer com o petróleo, é melhor que não o extraiam", disse Giussepe, citando uma frase que ficou famosa na Venezuela em meados dos anos 1970.
Crítico do chavismo, o economista Francisco Monaldi afirma que o petróleo venezuelano tende a continuar abaixo do solo, ao menos no curto prazo.
Em estudo recente, ele estima que a produção diminuirá até 350 mil barris por dia até dezembro, devido aos problemas de caixa cada mais graves e imprevisíveis da PDVSA.
Monaldi argumenta que, para iniciar a recuperação, é preciso atrair novamente empresas petroleiras ocidentais, que atuariam com estatais de China, Rússia e Índia.
Além disso, a PDVSA precisaria de grande reestruturação, para se concentrar exclusivamente na produção de gás e petróleo.
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