Renúncia de chefe expõe situação de penúria da Unasul

Sem comando e sem dinheiro, órgão criado para integrar América do Sul fica perto da irrelevância

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Os então presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Fernando Lugo (Paraguai) e Hugo Chávez (Venezuela, com a câmera) durante reunião da Unasul em Bariloche (Argentina), em 2009
Os então presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Fernando Lugo (Paraguai) e Hugo Chávez (Venezuela, com a câmera) durante reunião da Unasul em Bariloche (Argentina), em 2009 - Enrique Marcarian - 28.ago.09/Reuters
São Paulo

O colombiano Yuri Chillán, chefe de facto da Unasul, apresentou sua carta de renúncia na terça-feira (31), trazendo à tona uma série de escândalos e a situação de penúria da instituição.

A Unasul está sem secretário-geral, sem chefe de gabinete, tem apenas 2 de 5 diretores, conta com menos de 25% do necessário para cobrir seu orçamento e corre o risco de perder sua sede.

Desde o início do ano, a Unasul não fez nenhuma reunião significativa, e os funcionários estão completamente ociosos, passam o dia na internet. 

Dos 48 funcionários, sobraram 27, os únicos ocupantes dos 19,5 mil metros quadrados de um prédio de cinco andares em Quito, no Equador. 

A sede de US$ 43,5 milhões foi doada pelo governo do Equador à Unasul, e agora o presidente equatoriano, Lenín Moreno, pede o prédio de volta. Só em manutenção, consome quase US$ 1 milhão por ano. O presidente eleito da Colômbia, Iván Duque, anunciou que vai retirar o país do órgão. 

Estátua de Néstor Kirchner na frete da sede da Unasul, em Quito; presidente do Equador quer de volta o prédio, que custou US$ 43,5 milhões
Estátua de Néstor Kirchner na frete da sede da Unasul, em Quito; presidente do Equador quer de volta o prédio, que custou US$ 43,5 milhões - Johis Alarcón/Folhapress/Folhapress

A Unasul foi criada em 2008 pelos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Hugo Chávez (Venezuela) e Néstor Kirchner (Argentina). O objetivo era aumentar a integração na região e funcionar como órgão regional sem influência dos EUA. 

A crise começou em 2016, quando Venezuela, Equador e Bolívia bloquearam a nomeação do embaixador argentino José Octávio Bordón para substituir o então secretário-geral, Ernesto Samper. A Venezuela argumenta que o indicado precisaria ser um ex-presidente ou ex-chanceler.

Como a decisão exige consenso, a Unasul está sem secretário-geral desde janeiro de 2017. O chefe de gabinete Yuri Chillán vem atuando como chefe de facto, numa gestão cercada de denúncias. Foi acusado pelos diretores Pedro Silva Barros e David Álvarez de assédio sexual e moral e de mau uso de recursos.

Em sua carta de renúncia, Chillán diz que “o ambiente interno se tornou tóxico” e acusa Silva Barros e Álvarez de “calúnia e difamação”. À Folha Chillán negou as acusações de assédio e disse estar processando os ex-colegas.

O governo brasileiro paga uma cota de US$ 4 milhões por ano à Unasul, mas está devendo US$ 12,5 milhões. 

Em abril, Brasil, Argentina, Paraguai, Colômbia, Chile e Peru suspenderam sua participação e seus pagamentos ao bloco, por causa do impasse sobre o secretário-geral, além de impedir a contratação de funcionários.

Como o contrato dos dois diretores que sobraram vence no próximo mês, em breve a Unasul ficará sem nenhum diretor.

Em carta de junho, Chillán afirmava que, caso a Unasul não recebesse recursos em julho, pararia de fazer todos pagamentos. Do orçamento de US$ 9,6 milhões de 2018, só tinha recebido US$ 223 mil.

Nesta quarta-feira (1º), a Venezuela pagou US$ 2,3 milhões, que garantem a sobrevivência da Unasul até o fim de 2018.

“É um despropósito gastar dinheiro na Unasul, que não está fazendo nada”, diz o diretor Álvarez, que renunciou em julho, em protesto contra Chillán. 

O governo brasileiro não pretende pagar sua dívida e culpa a Venezuela pelo impasse. Mas não cogita sair da Unasul.

“Precisamos de um órgão sul-americano, o Brasil não quer que a Unasul desapareça”, diz Paulo Estivallet, subsecretário-geral de América Latina do Itamaraty. “Mas, como está, não dá para continuar.”

“A renúncia é consequência da crise criada pelos países; o Brasil está ausente e tomou partido do Grupo de Lima”, disse à Folha Samper.

Para Barros, que deixou a Unasul semana passada, a crise decorre da omissão brasileira.

“Os vizinhos esperam o protagonismo do Brasil em 2019, quando teremos a presidência do bloco. Seja para fortalecê-lo, seja para fechá-lo.”

 

SAIBA MAIS SOBRE A UNASUL

> O nome completo é União de Nações Sul-Americanas
> Seu tratado constitutivo foi criado em 23 de maio de 2008, em Brasília
> O tratado entrou em vigor 11 de março de 2011
> O ex-presidente argentino Néstor Kirchner foi eleito primeiro secretário-geral, em 4 de maio de 2010 
> Oficialmente, possui 12 países membros, perfazendo um total de 420 milhões de habitantes
> Em 20 de abril de 2018, Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Paraguai e Peru suspenderam sua participação no bloco

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