Lei que permite proibir manifestantes de ir a protestos avança na França

Regra é apoiada pelo governo de Macron, acuado por atos semanais dos 'coletes amarelos'

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Manifestante com máscara de Guy Fawkes e colete amarelo durante protesto em Bordeaux - Georges Gobet/AFP
Paris

A Assembleia Nacional da França, equivalente à Câmara dos Deputados brasileira, aprovou nesta terça-feira (5) um controverso projeto de lei que fixa restrições e punições para participantes de manifestações.

O texto é apoiado pelo governo Emmanuel Macron, acuado há mais de dois meses por protestos semanais dos “coletes amarelos”, movimento heterogêneo que começou pedindo a suspensão do reajuste dos combustíveis para logo encampar pauta mais difusa, centrada na reivindicação de aumento do poder aquisitivo da classe média.

Ao longo da mobilização, iniciada em meados de novembro, episódios de vandalismo foram registrados em várias cidades do país –dentre os quais se incluem destruição de vitrines e mobiliário público, saques a estabelecimentos comerciais e incineração de carros.

Por outro lado, a repressão policial deixou dezenas de feridos, que perderam a visão ou ficaram desfigurados após serem atingidos por projéteis lançados por forças de segurança.

Dois dos itens mais contestados do projeto de lei, que volta agora para o Senado, são a possibilidade de proibir certos indivíduos de participar de atos, mesmo que não tenham sido condenados por sua conduta em protestos anteriores, e a pena estabelecida para aqueles que forem a manifestações com o rosto coberto e não apresentarem “motivo legítimo” para isso.

No primeiro caso, as chefias regionais de polícia terão a prerrogativa de banir pessoas, o que até aqui só podia ser feito por juízes.

 
Poderá ser visado pela interdição qualquer cidadão “que constitua ameaça à ordem pública” por causa de seu histórico em aglomerações populares, a saber, “por atos que atentaram gravemente contra a integridade física das pessoas ou que provocaram danos materiais expressivos”.

O veto valerá para todo o território francês e durará um ano. Segundo os deputados, os alvos da proibição serão avisados com antecedência de seu status de persona non grata e poderão recorrer à Justiça.

No caso dos manifestantes que ocultarem parcial ou integralmente o rosto atrás de cachecóis, máscaras ou balaclavas sem oferecerem justificativa julgada plausível, a punição combina um ano de prisão a uma multa de 15 mil euros (R$ 63 mil).

Críticos da medida dizem que ela desconsidera situações em que indivíduos precisariam tapar o nariz e a boca, por exemplo, para se proteger de bombas de gás lacrimogêneo lançadas pela polícia –ou simplesmente da chuva e do frio.

Outros artigos do texto referendado pelos deputados preveem a instituição de revistas de malas e veículos em um perímetro próximo ao de manifestações –mas aqui, só mediante autorização judicial— e o “fichamento” temporário das pessoas que tiverem sido proibidas de integrar manifestações (pelo período em que vigorar a interdição).

Além disso, os autores de atos de vandalismo deverão pagar pela reconstrução ou pelo conserto do patrimônio depredado. Hoje, é o Estado que arca com tais custos.

O texto, apresentado pelos Republicanos (designação atual da direita tradicional francesa), passou sem dificuldade na Assembleia, onde o governista A República em Marcha goza de ampla maioria –ocupa 307 dos 577 assentos.  

Mas há ressalvas à matéria até dentro da situação: 50 deputados da legenda de Macron se abstiveram na votação desta terça.

Na imprensa francesa, muitas vozes têm se levantado contra o que alguns enxergam como uma “lei do medo”, que ataca liberdades civis e atropela o processo jurídico no afã de enquadrar não o vandalismo isolado, mas o próprio (e legítimo) ato de se manifestar.

“É o cidadão que a lei intimida, não o delinquente”, disse ao Monde nesta semana o advogado e escritor François Sureau, amigo de Macron.  

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