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Com vitória estrondosa de Modi, Índia entra na era da hegemonia do nacionalismo hindu

Resultado consolida primeiro-ministro como um dos mais poderosos líderes da história do país

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Florência Costa
Nova Déli

​A vitória acachapante do primeiro-ministro Narendra Modi nas eleições gerais da Índia não deixa dúvidas: um TsuNaMo —combinação de tsunami com as iniciais do nome do premiê— varreu a terceira economia da Ásia.

O carismático Modi passou o trator na dinastia dos Nehru-Gandhi (sem ligação com Mahatma Gandhi), representada por Rahul Gandhi, presidente do Partido do Congresso, que sequer conseguiu manter sua cadeira na Lok Sabha, a câmara baixa do parlamento indiano.

A campanha foi toda centrada na figura de Modi, e a oposição não conseguiu se mostrar como alternativa.

O premiê indiano Narendra Modi, com os braços levantados, após a vitória nas eleições
O premiê indiano Narendra Modi, com os braços levantados, após a vitória nas eleições - Money Sharma/AFP

Na véspera da divulgação dos resultados, Modi peregrinou até o alto dos Himalaias para meditar em uma caverna sagrada e pedir a proteção de Shiva, o deus da destruição, a partir da qual se inicia a construção.

Modi reconstruiu uma “nova política” atraindo votos de ricos a pobres, de castas altas a baixas. A Índia entra, a partir de hoje, na era da hegemonia do nacionalismo hindu.

O principal lema da campanha de NaMo, como é chamado Narendra Modi, conquistou os indianos: “Todos juntos, desenvolvimento para todos”.

Sua mágica está associada ao nacionalismo e ao mantra “vikas” (desenvolvimento). “Vikas”, para o indiano, segundo pesquisas de opinião realizadas durante a campanha eleitoral, significa eletricidade, gás de cozinha, água potável, saúde, educação.

Modi governou por cinco anos, e seu primeiro mandato não foi considerado maravilhoso. A taxa de desemprego, segundo relatório do Ministério de Estatísticas que o governo tentou manter em segredo, chegou a 6%, a mais alta em 45 anos. A renda dos indianos do campo, onde vivem quase 70% da população, vem caindo, assim como a produção industrial.

Mas os indianos acharam que ele merecia mais cinco anos para provar que será capaz de entregar melhorias concretas na vida do cidadão comum.

Seu governo toca cerca de 900 programas sociais. Os mais famosos são o Swachh Bharat Abhiyan (Movimento Índia Limpa), que, ao construir milhões de banheiros, beneficiou, segundo o governo, 550 milhões de pessoas, e o de distribuição de gás de cozinha. Há seis meses, foi lançado um projeto de seguro de saúde gratuito para miseráveis.

“Juntos cresceremos, juntos prosperaremos. Juntos vamos construir uma Índia forte e inclusiva”, publicou Modi, no Twitter, assim que a apuração começou a revelar a vitória estrondosa.

A proposta de uma “Hindu Rashtra” (nação hindu), defendida pelo seu Partido do Povo Indiano (Bharatiya Janata Party, ou BJP), soou como música aos ouvidos da população, a maior parte (80%) hinduísta e cada vez mais influenciada pelo discurso antimuçulmano. Modi já foi chamado de “imperador dos corações hindus”.

Mas o projeto nacionalista hindu causa arrepios nos defensores de uma Índia secular, ideia pela qual Mahatma Gandhi deu a vida (foi morto a tiros por um extremista hindu, em 1948).

A oposição acusa o BJP de intolerância com as minorias religiosas, especialmente os muçulmanos
(16% dos 1,3 bilhão de indianos, ou seja, 208 milhões de pessoas, pouco menos do que o tamanho da população brasileira). Dizem que Modi é “autocrata”, “arrogante” e uma “ameaça à democracia”.

A partir de hoje, Modi, um expoente da chamada direita nacionalista hindu, consolida-se como um dos mais poderosos líderes da história da Índia, em posição confortável neste contexto global de autocratas.

Alguns o comparam com Indira Gandhi, avó de Rahul Gandhi, a dama-de-ferro que governou a Índia por 14 anos e instalou a Emergência, período de 21 meses de opressão a dissidentes.

Com Modi não tem meio termo: é ame-o ou deixe-o. Este filho de Chaiwallah (vendedor de chai, o cafezinho dos indianos) soube projetar uma imagem de Índia forte no exterior e transmitir a ideia de que é o líder que o país precisa.

Após ter ordenado o ataque aéreo contra o Paquistão, em resposta ao atentado terrorista de fevereiro que matou 40 paramilitares indianos na Caxemira, Modi acrescentou, no Twitter, a palavra “chowkidar” (vigilante) antes de seu nome.

Após a vitória nas eleições, nesta quinta-feira (23), o premiê decidiu retirar a palavra de seu perfil na rede social. "Agora, chegou o tempo de levar o espírito 'chowkidar' para outro nível", escreveu Modi. "A palavra 'chowkidar' deixa meu nome no Twitter, mas se mantém como parte integral de mim. Peço a todo que façam o mesmo!"

Modi terá pela frente missões gigantescas. Sudarshan Ramabadran, da India Foundation, uma das mais
influentes think tanks do país, afirmou à Folha que o premiê fará grande reformas para tentar impulsionar o crescimento econômico para além da atual taxa de 7%.

“Modi vai focar as ações para atacar a pobreza, já que vem de uma origem humilde, e vai procurar aumentar o poder de compra do indiano”, afirmou.

É o que os indianos chamam de “Modi 2.0”.

Correspondente na Índia entre 2006 e 2012, Florência Costa é autora de "Os Indianos" (Editora Contexto, 2012).

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