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Em documento a educadores, Vaticano prega que gênero é apenas o biológico

Para igreja, 'escolha de sexo' contradiz noção tradicional de casamento

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CHICO HARLAN
Roma | The Washington Post

Advertindo contra uma sociedade "sem diferenças sexuais", o Vaticano rejeitou na segunda-feira (10) a ideia de que o gênero de uma pessoa pode diferir do sexo atribuído no nascimento. Para a Igreja Católica, uma ideia fluida de identidade "não se baseia nas verdades da existência". 

O direito a "escolher o próprio gênero", disse o Vaticano em um documento oficial, está "em direta contradição com o modelo de casamento sendo algo entre um homem e uma mulher". 

O documento, divulgado como um guia para educadores católicos, mantém firmemente o ensinamento tradicional da religião sobre gênero e sexualidade. Mas membros LGBT da fé disseram que ele coloca um selo oficial e atualizado sobre pontos de vista que eles esperavam que estivessem mudando.

O papa Francisco na praça São Pedro, no Vaticano
O papa Francisco na praça São Pedro, no Vaticano - Yara Nardi/Reuters

"Isto joga tudo de volta para a idade das trevas", disse Marianne Duddy-Burke, diretora-executiva do grupo DignityUSA, que defende a igualdade LGBT e a inclusão na igreja. "Acho incrivelmente insensível ainda estar falando sobre gênero e sexualidade como uma opção e um capricho momentâneo, e não uma identidade fundamental dada por Deus." 

O documento, divulgado pelo departamento do Vaticano que trata de educação, coincidiu com o mês de comemorações do Orgulho Gay em muitos países em todo o mundo. Ele não foi assinado pelo papa Francisco, mas sim por dois outros chefes da Cúria Romana, a burocracia do Vaticano —o cardeal Giuseppe Versaldi e o arcebispo Angelo Vicenzo Zani.

O recuo da igreja sugere um dos desafios que ela enfrenta num momento de crescente secularização — quando muitos de seus ensinamentos sobre sexualidade estão sendo considerados defasados.

Francisco manifestou interesse em alcançar os fiéis LGBT, mas ele também assumiu uma clara posição sobre a identidade de gênero, lamentando a ideia de que crianças são ensinadas nas escolas que "todo mundo pode escolher seu sexo". "Isso é terrível", disse o papa em 2016.

A igreja disse na segunda-feira que é importante escutar e "compreender os acontecimentos culturais das últimas décadas", mas também descreveu uma crise na educação sexual —uma "desorientação" que estaria desestabilizando a família e cancelando as diferenças entre homens e mulheres.

A igreja defendeu a tese de que crianças têm o direito de crescer em uma família "com um pai e uma mãe", e o documento citou um discurso anterior de Francisco sobre como as crianças se beneficiam de ver a masculinidade representada pelo pai e a feminilidade representada pela mãe.

"É exatamente no núcleo da unidade familiar que as crianças podem aprender a reconhecer o valor e a beleza das diferenças entre os dois sexos", disse o documento.

Grupos tradicionalistas elogiaram o documento de 31 páginas do Vaticano, intitulado "Macho e Fêmea Ele os Criou". O grupo conservador CitizenGO, de Madri, que faz campanha no mundo todo, chamou o guia de "um manual extraordinário".

"Esta ferramenta decisiva é muito clara na condenação da ideologia de gênero e dos graves danos que ela causa na sociedade", disse o grupo.

O padre James Martin, importante jesuíta que defendeu a maior abertura da igreja aos membros LGBT, disse numa rede social que o documento pede diálogo e escuta, "mas põe de lado as experiências reais das pessoas LGBT". 

"Infelizmente", escreveu Martin, "ele será usado como uma arma contra as pessoas transgênero e uma desculpa para afirmar que elas não deveriam existir."

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves 

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