Descrição de chapéu Coronavírus

Fotógrafo premiado registra rotina de socorristas, 'heróis da pandemia' nos EUA

John Moore acompanha evolução do coronavírus no país mais afetado pela Covid-19 no mundo

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

A paramédica Patricia Rodríguez durante breve pausa em seu trabalho como socorrista de pacientes com Covid-19 nos EUA

A paramédica Patricia Rodríguez durante breve pausa em seu trabalho como socorrista de pacientes com Covid-19 nos EUA John Moore - 6.abr.20/Getty Images

São Paulo

Depois de um turno de 12 horas de trabalho, uma paramédica do estado de Nova York apoia o rosto em uma das mãos. O olhar é perdido, e a expressão, abatida.

Sentada no banco do motorista de um carro, ela aproveita um breve momento de respiro entre o preenchimento de um formulário e outro de pacientes com Covid-19.

Funcionária do EMS, o serviço de emergências médicas dos EUA, Patricia Rodríguez havia passado o dia cuidando de doentes em suas casas e os transportando a hospitais do condado de Westchester e da região do Bronx, em Nova York.

Com mais de 18 mil mortes, a metrópole é a cidade mais afetada pelo coronavírus nos EUA, o país com o maior número de casos confirmados de Covid-19 no mundo.

“Essa crise afetou todas as partes da sociedade, mas paramédicos e socorristas enfrentam circunstâncias árduas e lidam com pacientes que estão morrendo todos os dias, o dia todo”, diz o fotógrafo John Moore, que registrou em uma imagem o momento de descanso da paramédica.

“Os funcionários do EMS são os verdadeiros heróis.”

Ganhador em 2019 do mais importante prêmio de fotojornalismo do mundo, o World Press Photo —com o retrato de uma criança hondurenha e de sua mãe sendo detidas na fronteira sul dos EUA—, Moore está registrando há seis semanas a evolução da pandemia de coronavírus em diversos estados americanos para a agência Getty Images.

Ele já passou por Washington e Connecticut. Agora, está em Nova York. Algo comum a todos esses lugares é o papel fundamental desempenhado pelos profissionais de saúde, que lidam diretamente com a doença, afirma o fotógrafo, em entrevista por e-mail.

“As imagens da linha de frente da crise frequentemente são de partir o coração, mas é importante documentar o que está acontecendo e mostrar o aspecto excruciante e por vezes edificante desta pandemia", afirma Moore.

"É a bravura de humanos ajudando humanos a ficarem vivos. Meu trabalho é quase insignificante em comparação ao dos funcionários do EMS.”

Com 575 socorristas e paramédicos, o serviço de emergências atende cerca de 500 mil pessoas em municípios vizinhos a Nova York e no bairro do Bronx.

Depois de serem acionadas pelo número 911, as equipes vestem os equipamentos de proteção individual e muitas vezes já entram na casa do paciente com tubos de oxigênio em mãos. Casos com sintomas graves de Covid-19 são levados para o hospital.

O fotógrafo relata que tem conversas longas com as equipes de emergência antes de acompanhá-las: o comandante do time precisa estar ciente de que Moore saberá como vestir o equipamento de proteção na hora certa e de que não atrapalhará o trabalho dos médicos.

Os longos turnos de trabalho, descritos por ele como intensos, duram entre 12 e 20 horas.

Apesar de ter experiência na cobertura de situações de alta tensão —como conflitos no Oriente Médio, a militarizada fronteira dos EUA com o México e a epidemia de ebola no oeste da África—, Moore conta que a singularidade da crise atual coloca um novo desafio na realização de seu trabalho: a dificuldade de obter acesso para documentar os fatos “de maneira respeitosa e humana”.

É impossível fotografar dentro de asilos, por exemplo, locais muitas vezes “saturados com pessoas doentes e morrendo”, motivo pelo qual a mídia não é bem-vinda. Além disso, há o risco de que alguém infectado leve o vírus para dentro de uma casa de repouso que não está contaminada.

Moore produziu algumas imagens nos arredores de uma residência para idosos em Kirkland —próxima à Seattle—, local do primeiro surto de coronavírus nos EUA, ligado a 37 mortes.

“Foi difícil para os funcionários e para os oficiais dos estado lidarem com a quantidade de infecções [naquele asilo], então foi uma situação de bastante pânico. Enquanto eu estava lá, me dei conta do quão sério aquilo seria”, diz.

Para entrar em hospitais, o fotógrafo tem de lidar com uma extensa burocracia. Também não pode mostrar os rostos dos pacientes, além de ter o cuidado de fazer imagens que captem o contexto.

Quando fotografa em residências, diz pedir autorização da família ou do doente para usar os nomes completos e divulgar as cidades —uma questão delicada no caso de imigrantes sem documento e com Covid-19.

Além do risco de contágio, Moore precisa manejar o equipamento de proteção individual. Se o traje protetor e as luvas possibilitam que ele chegue mais perto do que quer fotografar, as máscaras dificultam o trabalho.

O modelo N95 embaça seus óculos, e o tipo respirador, que cobre totalmente o rosto e é usado em ambientes altamente infecciosos —como em casas com várias pessoas doentes em isolamento—, dificulta o enquadramento preciso.

Depois de fazer as fotos, ele tira as roupas protetoras em uma ordem específica para evitar a contaminação, passa spray germicida e as coloca num saco para que sejam incineradas.

Por fim, limpa a câmera com desinfetante e lenços umedecidos. No dia seguinte começa tudo outra vez.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.