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Coronavírus impede abraço na chegada de 15º voo de deportados dos EUA

Oitenta brasileiros desembarcaram no aerorporto de Confins, em Minas Gerais, nesta sexta

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Confins (MG)

​João Batista conteve o abraço mesmo depois de quatro anos sem ver o filho Hudson Correa, quando o jovem saiu pela porta do desembarque internacional do Aeroporto de Confins (a 37 km de Belo Horizonte), nesta sexta-feira (15).

De máscaras —o pai com uma de tecido preto, o filho com um modelo descartável—, os dois se cumprimentaram a uma distância segura, ainda que próxima, e evitaram se tocar.

Com áscaras, familiares e amigos esperam por deportados no aeroporto de Confins (MG)
Com áscaras, familiares e amigos esperam por deportados no aeroporto de Confins (MG) - Fernanda Canofre/Folhapress

A maioria dos familiares que aguardava a chegada dos 80 brasileiros deportados dos Estados Unidos tentava manter as orientações de prevenção ao novo coronavírus. O número de passageiros foi divulgado pela BH Airport, administradora do aeroporto.

Uma mulher de Ipatinga (MG), que abraçou a mãe, foi uma das poucas exceções. As duas foram detidas ao mesmo tempo tentando atravessar a fronteira em situação irregular, mas acabaram separadas nos Estados Unidos. A filha voltou ao Brasil em março, quando falou com a Folha.

Esse foi o 15º voo do tipo a chegar a Minas Gerais desde outubro do ano passado —quatro deles, que trouxeram um total de 245 pessoas, segundo dados da BH Airport, ocorreram depois da suspensão dos voos internacionais em Confins por conta da pandemia.

“Pai toda hora quer o filho de volta. Foi ansiedade demais da conta nesse um mês [separados]. Você não come direito, você não dorme, você não tem sossego. Agora sim, estou tranquilo”, disse Batista ao lado de Hudson.

O filho, que trabalhava com pintura automotiva nos EUA, ficou detido por um mês e dez dias, depois de ser preso em casa. Morando no país havia quatro anos, suspeita que alguém tenha denunciado sua situação.

“Agora tenho que ficar em quarentena, para ver se [o teste] não dá positivo [para o coronavírus]. Lá em Miami está muito contaminado”, disse Hudson.

No local onde ficou detido, ele diz que álcool em gel só foi entregue há pouco tempo, mesmo com muitas pessoas juntas no mesmo ambiente.

Outros deportados ouvidos pela reportagem contaram que, nos centros de detenção em que estavam, receberam máscaras de tecido, que eles mesmos deveriam lavar e eram de uso obrigatório.

No voo que trouxe os brasileiros, fretado pelo governo americano, álcool em gel só era entregue na saída do banheiro. Máscaras de material descartável foram dadas a eles na saída das detenções, a caminho do embarque.

A rota, que costumava parar em Guayaquil, uma das cidades mais atingidas pela pandemia no Equador, também foi alterada e passou a ter parada em San Juan, em Porto Rico.

Os brasileiros relataram ainda que, novamente, a maioria dos passageiros, exceto os que viajavam com crianças, foi trazida algemada pelas mãos e pelos pés.

“A gente veio algemado até agora. Está vendo essas manchas aqui?”, diz Hudson apontando a calça de moletom cinza claro, uniforme nas detenções, com manchas de cor ocre. “Isso aqui é algema enferrujada.”

Pelos relatos ouvidos pela Folha, a maioria dos deportados desta sexta foi detida antes do agravamento da pandemia e acompanhou na detenção a evolução dos casos nos Estados Unidos e no Brasil. Alguns disseram ter sido mantidos em locais com até 60 pessoas.

Maisa Pereira, 20, ficou dez meses esperando a deportação. Ela foi detida junto com o pai, que já havia sido deportado anos antes. Foi dentro dos centros de detenção que ouviram falar sobre as mudanças do lado de fora. “Não tinha álcool em gel, sabão para lavar as mãos”, conta.

A irmã de um conhecido da família, que vive nos EUA, estava à espera dela no aeroporto, segurando um cartaz com seu nome para levá-la para Central de Minas (MG).

Já Wellinton Mendes Pereira, 22, com cerca de R$ 200 e US$ 18 (R$ 105) num saco plástico com pertences, não sabia como voltaria a Machadinho d'Oeste (RO).

Ele viajou no fim de fevereiro atrás do sonho de viver nos EUA. Fez um empréstimo de R$ 31 mil para pagar um coiote que encontrou pela internet, depois que seu visto foi negado.

No local onde estava detido, diz ele, depois de casos de coronavírus serem confirmados, as refeições passaram a ser entregues no dormitório, em embalagens descartáveis, e o banho de sol foi suspenso. O uso das máscaras era controlado pelos guardas por câmera.

Nelson Vicente, 51, tentou correr o risco da travessia em meio à pandemia, há cerca de dez dias. Ele conta que foi deportado em novembro do ano passado, em um voo comercial para o Rio de Janeiro.

Em setembro, havia tentando entrar no país com a mulher e as filhas. Elas conseguiram ficar e por isso ele quis voltar.

“Preocupação [com coronavírus] todo mundo tem. A minha é que minhas filhas, uma de dois anos e outra de cinco, estão no maior leito do coronavírus, que é Washington, e a mãe delas têm que sair para trabalhar”, diz.

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