Gays e transexuais não podem sofrer discriminação no trabalho, decide Suprema Corte dos EUA

Em resultado histórico, tribunal proíbe demissões baseadas em orientação sexual e identidade de gênero

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São Paulo, Washington e Cidade do México | Reuters e AFP

A Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu nesta segunda-feira (15) que homossexuais e transexuais não podem sofrer discriminação no ambiente de trabalho.

A decisão representa uma vitória histórica do movimento LGBT americano, que há anos luta na Justiça para que pessoas não possam ser demitidas ou penalizadas por sua orientação sexual ou identidade de gênero.

Pouco após o anúncio da decisão, homem com a bandeira símbolo do movimento LGBT celebra o resultado em frente à Suprema Corte dos EUA, em Washington
Pouco após o anúncio da decisão, homem com a bandeira símbolo do movimento LGBT celebra o resultado em frente à Suprema Corte dos EUA, em Washington - Jim Watson/AFP

Por seis votos a três, os juízes da Suprema Corte entenderam que um trecho da Lei dos Direitos Civis de 1964 também deve ser aplicada a gays, lésbicas e transexuais.

A legislação proíbe em seu artigo 7º a discriminação em ambientes de trabalho por causa de raça, religião, origem nacional e sexo.

A legislação é um marco na luta contra a segregação e a discriminação no país, mas o uso da palavra "sexo" causou controvérsia e disputas judiciais nas últimas décadas.

Grupos conservadores afirmavam que o termo “sexo” significava apenas que homens e mulheres não podiam sofrer discriminação, mas que a lei não incluía orientação sexual ou identidade de gênero. A atual gestão de Donald Trump também apoiava essa interpretação.

Segundo essa visão, caberia ao Congresso criar uma nova lei para proteger esses grupos de discriminação no trabalho.

Sindicatos e o movimento LGBT, porém, sempre defenderam que a lei de 1964 já incluía a proteção de homossexuais e transexuais, interpretação chancelada pela Suprema Corte nesta segunda.

"Um empregador que demite um indíviduo simplesmente por ele ser gay ou transgênero desafia a lei", diz a decisão do tribunal.

Segundo levantamento do Williams Institute, da Universidade da Califórnia em Los Angeles, existem cerca de 1 milhão de trabalhadores que se identificam como transexuais nos EUA, e 7,1 milhões que se identificam como homossexuais ou bissexuais.

O resultado foi considerado surpreendente porque dois juízes da ala mais conservadora do tribunal —o presidente da corte, John G. Roberts, e Neil M. Gorsuch, um indicado de Trump— se uniram aos quatro integrantes da ala progressista na votação.

“Hoje, precisamos decidir se um empregador pode demitir alguém simplesmente por ser homossexual ou transgênero. A resposta é clara”, escreveu Gorsuch na decisão da maioria.

“Um empregador que demite um indivíduo por ser homossexual ou transgênero demite essa pessoa por características ou ações que não teria questionado em membros de um sexo diferente. O sexo desempenha um papel necessário e indiscutível na decisão, exatamente o que artigo 7º [da lei de 1964] proíbe.”

Na prática, a Suprema Corte tomou a decisão baseada em três casos: dois sobre homens homossexuais que afirmavam terem sido demitidos por causa de sua orientação sexual e um de uma mulher transexual que afirmou ter sido demitida após iniciar sua transição de gênero.

Para Steve Vladeck, professor de direito da Universidade do Texas, a decisão é a mais importante da corte envolvendo os direitos LGBT desde que o tribunal autorizou o casamento entre pessoas do mesmo sexo, em 2015.

Ele afirmou à rede de TV CNN que, embora a decisão se aplique apenas para discriminações em locais de trabalho, sua interpretação permite que grupos recorram à Justiça para que a mesma lógica seja aplicada também em outros ambientes.

De acordo com o New York Times, as instâncias inferiores da Justiça americana tradicionalmente aplicavam uma intepretação mais restrita da lei de 1964, que excluía gays e transexuais.

Mas, nos últimos anos, tribunais em Nova York e em Chicago passaram a incluir esses grupos também na lista de minorias protegidas contra a discriminação. Com as diferentes intepretações pelo país, o assunto chegou até a Suprema Corte.

É a primeira decisão sobre a questão que o tribunal toma desde a aposentadoria em 2018 do juiz Anthony M. Kennedy, que funcionava como uma espécie de fiel da balança entre a ala consevadora e a ala progressista, em especial em temas envolvendo a comunidade LGBT.

Foi ele, por exemplo, que deu o voto decisivo que autorizou o casamento gay.

Com sua saída e substituição pelo conservador Brett Kavanaugh, a correlação de forças dentro do tribunal mudou, e muitos ativistas temiam que a corte passasse a tomar decisões restringindo o direito de minorias.

Kavanaugh foi um dos três juízes derrotados nesta segunda. No texto em que justifica sua posição, ele afirmou que o assunto não deveria ser decidido na Justiça. "Eu acredito que é o papel do Congresso, e não dessa Corte, alterar o artigo 7º", escreveu.

Após o anúncio da decisão, diversas lideranças democratas celebraram o resultado —Trump e os principais nomes republicanos ainda não se pronunciaram sobre o assunto.

"Hoje a Suprema Corte decidiu que nenhum americano LGBTQ pode ser demitido por ser quem é ou por quem ama", escreveu em uma rede social Pete Buttigieg, a primeira pessoa abertamente gay a tentar disputar a Presidência americana.

"Vamos ser uma fonte de esperança e urgência nesses tempos de angústia e expectativa."

Virtual candidato democrata na eleição presidencial de novembro, Joe Biden também elogiou a decisão. "A Suprema Corte confirmou essa ideia simples, mas prfundamente americana, de que todo ser humano deve ser tratado com respeito", disse em um comunicado.

Ele prometeu ainda que se eleito vai aprovar a chamada Lei de Igualdade, uma antiga bandeira LGBT que proibiria a discriminação contra minorias em qualquer circunstância no país.

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