Com multidão de opositores nas ruas, autocrata da Belarus diz que eleições acabariam com o país

Aleksandr Lukachenko discursou na primeira manifestação de apoiadores do governo desde eleição

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Minsk e Moscou | Reuters

Enquanto dezenas de milhares de opositores do governo da Belarus ocupavam as ruas da capital, Minsk, o autocrata Aleksandr Lukachenko afirmou neste domingo (16) que rejeita os pedidos por novas eleições no país e acusou a Otan —o bloco militar liderado pelos EUA— de estar se concentrando na fronteira oeste com a Polônia e Lituânia.

Discursando a um grupo de apoiadores, na primeira manifestação de apoio ao governo após uma semana de protestos diários e greves contra sua contestada vitória nas eleições presidenciais, Lukachenko afirmou que a Belarus "morreria como um Estado se realizasse novas eleições".

"Eu nunca os traí e nunca os trairei", disse, segundo o jornal britânico The Guardian, o autocrata, que está no poder desde 1994. "Se vocês destruírem Lukachenko, será o começo do fim para vocês.”

Neste sábado (15), Lituânia, Letônia e Polônia pediram um novo pleito, depois de a União Europeia afirmar que não reconhece o resultado das eleições e estudar sanções contra o país devido à repressão violenta das manifestações, que deixou dois mortos e milhares de presos. ​

Os protestos antigoverno deste domingo levaram pelo menos 100 mil pessoas às ruas do país, nos maiores atos desde o início da crise.

Com as tradicionais bandeiras vermelhas e brancas —que se tornaram um símbolo da oposição após terem sido substituídas por uma com estética mais soviética com a chegada de Lukachenko ao poder—, os manifestantes levaram às ruas um clima festivo, segundo relatos da Reuters e do New York Times.

Em contraste à tensão dos protestos menores reprimidos violentamente durante a semana, neste domingo a polícia não interveio.

Na cidade de Brest, manifestantes cercaram o centro de detenção e exigiram a libertação de quem havia sido preso nos eventos anteriores. A pressão foi atendida, e eles foram soltos.

Ativistas dizem que há 80 desaparecidos nos atos que não constam nas listas de detidos nem de feridos encaminhados aos hospitais.

Durante a semana, a principal candidata opositora, Svetlana Tikhanovskaia, exilada na Lituânia desde terça-feira (11), pediu o fim da violência policial contra os manifestantes e convocou a população a seguir nas ruas neste fim de semana, realizando neste domingo a chamada "Marcha pela Liberdade".

Nos protestos pró-governo do início do dia, milhares de pessoas seguravam bandeiras bielorrussas e gritavam palavras de ordem como "pela Belarus" e "por Batka", o apelido de Lukachenko entre apoiadores.

Antes da chegada do autocrata ao púlpito, o mestre de cerimônias afirmava que "a pátria está em perigo", enquanto a multidão cantava "nós estamos unidos, indivisíveis".

"Eu sou pró-Lukachenko", disse Alla Georgievna, 68, à agência Reuters. "Eu não entendo por que todo mundo se voltou contra ele. Nós recebemos nossas pensões e salários em dia graças a ele."

Durante a semana, o autocrata vinha oscilando entre o apoio russo ao resultado das eleições e o apoio europeu contra a pressão russa. Após conversar com presidente russo, Vladimir Putin, no entanto, Lukachenko indica ter pendido a balança para o lado russo.

Aos manifestantes disse que tropas da Otan estariam nas "portas" da Belarus e que aviões e tanques estariam a 15 minutos da fronteira bielorrussa. A Rússia e a Belarus confimaram que, na conversa por telefone no sábado, Putin confirmou que o Kremlin está pronto para oferecer ajuda militar, se necessário.

Os países têm um acordo celebrado em 1999 de fusão política e econômica, mas que nunca foi totalmente implementado, por resistência bielorrussa.

Até este sábado, Putin havia dado um apoio frio a Lukachenko, a quem tem como um inconveniente aliado, dada a habilidade do bielorrusso de extrair vantagens de Moscou.

Ele oferta em troca uma área não ocidental separando a Rússia das forças ocidentais da Otan. E toda uma infraestrutura de gasodutos e oleodutos dos tempos em que tudo aquilo era a União Soviética, por onde passam um quinto do gás e um quarto do petróleo russos para a Europa.

A Otan afirmou que acompanha de perto a situação no país, mas negou que estivesse ampliando operações militares na fronteira. "A presença multinacional da Otan na parte oriental da aliança não é uma ameaça a qualquer país", disse em nota a porta-voz do bloco militar, Oana Lungescu.

Segundo ela, a aliança "é estritamente defensiva, proporcional e designada a prevenir conflitos".

Em uma escalada na retórica, Lukachenko afirmou que uma brigada de assalto aéreo estava sendo deslocada para a fronteira com a Polônia. Segundo a agência de notícias russa RIA, o ministro da Defesa bielorruso afirmou que o país irá realizar exercícios militares entre segunda (17) e quinta-feira (20) na região de Grodno, próximo à usina nuclear do país e à tríplice fronteira com a Polônia e a Lituânia.

A Lituânia afirmou que não representa uma ameaça à Belarus.

"A crise da Belarus é política, e quaisquer alegações das lideranças bielorrussas sobre a interferência de países estrangeiros ou ameaças que eles representariam são tentativas de desviar a culpa e justificar suas ações", disse o ministro da Defesa lituano, Raimundas Karoblis.

A Lituânia realizou exercícios militares entre 2 e 14 de agosto, com 1.100 tropas nacionais e 200 soldados e 10 helicópetros militares americanos vindos da Polônia, segundo um porta-voz militar lituano.

Neste sábado, o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, viajou a Varsóvia para um encontro com autoridades polonesas, durante turnê pela Europa Central. Pompeo afirmou que os EUA estão discutindo a crise com a União Europeia para "tentar ajudar o povo bielorrusso a conquistar soberania e liberdade".

No mês passado, Washington e Varsóvia assinaram um pacto de defesa, que aumenta o número de tropas americanas no país europeu para ao menos 5.500. O acordo também envolve a possibilidade de mais tropas americanas serem alocadas na Polônia em caso de aumento de ameaças.

Neste domingo, o papa Francisco mencionou a situação bielorrussa, pediu justiça e afirmou que seus pensamentos estão com a "querida Belarus". "Apelo por diálogo, pela recusa à viôlencia e pelo respeito à justiça e aos direitos", disse o pontífice.

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