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Apuração em Uganda indica vitória de ditador em meio a censura e acusações de fraude

Museveni está mais próximo de garantir sexto mandato no poder; seu rival denuncia manipulação

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Campala | Reuters

Com quase 40% das urnas apuradas em Uganda, o ditador Yoweri Museveni, 76, aparece com 62,2% dos votos —o equivalente a mais de 4 milhões de cédulas depositadas na votação de quinta-feira (14).

Seu principal adversário, Robert Kyagulanyi Ssentamu, 38, conhecido como Bobi Wine depois de uma carreira como cantor pop, recebeu até o momento 30,6% dos votos, de acordo com os números divulgados pela Comissão Eleitoral de Uganda.

Yoweri Museveni, 76, no comando de Uganda há 35 anos, acena depois de votar em eleição presidencial - Badru Katumba - 14.jan.21/AFP

As contagens apontam para mais uma vitória de Museveni, que está no poder há 35 anos e tenta garantir seu sexto mandato no comando de Uganda. Mas a violência que marcou todo o período eleitoral e os relatos de repressão e censura contra Wine colocam em xeque a legitimidade do processo.

"Estamos sitiados. Os militares pularam a cerca e agora assumiram o controle de nossa casa", escreveu Wine em seu perfil no Twitter na manhã desta quinta, horas depois de quase 18 milhões de ugandenses irem às urnas para escolher seu líder. "Nenhum desses invasores militares está falando conosco. Estamos com sérios problemas. Estamos sob cerco", acrescentou o opositor.

A polícia metropolitana de Campala, capital de Uganda, disse que o bloqueio ao redor do condomínio onde Wine mora é, na verdade, uma operação para garantir sua segurança.

"Simplesmente aumentamos nosso contingente no bairro para a própria segurança dele. Não estamos lá para prendê-lo, e ele não está preso", disse o porta-voz da polícia, Luke Owoyesigyre.

Outro porta-voz, das Forças Armadas, afirmou que não houve invasão de militares no condomínio. Segundo Deo Akiiki, o que aconteceu foi uma intervenção de oficiais de segurança para prender três intrusos que tentaram entrar na propriedade.

Mais cedo, durante entrevista coletiva em frente à sua casa, Wine disse estar confiante de que derrotou o ditador com folga e afirmou que a apuração dos votos é a pior manipulação que o país já experimentou.

“Museveni está se esforçando muito para pintar um quadro em que ele está na liderança. Que piada”, disse, acrescentando que a Comissão Eleitoral, as instituições estatais e alguns meios de comunicação estão "descaradamente tentando usurpar a vontade do povo".

"Estamos colocando todas as opções legais, constitucionais e não violentas na mesa", afirmou. "Terei o prazer em compartilhar vídeos de todas as fraudes e irregularidades assim que a internet for restaurada."

Às vésperas da votação, Museveni proibiu plataformas como Facebook, Twitter e WhatsApp e, depois, bloqueou empresas de telecomunicações, o que gerou um "apagão" na internet do país.

Os atos, segundo o próprio Museveni, foram uma resposta ao banimento feito pelo Facebook, na segunda-feira (11), de uma rede de contas ligadas ao Ministério da Informação de Uganda. Segundo a rede social, os perfis eram falsos e tentavam manipular o debate público e influenciar as intenções de voto.

Museveni até se desculpou pelas inconveniências causadas pelo bloqueio, mas disse que não teve escolha depois que a empresa de Mark Zuckerberg suspendeu contas que apoiavam seu partido, o Movimento de Resistência Nacional (NRM, na sigla em inglês). "Se você quer escolher um lado contra o NRM, então esse grupo [Facebook] não deveria operar em Uganda", disse o ditador. "Não podemos tolerar esta arrogância de alguém que venha decidir por nós quem é bom e quem é mau."

Simon Byabakama, presidente da Comissão Eleitoral, procurou garantir aos ugandeses que os resultados estavam chegando ao centro de contagem nacional, apesar do apagão da internet.

“Não estamos usando a internet local para transmitir nossos resultados, estamos usando nosso próprio sistema”, afirmou, sem dar detalhes. "Não se preocupe, os resultados virão."

Como líder do órgão que Wine acusa de parcialidade na apuração, Byabakama disse ainda que a legislação do país determina que cabe ao opositor o ônus da prova sobre as alegadas irregularidades.

"A responsabilidade recai sobre o candidato Kyagulanyi para mostrar ou provar em que contexto e como os resultados são manipulados", disse ele.

A maior parte dos observadores internacionais não enviou representantes a Uganda após terem credenciais negadas por autoridades locais, o que reforça argumentos de falta de transparência no pleito.

"Sem a participação robusta de observadores, particularmente observadores de Uganda que respondem perante seus cidadãos, as eleições não terão a responsabilidade, a transparência e a confiança que as missões de observação fornecem", disse a embaixada dos EUA em Uganda na última quarta-feira (13).

A União Europeia, que também teve autorizações negadas, disse que o processo eleitoral foi seriamente manchado pelo uso excessivo da força. Uma coalizão que representa centenas de organizações da sociedade civil de Uganda afirmou ter registrado 1.900 pedidos de credenciamento, mas apenas 10 foram concedidos. Entidades como a União Africana e a Comunidade do Leste Africano enviaram observadores ao país, mas não se posicionaram publicamente sobre as acusações de irregularidade.

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