Promotor dos EUA diz que presidente de Honduras ajudou a levar drogas ao país

Em julgamento de traficante em NY, Juan Orlando Hernández é ligado ao caso; não há acusação formal

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Nova York | AFP

No julgamento de Geovanny Fuentes por tráfico de drogas para os EUA, o promotor americano Jacob Gutwillig acusou o presidente de Honduras, Juan Orlando Hernández, de ajudar a levar quilos de cocaína ao país.

Nas alegações iniciais feitas nesta terça-feira (9) a um júri em Nova York, Gutwillig disse que Fuentes subornou políticos, militares, policiais e “até o presidente de Honduras”. Essa associação o tornou intocável e fez seus negócios ilegais florescerem, afirmou a promotoria.

O presidente de Honduras, Juan Orlando Hernández, durante sessão do Congresso do país
O presidente de Honduras, Juan Orlando Hernández, durante sessão do Congresso do país - Presidência de Honduras - 24.fev.21/AFP

Segundo o caso apresentado, o acusado pagou em 2013 e 2014 subornos de US$ 25 mil (cerca de R$ 145 mil, na cotação atual) em espécie com dinheiro do tráfico ao atual presidente em troca de proteção e acesso ao laboratório da droga de Fuentes, nas montanhas de Honduras.

Nesse local, de acordo com a promotoria, eram produzidas centenas de quilos de cocaína por mês. Um quilo da droga rende 8.000 doses individuais e é vendido por US$ 30 mil (cerca de R$ 174 mil) em Nova York, afirmou o Gutwillig. Ele acrescentou que, com a colaboração da polícia, das Forças Armadas e de políticos hondurenhos, o acusado realizava o transporte livremente até o norte do país.

Fuentes e Hernández planejavam enviar o máximo de cocaína possível aos EUA, disse o promotor.

Segundo Gutwillig, um contador identificado como José Sánchez, que trabalhava para uma empresa de arroz com a qual Fuentes lavava dinheiro e estava presente nessas reuniões, irá contar ao júri ao longo do julgamento “o choque e o medo que sentiu quando viu o acusado sentar-se com o presidente”.

Sánchez deve ainda relatar que o presidente disse a Fuentes “que levaria tanta cocaína para os Estados Unidos que 'meteriam as drogas pelos narizes dos gringos'”. Para o promotor, o acusado “fazia parte do narco-Estado hondurenho”, e “o presidente o tornou à prova de balas”.

Para contra-atacar as acusações, o advogado da defesa, Eylan Schulman, tentou descreditar o depoimento do contador em seus argumentos iniciais. Segundo ele, Sánchez tem muito a ganhar e pouco a perder com seu depoimento, acrescentando que a testemunha espera receber asilo nos EUA.

Schulman também tentou diminuir a importância do suposto valor pago ao mandatário hondurenho. “Supostamente, US$ 25 mil são o suficiente para subornar um presidente”, afirmou.

A defesa também disse ao júri que não deve acreditar no depoimento que será prestado por quem chamou de “um dos piores assassinos na face da Terra”. Leonel Rivera, ex-líder do cartel hondurenho Los Cachiros, que matou 78 pessoas, está preso nos EUA por tráfico de drogas.

“O governo [dos EUA] concordou em fazer um acordo com esse demônio [...] Nunca se deve acreditar nele", disse Schulman, que defendeu o papel do governo Hernández no combate ao narcotráfico.

Apesar de os promotores considerarem o presidente de Honduras um co-conspirador de Fuentes no envio de toneladas de drogas aos EUA, Hernández não foi indiciado pela Justiça americana.

Seu irmão, Tony Hernández, foi declarado culpado por tráfico de drogas “em grande escala” em Nova York, em outubro de 2019, e sua sentença, adiada várias vezes, está prevista para 23 de março. Ele pode ser condenado a prisão perpétua. Os promotores afirmam que Tony era o intermediário entre Fuentes e o presidente de Honduras.

A primeira testemunha do julgamento foi o agente Brian Fairbanks, da agência americana de combate às drogas (DEA, na sigla em inglês), que confirmou ao júri que encontrou no celular do acusado o email e o número de celular de Juan Orlando Hernández.

A acusação mostrou ao tribunal fotos do irmão e do filho de Fuentes com o presidente encontradas no telefone do réu, assim como fotos de várias armas no iCloud (sistema de armazenamento em nuvem da Apple) de um dos filhos de Fuentes. Uma delas continha um fuzil automático oferecido como presente ao presidente com a inscrição “JOH, presidente da República” acima do gatilho.

Fuentes foi preso em Miami, na Flórida, em 1º de março de 2020 e enfrenta três acusações de tráfico de drogas e porte de arma de fogo.

O presidente de Honduras, que assumiu o cargo em 2014 e está em seu segundo mandato, nega todas as acusações e se apresenta como um herói na luta contra o narcotráfico e as gangues violentas que espalham o terror no país.

Nesta segunda (8), ele afirmou no Twitter que as testemunhas que o acusam darão falsos testemunhos para se vingar por sua luta contra o narcotráfico e reduzir suas penas de prisão nos Estados Unidos.

Ele alertou que “se os traficantes com a chave mágica da mentira obtiverem benefícios dos EUA por meio de falsos depoimentos, a aliança internacional com Honduras entrará em colapso”. Durante o julgamento de Tony Hernández em Nova York, testemunhas também disseram que o ex-presidente hondurenho Porfirio Lobo (2010-2014) havia recebido propina de traficantes de drogas em troca de proteção.

O filho de Lobo, Fábio, foi condenado em 2017, também em Nova York, a 24 anos de prisão por narcotráfico.

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