Descrição de chapéu The New York Times Folhajus

11 dos 12 jurados do caso Floyd estavam prontos para condenar ex-policial no início da deliberação

Depoimento de jurado relata a discussão que levou ao veredicto final contra Derek Chauvin

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Nicholas Bogel-Burroughs
The New York Times

Sentados num salão de conferências de um hotel, diante de mesas distantes dois metros umas das outras, 12 jurados rabiscaram bilhetes sobre folhas de papel para indicar seus pensamentos sobre uma acusação de homicídio feita a Derek Chauvin, o ex-policial de Minneapolis que estava sendo julgado pela morte de George Floyd.

Quando o presidente do júri contabilizou os votos naquela manhã, recordou um dos jurados, 11 dos papéis traziam a letra G —“guilty”, ou culpado. Um dos papéis dizia “U”, indicando que o jurado estava em dúvida.

Manifestantes levantam o punho em ato após Derek Chauvin ser considerado culpado pela morte de George Floyd
Manifestantes levantam o punho em ato após Derek Chauvin ser considerado culpado pela morte de George Floyd - Elijah Nouvelage/AFP

Os cinco homens e as sete mulheres passaram as horas seguintes debruçados sobre as evidências apresentadas em um dos julgamentos acompanhados com mais interesse em uma geração. A descrição é de Brandon Mitchell, o único jurado a falar publicamente sobre como foram as deliberações do júri na semana passada perto de Minneapolis.

Mitchell disse que os jurados assistiram aos vídeos explícitos da morte de Floyd, discutiram os depoimentos de muitas das testemunhas e dos peritos e criaram sua própria linha do tempo com a ajuda de uma lousa. Na hora do almoço, disse Mitchell, a jurada que se dissera em dúvida, uma mulher branca, já tinha tomado posição: Chauvin era culpado de todas as acusações.

Treinador de basquete numa escola secundária, Mitchell, 31, descreveu as deliberações em entrevista que deu na quinta-feira (29), lançando luz sobre o que aconteceu dentro da sala do júri antes de os jurados condenarem Chauvin por duas acusações de homicídio e uma de homicídio culposo.

Mitchell contou que ficou empolgado quando foi selecionado para fazer parte do júri e satisfeito ao ver que o júri era diversificado: havia quatro jurados negros, incluindo ele próprio, seis brancos e dois multirraciais. Tinham idades entre 20 e 60 anos, aproximadamente.

“Eu abracei a pressão”, disse Mitchell. “Fosse qual fosse o veredito —culpado ou não culpado—, era importante para mim, como negro, fazer parte daquele júri.”

Mitchell disse que, antes do julgamento, pensou que teria dificuldade em chegar à decisão certa sobre o caso, mas que após três semanas de depoimentos, achou as evidências esmagadoras.

“Não senti dúvida nenhuma”, disse ele, falando de sua decisão de pronunciar Chauvin culpado. Os jurados discutiram o caso por cerca de sete horas, ao longo de dois dias, até chegarem a um veredito na tarde de 20 de abril. Segundo Mitchell, eles passaram boa parte da primeira noite de deliberações conhecendo uns aos outros melhor, e não tanto falando sobre o caso.

Chauvin, o policial branco que foi filmado em maio do ano passado ajoelhado sobre o pescoço do segurança negro George Floyd por mais de nove minutos, será sentenciado em junho e pode enfrentar décadas na prisão.

Imediatamente após os argumentos finais no julgamento, em 19 de abril, os jurados se reuniram numa sala de conferências no hotel onde estavam hospedados sem contato com o mundo externo. Mitchell contou que eles entregaram seus telefones e só os recuperaram após as decisões. Fizeram uma votação para decidir se ficariam de máscara durante as deliberações (e optaram por unanimidade por tirá-las) e pouco depois começaram a discutir as evidências e a lei.

Primeiro eles avaliaram a acusação de homicídio doloso em segundo grau, a acusação menos grave das que Chauvin enfrentou. Segundo Mitchell, a jurada que mais tarde indicaria estar na dúvida quanto ao homicídio se disse incerta quanto à acusação de homicídio doloso.

Sentados diante de mesas individuais dispostas em formato de U, os jurados se revezaram para apresentar suas reflexões. Eles decidiram esperar até o segundo dia de deliberações para discutir as acusações de homicídio, mas, como seu jantar só chegou algumas horas mais tarde, passaram a bater papo sobre outros assuntos, falando de seus empregos e seus filhos.

George Floyd, 46, foi asfixiado e morto por um policial em Minneapolis, nos EUA
George Floyd, 46, foi asfixiado e morto por um policial em Minneapolis, nos EUA - Reprodução/Twitter

Às 6h45 da manhã seguinte, agentes bateram às portas de cada um de seus quartos de hotel para despertá-los para o café da manhã e um segundo dia de deliberações.

Mitchell contou que, quando os jurados estudaram as acusações de homicídio, em dado momento se detiveram sobre a causa exata da morte de Floyd. Muitos dos jurados disseram que acreditavam na versão da promotoria sobre o que acontecera —que o joelho de Chauvin causara a morte de Floyd—, mas pelo menos uma jurada a favor da condenação disse que não podia ter certeza de que a causa tinha sido o joelho de Chauvin.

Mesmo assim, recordou Mitchell, a jurada disse que considerava o ex-policial responsável pela morte porque ele continuou a manter Floyd dominado no chão, mesmo depois de ele ter perdido consciência, e em momento algum lhe prestou assistência médica.

Após algumas horas de discussões sobre a acusação de homicídio em terceiro grau, todos os jurados se disseram a favor da condenação, disse Mitchell. E, depois de mais meia hora, todos concordaram em condenar Chauvin também por homicídio em segundo grau.

Os jurados decidiram aguardar até depois do almoço para preencher os formulários que oficializariam sua decisão. “Não queríamos apressar as coisas”, explicou Mitchell. “Demos um tempo para absorver tudo e dizer ‘é isto aqui que vamos fazer’.”

Pouco antes das 14h eles alertaram agentes de justiça que haviam chegado a um veredito. Então foram conduzidos imediatamente do hotel ao tribunal, onde o juiz Peter A. Cahill leu o veredito.

Mitchell disse que para muitos dos jurados, incluindo ele próprio, o depoimento mais convincente foi dado pelo pneumologista Martin J. Tobin, que identificou o que disse ser o momento exato quando George Floyd teve sua derradeira respiração. “Ele comandou nossa atenção 100%”, disse Mitchell, falando de Tobin, que depôs para a promotoria. “Acho que nenhuma outra testemunha nos convenceu tanto.”

Mitchell disse que achou os argumentos da defesa fracos, carecendo de depoimentos reveladores que pudessem trazer à tona inconsistências nos argumentos da promotoria.

“Eu estava esperando algum momento que marcasse um clímax —um momento tipo ‘uau! ahá!’ ou alguma coisa do tipo—, mas isso não aconteceu”, disse Mitchell. “Não houve nada que nos tivesse convencido ou surpreendido. Foi uma espécie de anticlímax. Com isso, a decisão foi fácil.”

Tradução de Clara Allain

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