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Guerra da Ucrânia

Estratégia dos EUA em conflito com Rússia visa a bloquear narrativas contraditórias

'Quando começa uma guerra, a primeira vítima é a verdade', dizia um senador; às vezes, a mentira aparece mesmo antes

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Moises Rabinovici

Jornalista, foi correspondente no Oriente Médio, nos Estados Unidos e na França

São Paulo

O presidente Joe Biden revelou, até a véspera da guerra russo-ucraniana, uma arma jamais usada pelos Estados Unidos: a verdade, segundo seus serviços de inteligência.

Disparando denúncias do que o presidente Vladimir Putin pretendia fazer, antes que o fizesse, ele o desarmou em alguns momentos. É o que pode ter acontecido com um vídeo em que soldados russos apareceriam feridos ou mortos por ucranianos, estopim para começar a guerra dias atrás.

Espiões e serviços de inteligência militar não simpatizaram com a estratégia de transparência adotada pela Casa Branca. Afinal, são secretos, vivem à sombra. Até recentemente, para que uma revelação fosse divulgada, levava tempo, com censores eliminando detalhes comprometedores e altas patentes do Pentágono pesando possíveis consequências.

O presidente dos EUA Joe Biden em pronunciamento na Casa Branca - Brendan Smialowski - 22.fev.22/AFP

O presidente Biden agilizou o processo. Os jornais americanos estão ganhando acesso a fotos de satélite e informações sobre movimento de tropas russas desde novembro.

Putin é um veterano espião da KGB soviética, dado a laivos teatrais. Nesta semana, ele passou uma descompostura pública em seu chefe de inteligência no exterior, que titubeou ao responder "sim" à ideia de reconhecer a independência das autoproclamadas repúblicas separatistas pró-Rússia de Donetsk e Lugansk.

Depois, com a aprovação unânime de seus ministros, falou aos russos, pela TV, que os EUA e seus aliados estavam usando a Ucrânia "como um instrumento de confrontação com a Rússia". E prometeu "desnazificar" a Ucrânia, que é presidida por um judeu, Volodimir Zelenski.

"Quando começa uma guerra, a primeira vítima é a verdade", dizia o senador americano Hiram Johnson. Às vezes, a mentira aparece mesmo antes —as "armas de destruição de massa" de Saddam Hussein foram o prelúdio da invasão do Iraque, e nunca as encontraram. Se fossem contados quantos aviões o Iraque e o Irã diziam ter abatido um do outro, na guerra de 1980, não sobraria mais força aérea no mundo.

A "desclassificação" (downgrading) de informações secretas do cerco das tropas russas à Ucrânia, distribuídas rapidamente para a Otan e aliados europeus, pode ter complicado os planos de Putin para uma invasão.

Ele não estava preparado para a verdade retratada por satélites. Tentou, simulando um início de retirada de seus tanques e mísseis para os quartéis, mas foi desmentido.

A nova estratégia dos EUA impede a criação de narrativas contraditórias que encobriram a queda do avião da Malaysia Airlines, em que morreram 298 passageiros, abatido por um míssil russo disparado de uma região separatista pró-Rússia na Ucrânia, como concluiu uma investigação feita pela Holanda e pelo site de jornalismo investigativo Bellingcat, muito tempo depois.

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