Papa critica Putin e diz que planeja viajar a Kiev em meio à guerra

Ucrânia afirma que retomou controle de cidades no entorno da capital e tenta, mais uma vez, retirar civis de Mariupol

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São Paulo

O papa Francisco, chefe da Igreja Católica, fez neste sábado (2) sua primeira crítica direta ao presidente russo, Vladimir Putin, ainda que sem citar o nome do mandatário que ordenou a invasão da Ucrânia em 24 de fevereiro. O pontífice ainda afirmou que considera viajar à capital do país, Kiev, em meio à guerra.

"Mais uma vez, um poderoso, apanhado em reivindicações anacrônicas de interesses nacionalistas, está provocando e fomentando conflitos, enquanto as pessoas comuns querem construir um futuro", afirmou, em discurso às autoridades da ilha de Malta, onde chegou para uma visita de dois dias.

Homens caminham pelas ruas de Butcha, cidade nos arredores de Kiev retomada pelos ucranianos; corpos estão espalhados pelas vias públicas - Ronaldo Schemidt - 2.abr.22/AFP

O papa já havia condenado o que chamou de "agressão injustificada" e denunciou as atrocidades da guerra, mas ainda não havia se referido de forma tão incisiva a Putin.

"Pelo leste da Europa, pela terra onde o sol nasce, as sombras escuras da guerra agora se espalharam. Nós achávamos que invasões de outros países, batalhas selvagens pelas ruas e ameaças atômicas eram lembranças sombrias de um passado distante", disse Francisco.

"No entanto, os ventos gelados da guerra, que trazem apenas morte, destruição e ódio em seu rastro, varreram poderosamente a vida de muitas pessoas e afetaram a todos nós", completou.

Mais cedo, respondendo a repórteres, ele afirmou que estuda aceitar o convite do presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, e viajar a Kiev.

Em vídeo publicado no começo da manhã deste sábado, Zelenski disse que tropas russas estão se movendo para a região do Donbass, na porção leste do país, após deixarem os arredores da capital.

As cidades de Irpin, Butcha e Hostomel, importantes artérias para chegar a Kiev e outrora intensos campos de batalha, teriam sido retomadas pelos ucranianos, que encontraram cenas de devastação nas ruas.

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha faz neste sábado mais uma tentativa de retirar civis da cidade de Mariupol, após uma operação frustrada na sexta (1º), que precisou ser abortada dada a grave situação dos confrontos na cidade do sul da Ucrânia.

Sitiada desde os primeiros dias da invasão russa, a cidade portuária fica na província de Donetsk e é considerada estratégica para bloquear o acesso ucraniano ao mar. A cidade enfrenta uma das situações humanitárias mais graves da guerra, com dezenas de milhares de pessoas sem acesso a comida, água, energia e medicamentos.

Rússia e Ucrânia concordaram em abrir corredores humanitários para facilitar a retirada de civis, mas se acusam de não respeitar o cessar-fogo que permitiria a passagem de moradores. Desta vez, a expectativa era levar os civis até Berdiansk, outra cidade portuária ao sul, e de lá eles tomariam ônibus para outras regiões.

Em outras regiões do país, informou a vice-primeira-ministra Irina Vereschunk, 4.217 pessoas foram retiradas ao longo do dia.

Segundo Zelenski, houve fortes bombardeios em Kharkiv, no nordeste do país. A agência Reuters conversou com duas jovens em um hospital na cidade de Tchuhuiv, que se disseram sobreviventes de um ataque a um ônibus que levava 20 civis.

"As janelas começaram a balançar. Então eu vi alguma coisa que lembrava buracos. E aí começaram a voar balas acima de nós. Poeira, fumaça. Eu estava gritando e minha boca estava cheia [de fumaça]", disse Alina Sheguret, apontando para machucados nas pernas e no quadril. A Rússia nega, reiteradamente, atacar civis na Ucrânia.

Os números mais atualizados das Nações Unidas indicam que 1.325 civis morreram em todo o país desde o início da invasão russa e outros 2.017 ficaram feridos, embora as cifras sejam reconhecidamente subnotificadas. Pelo menos 4,1 milhões de pessoas já deixaram o país —a maioria com destino à Polônia (2,4 milhões) e à Romênia (629 mil).

O serviço de inteligência do Reino Unido, que tem monitorado as movimentações de tropas na guerra, afirmou que tropas russas abandonaram o aeroporto de Hostomel, nos arredores da capital ucraniana, palco de confrontos desde o primeiro dia do conflito.

Também disse que forças ucranianas continuam a avançar sobre regiões ao redor de Kiev, onde as tropas russas começam a deixar o fronte e a abandonar equipamentos militares, como tanques.

Depois de não conseguir tomar o controle de nenhuma grande cidade ucraniana, a Rússia afirmou que mudou o foco da sua "operação militar especial", como Moscou chama a invasão, para o sudeste da Ucrânia, onde apoia separatistas desde 2014.

O país de Putin afirma que a retirada de tropas da região de Kiev é um gesto de boa vontade para contribuir para as negociações de paz, mas ucranianos e aliados afirmam que as forças russas foram forçadas a se reagrupar em outras regiões depois de sofrerem fortes perdas.

Zelenski disse, sem apresentar evidências, que as forças inimigas têm espalhado minas terrestres à medida que desmobilizam suas tropas —informação que não pôde ser confirmada de forma independente. Segundo a inteligência britânica, os ucranianos conseguiram estabelecer uma rota segura até a cidade de Kharkiv.

Nas primeiras horas deste sábado, mísseis russos atingiram duas cidades na região central do país, Poltava e Kremenchuk, disse o administrador da província de Poltava. Segundo ele, os ataques atingiram edifícios residenciais e infraestruturas da cidade, mas não houve registro de mortos.

A administração de Dnipro também afirmou que ataques com mísseis atingiram infraestruturas da cidade e feriram duas pessoas. O Ministério da Defesa da Rússia assumiu a autoria da ação e disse que o objetivo era usar os projéteis de alta precisão para desmobilizar rotas aéreas militares.

Enquanto os confrontos se desenrolam, a guerra tem vitimado também jornalistas, e neste sábado o governo confirmou a morte de um fotógrafo e documentarista ucraniano que estava desaparecido há quase três semanas. Maks Levin havia sido visto pela última vez em 13 de março, na zona de conflito na região de Kiev, e seu corpo foi encontrado na sexta, segundo o governo.

De acordo com a ONG ucraniana Instituto de Comunicação de Massas, com base em informações da promotoria do país, o jornalista estava desarmado e foi morto após ser atingido por dois tiros.

Levin colaborava com a Reuters desde 2013. "Sua morte é uma grande perda para o mundo do jornalismo. Nossos pensamentos estão com sua família neste momento difícil", disse John Pullman, editor global de recursos visuais da agência americana.​

Com Reuters

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