Descrição de chapéu The New York Times

Covid nos EUA leva a maior queda da expectativa de vida em quase um século

Revés histórico é mais grave entre minorias e simboliza efeito demográfico da pandemia

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Roni Caryn Rabin
Nova York | The New York Times

A expectativa média de vida nos Estados Unidos caiu vertiginosamente em 2020 e 2021, o declínio mais acentuado em dois anos em um período de quase um século —e um sério lembrete do preço cobrado pela contínua pandemia de coronavírus.

Em 2021, o americano médio podia esperar viver até os 76 anos, informaram pesquisadores nesta quarta (31). O número representa uma perda de quase três anos em relação a 2019.

Homem carrega caixão para dentro de caminhão
Funcionário de hospital transfere cadáver para um caminhão funerário em Los Angeles, nos EUA - Isadora Kosofski - 21.jan.22/The New York Times

A redução foi particularmente acentuada entre nativos americanos e do Alasca, segundo o Centro Nacional de Estatísticas de Saúde. A expectativa média de vida nesses grupos foi reduzida em quatro anos só em 2020. O declínio cumulativo desde o início da pandemia, mais de 6,5 anos em média, baixou a expectativa de vida para 65 anos entre os nativos —essa era a expectativa média no país em 1944.

Em 2021, a redução da expectativa de vida foi mais acentuada entre brancos do que entre negros, que tiveram maiores declínios no primeiro ano da pandemia.

Embora a pandemia tenha impulsionado o declínio, o aumento nas mortes acidentais e por overdose de drogas também teve peso, assim como óbitos por doenças cardíacas, hepáticas crônicas e cirrose.

Até agora, os especialistas estavam acostumados variações de meses, não anos, na expectativa de vida. "Mesmo pequenos declínios, de um ou dois décimos de ano, significam que, em nível populacional, muitas pessoas mais estão morrendo prematuramente", diz Robert Anderson, chefe de estatísticas de mortalidade do NCHS. "Isso indica um enorme impacto na população em termos de mortalidade."

Steven Woolf, diretor emérito do Centro de Sociedade e Saúde da Universidade Virginia Commonwealth, caracterizou a diminuição da expectativa de vida nos EUA como histórica. Enquanto outros países de alta renda também foram duramente atingidos em 2020, a maioria começou a se recuperar no ano passado, segundo ele.

"Nenhum experimentou uma queda contínua como os EUA, e um bom número deles viu a expectativa de vida começar a voltar ao normal. Os EUA são claramente uma exceção", afirma, citando que esses países tiveram campanhas de vacinação mais bem-sucedidas e populações mais dispostas a adotar medidas comportamentais para prevenir infecções, como o uso de máscara.

Mas a Covid não foi a única culpada. Antigos problemas de saúde —enraizados na pobreza, na discriminação e na falta de acesso a saúde— deixaram os nativos americanos e do Alasca particularmente vulneráveis, segundo Ann Bullock, ex-diretora do Serviço de Saúde Indígena e membro da tribo Chippewa, de Minnesota.

Um em cada sete nativos tem diabetes, a taxa mais alta entre grupos étnicos nos EUA, e muitos lutam contra a obesidade —condições que tornam as pessoas mais suscetíveis à Covid grave. "Não há dúvida de que a doença contribuiu para o aumento da mortalidade, mas não iniciou esses problemas; piorou muito tudo."

A expectativa de vida média dessas populações é hoje "menor que a de todos os países das Américas, exceto o Haiti, o que é surpreendente", diz Noreen Goldman, professora de demografia da Escola de Relações Públicas e Internacionais de Princeton.

A queda contínua foi ainda mais perturbadora porque ocorreu após uma campanha de vacinação bem-sucedida. "A população nativa se saiu muito bem nesses esforços, isso nos fez sentir que 2021 não seria tão devastador quanto 2020", diz. "Isso foi errado, e é muito difícil de engolir."

Os americanos brancos viram o segundo maior declínio na expectativa de vida média em 2021, uma queda de um ano, de 77,4 em 2020 para 76,4 em 2021. O declínio foi mais acentuado do que entre os negros, em sete décimos de ano, seguido pelos hispânicos, cuja expectativa de vida caiu apenas dois décimos em 2021.

Mas tanto negros quanto hispânicos foram duramente atingidos em 2020. A expectativa média de vida dos hispano-americanos caiu 4 anos, de 81,9 em 2019 para 77,9. O número para os negros diminuiu quase tanto, em mais de 3 anos, para 71,5, em 2020.

Os brancos experimentaram o menor declínio no primeiro ano da pandemia, queda de 1,4 ano, de 78,8 para 77,4. Para brancos e negros, a expectativa é agora a mais baixa desde 1995. Os americano-asiáticos detinham a maior expectativa de vida entre os grupos incluídos na nova análise: 83,5 anos, em média, número que caiu ligeiramente, a partir de de 83,6 em 2020.

Essa foi a maior redução na expectativa de vida nos EUA desde o início da década de 1920, quando a expectativa de vida caiu para 57,2 em 1923. A queda pode estar relacionada às altas taxas de desemprego e suicídio durante uma recessão anterior, assim como um aumento acentuado da mortalidade entre homens e mulheres não brancos.

Embora o sistema de saúde do país esteja entre os melhores do mundo, os americanos sofrem com o que os especialistas veem como um amálgama de influências que corroem o bem-estar. Segundo Woolf, isso inclui um sistema de saúde fragmentado e com fins lucrativos; má alimentação e falta de atividade física; e fatores de risco generalizados, como tabagismo, acesso a armas, pobreza e poluição. Os problemas para grupos marginalizados são agravados pelo racismo e pela segregação.

"O resultado é uma alta carga de doenças entre os americanos e uma expectativa de vida menor em comparação com países de alta renda nas últimas duas décadas."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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