Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia Rússia

Putin sobe tom contra Ocidente e culpa Ucrânia pela guerra

Presidente da Rússia afirma que invasão do país vizinho é desfecho de crise iniciada em 2014 com a anexação da Crimeia

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Vladivostok (Rússia) | Reuters

O presidente russo, Vladimir Putin, intensificou seus ataques ao Ocidente e atribuiu à Ucrânia a responsabilidade pela guerra em um fórum econômico em Vladivostok, cidade portuária no extremo leste do país, nesta quarta-feira (7).

O evento, que dura quatro dias, tem como objetivo reforçar os vínculos entre a Rússia e seus vizinhos asiáticos —a grande aposta do Kremlin para driblar as sanções impostas pelo Ocidente em retaliação ao conflito e reestruturar seu comércio exterior.

O presidente russo Vladimir Putin discursa no Fórum Econômico Oriental, em Vladivostok - Serguei Bobiliov - 7.set.22/Tass/AFP

Em seu discurso, Putin declarou que isolar Moscou "é impossível, não importa o quanto alguns tentem". E, numa das falas mais agressivas do pronunciamento, descreveu o que chamou de febre de sanções imputadas a seu país por nações europeias e pelos Estados Unidos como uma "tentativa descarada e agressiva" de interferir na soberania russa.

"Os países ocidentais se esforçam para manter uma ordem mundial obsoleta que só é benéfica para eles, forçando todos a viverem segundo as regras infames que eles mesmos inventaram e que violam regularmente, regras que mudam o tempo todo a depender das circunstâncias", afirmou.

Na terça (6), Moscou já havia feito a acusação de que outras nações não vêm cumprindo o que foi prometido pela ONU no acordo para escoar a produção de grãos ucraniana.

É uma retórica que Putin tem reforçado cada vez com mais ênfase nos últimos meses. De acordo com ela, a Rússia está sob ataque do Ocidente e só a construção de uma nova ordem mundial que faça frente à hegemonia americana forjada no pós-Guerra Fria pode reverter o quadro.

Nesse contexto, a cooperação com outros países menos hostis é crucial para Moscou. A mais importante dessas parcerias, com a China, foi oficializada ainda em fevereiro, com a assinatura de um acordo de amizade "sem limites" semanas antes da invasão da Ucrânia. Pequim não condenou a intervenção —chamada de "operação militar especial" pelo Kremlin— até aqui e endossou as críticas às sanções.

Os dois países ainda anunciaram recentemente um acordo para que a China pague pelo fornecimento de gás russo em sua moeda local, o yuan, ou em rublo, não em dólar, considerado "pouco confiável". E marcaram um encontro entre seus líderes para meados deste mês —o gigante asiático é representado no fórum por Li Zhanshu, número três da hierarquia do regime comunista.

Mas Moscou também está de olho em outros territórios, como atesta uma nova doutrina diplomática que assinada por Putin no início da semana. América Latina, África e Oriente Médio são alguns deles.

O presidente russo ainda usou seu discurso para atribuir a culpa do início da Guerra da Ucrânia ao próprio país invadido. "Não começamos nada em termos de ação militar. Estamos tentando cessar as hostilidades que começaram em 2014", disse, citando a anexação da Crimeia pela Rússia naquele ano.

A Rússia decidiu, depois de tentar resolver pacificamente a questão [da Ucrânia] várias vezes, responder na mesma moeda [...] Todas as nossas ações têm como objetivo ajudar as pessoas que vivem no Donbass [leste russófono do país]. Esse é nosso dever, e o cumpriremos até o fim

Vladimir Putin

presidente da Rússia

Foi uma das poucas referências do governante à guerra em si, que completou seis meses de duração em julho. Outra se deu quando, questionado sobre a possibilidade de Moscou sair do conflito com uma derrota, Putin respondeu que seu país "não perdeu nada e não perderá nada".

Ele acrescentou que o embate fortaleceu a soberania russa e que mesmo a divergência de opiniões quanto à guerra é em última instância benéfica. "Tudo o que for desnecessário, nocivo, enfim, tudo o que for nos impedir de avançar será rejeitado."

O russo ainda tratou de algumas das maiores fontes de desavenças entre seu país e a Europa hoje. Ele negou usar o fornecimento de gás para o continente como arma de chantagem e disse que o desligamento do gasoduto Nord Stream 1, realizado na semana passada, pode ser revertido a qualquer momento, "basta os europeus apertarem um botão".

Putin argumenta que a interrupção do fluxo é consequência das sanções ocidentais, que levaram à falta de peças de reposição e comprometeram a integridade do gasoduto. Ele chamou de "absolutamente estúpida" uma proposta recém-apresentada pela Comissão Europeia —braço executivo da UE— de estabelecer um teto para o valor do gás de Moscou.

Ursula von der Leyen, presidente da entidade, explicou que o objetivo é cortar as receitas russas, usadas para financiar a guerra, além de moderar o aumento galopante dos preços de energia ao consumidor final europeu. O russo deixou claro que não pretende exportar qualquer tipo de combustível a nações que adotarem a medida.

Já as acusações de que Moscou está bombardeando a usina nuclear de Zaporíjia, tomada no início do conflito, foram classificadas de absurdas. "Nós controlamos a estação, nossos homens estão lá. Estamos atirando contra nós mesmos ou o quê?", indagou.

Moscou e Kiev se acusam mutuamente de atacarem a planta, a maior da Europa, aumentando o temor internacional de um novo acidente como o de Tchernóbil. A agência da ONU dedicada à energia nuclear recomendou a construção de uma zona de segurança em torno da central em um relatório divulgado após a realização de uma vistoria no local.

O ministro das Relações Exteriores russo, Serguei Lavrov, questionou o documento da ONU, enquanto o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, endossou as recomendações. "Se a Rússia conduz o mundo à beira de um desastre nuclear, o mundo precisa ter os meios de impedi-la", disse Zelenski em pronunciamento. Na mesma fala, ele disse que no front suas forças têm "boas notícias" na região de Kharkiv, com a reconquista de algumas áreas —a informação não pôde ser verificada de forma independente, mas autoridades dos EUA falaram em "avanços lentos, mas significativos" de Kiev.

A Ucrânia anunciou nesta quarta que avalia desligar a usina nuclear por questões de segurança. O ato implicaria ainda mais pressão energética sobre o país invadido, que se prepara para um inverno de escassez à medida que a guerra continua.

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