Reunidos em Bruxelas, líderes da União Europeia realizaram nos últimos dois dias uma rodada de reuniões que tinha na pauta o que foi chamado de "debate estratégico sobre as relações com a China". Na prática, os discursos ali observados subiram o tom contra o país e pleitearam uma revisão das parcerias econômicas com Pequim.
A alemã Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, o braço Executivo da UE, disse que o bloco testemunha uma aceleração das tensões com Pequim. "O sistema chinês é fundamentalmente diferente do nosso, e estamos cientes dessa rivalidade", afirmou.
Referia-se em especial à ditadura de partido único que vigora na potência asiática —na contramão das democracias liberais apregoadas, ora com dificuldades, pela UE— e à agenda econômica de Pequim.
Não faltaram observações em defesa de um maior protecionismo do mercado europeu contra uma possível dependência da China. "A infraestrutura crítica não deve ser vendida a regimes autoritários", disse a primeira-ministra da Finlândia, Sanna Marin.
Para Emmanuel Macron, presidente da França, a mensagem de Marin chega com certo atraso. "A UE já cometeu erros estratégicos no passado ao vender infraestrutura para Pequim", afirmou.
A própria Von der Leyen voltou ao assunto. Disse que, à luz da lição aprendida com a dependência do gás da Rússia em meio à Guerra da Ucrânia, é preciso "ser vigilante" em relação ao gigante asiático. "No caso chinês, há risco de dependência de tecnologias e matérias-primas", afirmou, acrescentando que a UE precisa buscar fornecedores confiáveis.
A guerra no Leste Europeu também entrou na lista de críticas a Pequim, que tem pedido acordos de paz, mas mantendo neutralidade, por meio de abstenções, em votações na ONU que buscam condenar a invasão capitaneada por Moscou. O conflito também contribuiu para o estreitamento de laços, em grande parte econômicos, entre Rússia e China após as sanções ocidentais contra o regime de Xi Jinping.
O premiê da ex-república soviética da Letônia, Krisjanis Karins, disse que a UE deve buscar diálogo com a China para que o país "adote o lado certo da história" no que diz respeito à guerra.
Os discursos críticos em meio ao primeiro encontro em 12 meses que teve Pequim na pauta oficial vêm na mesma semana em que o país realiza o 20º Congresso do Partido Comunista da China. Durante seu discurso na abertura do evento, Xi, como é de praxe, não citou nominalmente outros países. Mas assentou sua liderança, que caminha para um terceiro mandato de maneira cada vez mais personalista.
A visão sobre o país asiático também não é exatamente nova. Principal parceira comercial da UE desde 2020, quando desbancou os EUA, a China foi descrita em 2019 pelo bloco como uma "parceira para objetivos comuns", uma "rival sistêmica que propaga outro tipo de regime" e uma "concorrente econômica".
Coube ao presidente do Conselho Europeu, o belga Charles Michel, atenuar o discurso e trazer o primeiro dos três tópicos para a pauta. "A China é uma colaboradora necessária", disse. "A discussão mostrou uma vontade muito clara de evitar que sejamos ingênuos, mas também não queremos embarcar em uma lógica de confrontação."
O premiê da Espanha, Pedro Sánchez, fez coro: "A China é uma concorrente em potencial, mas também uma colaboradora necessária para os desafios globais". Os dois mencionaram saúde e clima como áreas prioritárias de atuação conjunta.
Quem saiu desafiado do encontro foi o primeiro-ministro da Alemanha, Olaf Scholz. Com viagem à China marcada para o início de novembro, ele se prepara para acertar a possível compra de partes de um terminal portuário de Hamburgo pela estatal chinesa Cosco.
Seu governo está dividido sobre o assunto, visto como um importante indicador de até que ponto Berlim está disposta a endurecer o discurso em relação a seu principal parceiro comercial.
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