China apresenta plano de paz genérico para Ucrânia e vê Ocidente ignorar proposta

Documento é recebido com ceticismo por líderes europeus, que criticam aproximação entre Pequim e Moscou

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São Paulo

Em um de seus atos mais ambiciosos para se posicionar como uma possível mediadora da Guerra da Ucrânia, a China divulgou uma proposta de paz nesta sexta-feira (24) —data em que se completa um ano desde que a Rússia invadiu o país do Leste Europeu.

Mas o documento, cuja publicação havia sido antecipada pela diplomacia chinesa, não foi recebido como esperado pelo Ocidente. Líderes europeus demonstraram ceticismo diante da alegação de neutralidade de Pequim dada a sua proximidade com a Rússia.

Contribui para o argumento o fato de que, dias antes, as duas nações reforçaram sua parceria estratégica em um encontro entre o principal diplomata chinês, Wang Yi, e o presidente russo, Vladimir Putin.

O diplomata Wang Yi cumprimenta o presidente russo, Vladimir Putin, no Kremlin, em Moscou - Anton Novoderejkin/Sputnik via AFP

"A China já escolheu seu lado", afirmou a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, acrescentando que o país asiático não tinha apresentado propriamente um plano, e sim alguns princípios.

"A China não tem muita credibilidade porque não foi capaz de condenar a invasão ilegal da Ucrânia", fez coro Jens Stoltenberg, secretário-geral da Otan, a aliança militar ocidental. De fato, embora o texto da proposta de paz se inicie com a defesa do "respeito à soberania de todos os países", a China nunca censurou publicamente a quebra desse mesmo princípio por Putin ao invadir o território ucraniano.

A reação oficial da Ucrânia foi, aliás, cautelosa, com o presidente Volodimir Zelenski declarando que pretende discutir a proposta com representantes de Pequim antes de expressar o posicionamento de seu governo. "De qualquer forma, considero muito positivo que a China comece a falar sobre a Ucrânia."

No Twitter, porém, o principal assessor do líder, Mikhailo Podoliak, condenou a iniciativa, ainda que sem citá-la diretamente. "Qualquer ‘plano de paz’ que se baseie só em um cessar-fogo e, consequentemente, em um redesenho das fronteiras ucranianas e uma continuidade da ocupação militar não ambiciona a paz, mas a derrota da Ucrânia", escreveu ele sobre a sugestão chinesa de desescalada gradual do conflito.

"A posição da Ucrânia é conhecida —o recuo das tropas russas de volta às fronteiras estabelecidas em 1991", concluiu Podoliak. Kiev diz que apenas se sentará à mesa de negociação se todas as áreas ocupadas do seu território forem liberadas —incluindo aquelas sob controle de Moscou desde 2014.

Dividido em 12 pontos, o plano de paz apresentado por Pequim repete em grande medida os posicionamentos que o gigante asiático vinha defendendo desde o início da guerra. As propostas incluem, por exemplo, a oposição ao uso de armas nucleares, o fim das sanções impostas a Moscou, e a recusa do que o regime chama de "mentalidade de Guerra Fria", isto é, a divisão do mundo em blocos.

"Conflito e guerra não beneficiam ninguém. Todas as partes devem permanecer racionais, exercer moderação, evitar alimentar as chamas e agravar as tensões, de modo que a crise não se deteriore ainda mais ou mesmo saia de controle", afirma o texto.

As razões para a China tentar se apresentar como mediadora são muitas e vão de uma tentativa de impedir que a Rússia, aliada estratégica na luta contra a hegemonia americana, sofra uma derrota catastrófica, a uma busca por remediar suas relações com a Europa. Mas à medida que a guerra aprofunda a divisão entre Ocidente e Oriente, esse esforço tem encontrado cada vez mais obstáculos.

A mais recente rusga diplomática entre Washington e Pequim, iniciada após o Pentágono divulgar a descoberta de um balão chinês sobrevoando o território americano no início do mês, é um desses empecilhos. Os americanos afirmam que o objeto era um instrumento de espionagem, enquanto os chineses insistem que o artefato era um equipamento de pesquisas, sobretudo meteorológicas.

Nesta semana, o secretário de Estado e chefe da diplomacia americana, Antony Blinken, envolveu a Guerra da Ucrânia na disputa ao declarar que a Casa Branca suspeita que a China considera fornecer apoio material aos russos no conflito. A China classificou as alegações de falsas e disse que são os EUA que "estão constantemente enviando armas para o campo de batalha".

Na quinta, a revista alemã Der Spiegel publicou uma reportagem afirmando que a Rússia negocia com uma fabricante chinesa a compra de cerca de cem drones, com entrega marcada para abril. O Ministério das Relações Exteriores do regime afirmou não ter conhecimento de nenhuma negociação do tipo.

"A China sempre demonstrou atitude cautelosa e responsável quando se trata da exportação de produtos militares, não os vendendo a áreas de conflito ou a partes beligerantes", disse Wang nesta sexta, em seu encontro diário com a imprensa, ao ser questionado sobre a reportagem. "Tem havido um grande volume de desinformação espalhado sobre a China. É preciso prestar atenção às intenções por trás disso."

Com Reuters

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