Descrição de chapéu Governo Biden China

EUA adiam visita de secretário de Estado à China após Pentágono encontrar balão

Chefe da política externa americana deveria se encontrar com Xi, mas aumento de tensões barrou planos

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Washington

Em meio a uma nova escalada das tensões entre EUA e China, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, chefe da diplomacia americana, decidiu adiar uma viagem a Pequim prevista para domingo (5).

O estopim da crise mais recente foi o anúncio pelo Pentágono da descoberta de um balão chinês sobrevoando o território americano. Washington afirma que o objeto seria um instrumento de espionagem, enquanto Pequim diz ser um equipamento de pesquisas, sobretudo meteorológicas, que saiu da rota.

O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, em visita a Israel
O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, em visita a Israel - Ronaldo Schemidt - 31.jan.23/Pool/Reuters

O episódio se soma a um caldeirão de instabilidades que incluem desde planos do novo presidente da Câmara dos Deputados dos EUA de visitar Taiwan à expansão militar americana no Sudeste Asiático e o cerco comercial a empresas de tecnologia chinesas. Assim, a viagem, cujo objetivo inicial era tentar avançar no apaziguamento das tensões entre as duas maiores potências mundiais, ficou insustentável.

Blinken deveria viajar para Pequim na noite desta sexta (3), e havia a expectativa de que se encontrasse com o líder do regime chinês, Xi Jinping, o que não acontecia com um secretário de Estado americano desde 2017. Para não ampliar ainda mais a crise, a viagem não foi cancelada, mas adiada, sem que uma nova data tenha sido estabelecida.

O balão de alta altitude foi avistado pela primeira vez no Alasca, antes de passar pelo Canadá e entrar outra vez no espaço aéreo americano. Na quarta, o objeto sobrevoou Billings, no estado de Montana, onde fica uma base militar com silos de mísseis balísticos intercontinentais. Washington decidiu não derrubar o balão sob o argumento de que o item tem capacidade limitada de coleta de informações e seus destroços poderiam cair sobre áreas civis. O artefato teria o tamanho de três ônibus, de acordo com testemunhas.

Porta-voz do Pentágono, o brigadeiro-general Patrick Ryder disse que o balão havia mudado de curso e que estava flutuando para o leste, a cerca de 18 km de altitude. Ele acrescentou que o artefato demonstrava capacidade de manobra e que permaneceria sobre o país por mais alguns dias.

Segundo o Departamento de Estado, Blinken telefonou nesta sexta para o conselheiro de Estado Wang Yi, maior autoridade diplomática chinesa. Na ligação, disse que o balão chinês foi "um ato irresponsável e uma clara violação da soberania dos EUA e do direito internacional", que prejudicou a viagem ao país.

Pequim tentou esfriar a situação ao dizer, via nota no site de sua chancelaria, que o balão era um veículo civil para pesquisas que se desviou de seu trajeto inicial em razão de ventos. "A China lamenta a entrada não intencional do balão no espaço aéreo dos EUA devido a força maior. A China seguirá se comunicando com os EUA e lidará adequadamente com essa situação inesperada causada por força maior."

O clima entre EUA e China já era de tensão antes mesmo da revelação do artefato. Em meio a uma série de crises, as expectativas para a viagem de Blinken já eram baixas. Na quinta, o secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, anunciou em Manila um acordo para que os americanos possam usar mais quatro bases militares nas Filipinas, expandindo a presença no mar do Sul da China, região reivindicada por Pequim —de lá Austin se reuniu com autoridades militares e Joe Biden para discutir o balão chinês.

Além disso, o Departamento de Comércio dos EUA já havia avisado empresas americanas que não deve renovar licenças de importação de tecnologia do gigante chinês Huawei, segundo o jornal nipo-britânico Financial Times, em um movimento realizado sob o argumento de proteger a segurança nacional de espionagem. Pequim, por sua vez, disse se opor firmemente "à generalização dos EUA do conceito de segurança nacional, ao abuso do poder do Estado e à repressão irracional de empresas chinesas."

Na última semana, os EUA também aplicaram sanções a uma fabricante chinesa de equipamentos espaciais, a Changsha Tianyi, por supostamente ceder imagens de satélites ao grupo mercenário russo Wagner na Guerra da Ucrânia, e firmaram um acordo trilateral com Japão e Holanda para restringir exportação de ferramentas para produção de chips para a China. A ofensiva para estrangular o setor tecnológico chinês inclui ainda uma iniciativa para aprofundar a parceria com a Índia, lançada oficialmente na terça-feira (31), de modo a competir com as empresas chinesas.

Outro ponto que também coloca lenha na fogueira é o plano do novo presidente da Câmara dos EUA, o republicano Kevin McCarthy, de visitar Taiwan ainda neste ano, repetindo gesto de agosto do ano passado de sua antecessora democrata, Nancy Pelosi, o que aumentou a crise nas relações entre os dois países.

Ela havia sido a mais alta autoridade americana a pôr os pés na ilha em 25 anos. Na última segunda (30), o porta-voz da chancelaria chinesa instou "certos indivíduos nos EUA a cumprir sinceramente o princípio de Uma Só China", segundo o qual apenas um governo chinês é reconhecido.

O momento também já era de tensão entre Washington e Pequim desde o vazamento de um memorando dos EUA na semana passada em que o general Mike Minihan, chefe do Comando de Mobilidade Aérea do país, afirmou que as duas potências travariam uma guerra em 2025.

Ambos os países vinham tentando se comunicar com mais frequência desde a viagem de Pelosi a Taiwan, de modo a evitar que a instabilidade ganhasse corpo. Em novembro, Biden e Xi fizeram a primeira reunião presencial com o democrata na Presidência, em Bali, na Indonésia, e deram sinais de distensão —ainda que tenham marcado suas diferenças, com Pequim reforçando uma "linha vermelha" sobre Taiwan.

Antes do cancelamento da viagem de Blinken, ainda no tom de apaziguamento, o Diário do Povo, jornal que serve de porta-voz oficial do Partido Comunista Chinês, escreveu que os dois países "deveriam aprofundar a cooperação para promover o desenvolvimento das relações bilaterais".

O governo de Taiwan, ilha que na prática é autônoma, mas cujo controle é reivindicado por Pequim, já havia denunciado a presença de balões de espionagem chineses em 2022. Segundo o jornal americano The New York Times, artigos publicados no Diário do Exército da Libertação, maior jornal militar chinês, discutiam o uso de balões em operações de inteligência.

O episódio gerou críticas de políticos republicanos. McCarthy, o presidente da Câmara, definiu o balão como um exemplo da "afronta descarada da China sobre a soberania americana", argumento ecoado por outros congressistas da mesma legenda. Ele afirmou que pediria a realização de um briefing de segurança nacional sobre a situação para um grupo seleto de membros das duas Casas.

O presidente do Comitê de Relações Exteriores da Câmara, Michael McCaul, também do Partido Republicano, disse que o balão nunca deveria ter sido permitido no espaço aéreo americano e que o artefato poderia ter sido abatido sobre a água. "Peço ao governo Biden que tome medidas rápidas para remover o balão chinês do espaço aéreo dos EUA", disse em comunicado.

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