Frio e crise política contínua dificultam resgates após terremoto na Turquia e na Síria

Nações Unidas interrompem fluxo de ajuda para norte da Síria devido a danos nas estradas

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São Paulo

Frio, crises políticas, tremores secundários e danos na infraestrutura de estradas atrapalham as buscas de sobreviventes na Turquia e na Síria após o terremoto que já matou mais de 7.800 pessoas.

Em toda a região, equipes de resgate trabalharam durante a madrugada e amanheceram tentando encontrar sobreviventes, enquanto moradores esperam informações de parentes sob os escombros.

"É uma corrida contra o tempo", disse o diretor-geral da OMS (Organização Mundial da Saúde), Tedros Adhanom Ghebreyesus. "A cada minuto que passa as chances de encontrar pessoas com vida diminuem."

O sismo de magnitude 7,8 matou 5.894 pessoas na Turquia, no segundo tremor mais forte em quase um século e o mais letal dos últimos 24 anos —o governo turco calcula que 5.775 prédios colapsaram. Já a Síria, segundo o regime em Damasco e equipes de resgate em zonas rebeldes, soma 1.932 óbitos.

Civis buscam sobreviventes em meio a escombros de uma construção em Kahramanmaras - Adem Altan/AFP

Na manhã desta terça (7), as Nações Unidas anunciaram que o fluxo de ajuda da Turquia para o noroeste da Síria foi temporariamente interrompido devido a danos nas estradas e a outros problemas logísticos.

"Algumas estradas estão danificadas, e outras, inacessíveis. Há questões logísticas que precisam ser resolvidas", disse à agência de notícias Reuters Madevi Sun-Suona, porta-voz das Nações Unidas para a Coordenação de Assistência Humanitária. "Não sabemos quando os serviços serão retomados."

Segundo El-Mostafa Benlamlih, coordenador da ONU em Damasco, muitas pessoas preferiram passar a noite ao relento ou dentro de carros, muitas vezes em temperaturas congelantes. "A infraestrutura foi danificada, assim como as estradas que usamos para trabalhos humanitários. Vamos ter que encontrar soluções criativas para chegar às pessoas", afirmou. Antes mesmo do tremor, a organização estimava que mais de 4 milhões de pessoas no noroeste do país já dependiam de doações oriundas do exterior.

O frio e a neve também atrapalharam operações de resgate no sul da Turquia, de acordo com Murat Harun Öngören, coordenador da Akut, uma das maiores organizações da sociedade civil do país para resgate e ajuda humanitária. Ao jornal britânico The Guardian ele afirmou que o risco de morte dos que estão presos sob os escombros aumenta com o tempo. "Garantir que as pessoas recebam ajuda adequada nas primeiras 72 horas após terremotos tão grandes e catastróficos como esse não é fácil", disse.

O tremor atingiu áreas remotas, em que as equipes de resgate enfrentam muitos obstáculos. Ali Ünlü, morador de Adıyaman, por exemplo, tenta tirar sua mãe dos destroços da casa dela desde segunda-feira.

"Após o terremoto, corri para a casa da minha mãe e vi o prédio colapsado. Fiquei devastado. Esperei equipes de resgate, mas elas não apareceram. Comecei a ligar para as autoridades, mas todas as linhas foram cortadas", afirmou ele, também ao Guardian. "Está muito frio, e nós não temos comida. Já faz 24 horas que a minha mãe está presa sob os escombros. Não sei se ela ainda está viva ou não."

Na Síria, a chegada de ajuda humanitária deve ser impactada, segundo especialistas, pela guerra civil que assola o país há quase 12 anos, uma vez que a divisão do território dificulta o atendimento da população.

"A Síria segue uma questão sombria, do ponto de vista legal e diplomático", afirmou Marc Schakal, diretor do programa da ONG Médicos Sem Fronteiras no país. Em entrevista à agência de notícias AFP, ele afirmou temer que organizações locais e internacionais que atuam no território acabem sobrecarregadas, já que negociações de ajuda humanitária com países em situações do tipo são sensíveis.

O regime de Bashar al-Assad está isolado internacionalmente e é alvo de sanções —a Rússia, um de seus poucos aliados, foi um dos únicos países que prometeram o envio imediato de equipes de emergência, além de disponibilizar 300 militares russos acampados perto dali para ajudar nos resgates.

Embora tenha dito que as ajudas recebidas serão destinadas a "todos os sírios, em todo o território", o embaixador da Síria na ONU, Bassam Sabbagh, impôs uma condição: a distribuição dos auxílios tem de ser feita pelo regime. "Os acessos a partir da Síria existem e podem ser coordenados", disse o diplomata.

O problema é que províncias como Idlib, reduto ao norte do país controlado por rebeldes e jihadistas, não mantêm pontes com Damasco. Quase toda a ajuda humanitária que chega à área hoje vem da Turquia e passa pelo Bab al Hawa, ponto de acesso criado a partir de uma resolução das Nações Unidas —e que tanto para Assad quanto para Moscou representa uma violação da soberania síria.

À frente da ONG francesa Mehad, Raphaël Pitti afirma que as áreas sob domínio do regime provavelmente receberão ajuda internacional, "como acontece há dez anos". Mas teme que a população de Idlib, que abriga 2,8 milhões de refugiados em situação dramática, fique para trás, especialmente porque as autoridades turcas já estão sobrecarregadas com suas próprias áreas devastadas pelo terremoto.

Por ora, uma fonte do governo da Alemanha, um dos que se comprometeram em ajudar a Síria, afirmou que Berlim pretende usar "os canais habituais", ou seja, por meio de ONGs. Adelheid Marschang, uma das diretoras da OMS, chamou a atenção para o fato de que Damasco deve precisar de mais ajuda da comunidade internacional do que seu vizinho, a curto e médio prazo, em razão de sua menor capacidade de resposta.

A crise humanitária no país se aprofundou nos últimos meses, quando a população passou a conviver com escassez de combustível e energia em meio a um dos invernos mais rigorosos de sua história.

Com AFP e Reuters

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