Custo faz americanos cruzarem a fronteira para cuidar dos dentes no México

Los Algodones, apelidada de 'Molar City', tem cerca de 300 clínicas odontológicas a preços muito menores que os dos EUA

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Los Algodones (México) | AFP

A cidade de Los Algodones, no México, recebe milhares de estrangeiros diariamente. Diferentemente do que ocorre em muitos dos destinos locais, porém, os turistas não estão em busca de praias ou resorts. Ali, a atração são os dentistas, que cobram preços muito menores do que os praticados nos Estados Unidos.

Placas de consultórios odontológicos em Los Algodones, no México, do lado da fronteira com Yuma, no Arizona - Robyn Beck - 11.abr.23/AFP

"Molar City", ou cidade molar, ganhou esse apelido há 30 anos, quando não havia redes sociais ou internet em massa. Com cinco quilômetros quadrados de área e situada no estado da Baixa Califórnia, no noroeste mexicano, ela faz jus ao nome e reúne em suas quatro ruas centrais cerca de 300 clínicas odontológicas.

"É a maior concentração de dentistas por quilômetro quadrado no mundo", afirma um homem que disputa a calçada em frente à guarita da fronteira —uma posição vantajosa para atrair clientes.

A cifra talvez não seja exagerada. Um dos pioneiros da Meca odontológica, Carlos Rubio, 63, afirma que cerca de 600 dentistas atuam na cidade hoje. A competição é acirrada. Letreiros coloridos ocupam quase todas as superfícies disponíveis, assim como os panfletos anunciando descontos para procedimentos como branqueamentos, extrações e implantes —o último é um dos serviços mais solicitados.

Com cerca de 7.000 habitantes, a desértica cidade recebe quase 6.000 pessoas por dia na alta temporada, de novembro a março, quando o norte dos EUA registra temperaturas negativas. No restante do ano, cerca de 2.000 vêm de estados próximos da fronteira, como Califórnia, Arizona e Novo México.

A afluência é tal que três hotéis foram abertos na localidade. Um site ajuda pacientes em potencial a escolher profissionais e organizar a logística da viagem. "Na Califórnia, meu dentista queria colocar um Tesla na minha boca", diz René, 65, salvadorenho que trabalha como motorista por app na Califórnia, em alusão ao carro elétrico produzido pela empresa de Elon Musk. "Ele me disse que todo o procedimento custaria US$ 57 mil (R$ 288 mil)", diz ele, que agendou quatro implantes e veio pela primeira vez à cidade.

Rubio afirma que a única diferença entre os serviços de Molar City e os dos EUA é econômica. Formado no México, mas com especializações feitas em universidades americanas, ele conta que a divergência de preços é tanta que cobre inclusive os custos de viajar várias vezes quando procedimentos exigem múltiplas consultas. O dentista agora recebe entre 30 e 35 pessoas por dia.

"Muita gente nos EUA não tem seguro odontológico, e, mesmo que tenha, são serviços que cobrem quantias menores, por volta de US$ 1.000 por ano [pouco mais de R$ 5.000]. Para algo maior, não é o ideal", diz o empreiteiro aposentado David Barry, 64, que se trata em Los Algodones há mais de dez anos.

Barry mora no Arizona e dirige durante três horas para chegar à fronteira. Ele conta ter ido à cidade pela primeira vez por recomendação de amigos, ao precisar de implantes. "Na época, meu dentista cobrou cerca de US$ 35 mil [175 mil]. Aqui, paguei entre US$ 6.000 e R$ 8.000 [R$ 30 mil a R$ 40 mil]", diz.

Ele diz que, nas primeiras vezes em que veio, notou a qualidade do serviço, além do fato de que as pessoas eram gentis e que era fácil vir e voltar. "A ideia nos EUA é que aqui a qualidade não é igual, mas é."

Na vizinha americana Andrade, o estacionamento que antecede a fronteira começa a encher cedo. A maioria dos visitantes tem mais de 50 anos. "Bom dia, alguém precisa de um bom dentista hoje?", questiona um jovem a turistas assim que eles deixam seus carros. Antes de chegarem à porta giratória que divide os dois países, os grupos ouvem a mesma pergunta outras três vezes, sempre em inglês.

A entrada corta o muro que o governo americano ergueu em sua fronteira sul para manter migrantes a distância. Ali, porém, todos têm como destino o México. Ninguém faz exigências ou perguntas aos forasteiros. Só uma cerca na guarita anuncia a chegada a Los Algodones: "Fundada em 1894".

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.