Liga Árabe readmite ditadura da Síria após 11 anos e 500 mil mortes em guerra civil

Regime de Bashar al-Assad se beneficia de reconciliação entre Arábia Saudita e Irã, mediada pela China

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Riad | AFP

Chanceleres dos países que formam a Liga Árabe decidiram neste domingo (7) reintegrar a Síria à organização. A medida foi anunciada 11 anos após a exclusão de Damasco devido à repressão ordenada pelo regime contra uma revolta popular que depois se transformou em guerra civil.

A reintegração foi aprovada por unanimidade pelos ministros em uma reunião a portas fechadas na sede da Liga Árabe, no Cairo. Isolado diplomaticamente desde 2011, o ditador Bashar al-Assad teve o nome retirado recentemente da lista de persona non grata da organização. Analistas dizem acreditar que ele poderá participar inclusive da reunião de cúpula anual de chefes de Estado, no dia 19, na Arábia Saudita.

O ditador sírio, Bashar al-Assad, no Parlamento em Damasco
O ditador sírio, Bashar al-Assad, no Parlamento em Damasco - Sana - 12.ago.20/Handout via Reuters

Seria um retorno com forte significado para Assad, levando em consideração que, em 2013, a oposição síria chegou a ocupar a cadeira de Damasco em uma reunião da Liga Árabe no Qatar. Em nota após o anúncio da reintegração, o regime informou que deseja dialogar e reforçar a cooperação na região.

Em novembro de 2011, 18 dos 22 países membros da Liga Árabe votaram a favor de suspender o regime sírio da organização, em medida celebrada por países ocidentais e pela Turquia, mas criticada por Rússia, Irã, Iraque e Líbano. A Liga Árabe também adotou sanções econômicas e cortou rotas aéreas para a Síria.

Várias nações árabes apoiaram os rebeldes no início da guerra, que virou um campo de batalha para atores externos, como Rússia e Irã, bem como para grupos extremistas, caso do Estado Islâmico. Segundo estimativas, o conflito já provocou mais de 500 mil mortes, além do deslocamento de milhões.

A volta de Damasco à Liga Árabe, especulada havia meses, foi favorecida pela solidariedade internacional após o terremoto de 6 de fevereiro, que deixou mais de 50 mil mortos na Turquia e na Síria. Mas, no plano diplomático, o catalisador foi a reconciliação, em março, de Arábia Saudita e Irã, com mediação da China.

Dias depois, em 12 de abril, o chanceler sírio fez uma visita surpresa à Arábia Saudita, a primeira desde o início do conflito. Fora da Liga Árabe, a Turquia, outro país desde 2011 que tem prestado apoio à oposição anti-Assad, também teve a aproximação com Damasco selada em uma reunião entre os ministros da Defesa turco e sírio no final do ano passado, em Moscou. Outra razão para a reintegração é a percepção de que a Síria já não representa um risco para a região. Há uma década, o país de Assad estava tomado pela organização terrorista Estado Islâmico, mas a facção radical foi neutralizada nos últimos anos.

Damasco agora aposta na normalização das relações com os países árabes, em particular as ricas monarquias do Golfo, que já foram aliadas da oposição a Assad. O regime conta com essas nações para financiar a reconstrução do país, devastado por mais de dez anos de conflito e pelo terremoto de fevereiro.

A volta do regime para a organização árabe também foi alvo de críticas. O governo dos Estados Unidos questionou a decisão, alegando que o ditador não merece retornar ao bloco com a guerra civil ainda em curso. Em nota, porém, o Departamento de Estado disse acreditar que seus parceiros árabes aproveitarão o contato direto com Assad para mediar a crise.

Com o apoio da Rússia e do Irã, a ditadura síria conseguiu recuperar a maior parte do território perdido na guerra civil, embora quatro milhões de pessoas continuem vivendo em uma região sob o controle de grupos rebeldes e jihadistas. Na prática, porém, Assad já venceu o conflito. Os combates arrefeceram em 2020, e as forças sírias enfrentam resistência apenas no norte do país, na fronteira com a Turquia.

Por outro lado, de acordo com uma investigação publicada pela agência de notícias AFP em novembro, a Síria conseguiu se manter financeiramente graças à exportação de captagon, uma droga que gerou uma indústria ilegal de mais de US$ 10 bilhões (R$ 49,6 bilhões) e transformou o país em um narcoestado.

Ao mesmo tempo, a Síria ainda não tem acesso aos investimentos internacionais necessários para a sua reconstrução. Investidores evitam o país também em razão das sanções americanas, que impossibilitam negócios. A continuidade da guerra civil, ainda que em bolsões, também é um obstáculo.

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